45 DO PRIMEIRO TEMPO –

Seguimos na rotina familiar. Levanto, passo pelos quartos dos filhos. Um eu preciso acordar, outro já está com fones nos ouvidos aguardando o professor iniciar a jornada do dia. Coloco a ração de Pretinha. Lavo a louça que a Fada da pia deixou durante a noite e coloco a mesa para nosso café. Separo os remédios de Flávio, os meus. Nosso filho levanta, chega à cozinha e exclama: parecem novos pratos de ração! Várias bolinhas coloridas com inúmeras finalidades. Controle de pressão arterial, colesterol, vitamina… Rimos juntos e sigo na organização do café.

Sou lenta! Coloco a homilia diária no celular e, enquanto escuto, vou preparando as frutas, o chá mate, a tapioca… Depois de alguns minutos me sento para comer. Olho as bolinhas coloridas ao lado do copo e penso: estou terminando o primeiro tempo!

Sigo para a sala, ligo o computador, começo a preparar aulas. Preciso ser rápida, pois tive uma ideia e não posso esquecer. Flávio se senta diante de mim e digo a ele, sem preâmbulos: está terminando nosso primeiro tempo!

– Como assim?

Ele deve achar que enlouqueci. Sempre há a possibilidade.

– Flavinho, daqui a pouco farei 46 anos, se Deus quiser. O primeiro tempo de vida está
acabando…

Ele endireita a cabeça, franze a testa e responde:

– Tem o intervalo de quinze minutos e depois vem o segundo tempo.

– Com sorte – respondo – temos ainda os acréscimos do Juiz.

Ele sorri para mim e fala:

– Espero que sejam partidas de futebol! E se forem jogos de basquete? Quatro tempos de doze
minutos?

– Prefiro acreditar no futebol!

Ou em partidas de xadrez, reflito. Também são boas…

Continuamos sentados, cada um diante de sua tela de computador, de seu mundo…

De vez em quando, levantamos os olhos e nossos olhares se cruzam. Sorrimos um para o outro. Sei no que estamos pensando. A vida é um sopro, uma partida de um jogo. Certos momentos a gente ganha, em outros a gente perde. Alguns momentos de dribles e posse de bola.

Enquanto vamos correndo atrás da bola e esperando acertar o gol, escutamos os gritos da torcida – a favor ou contra – nos impulsionando. Alguém puxa a nossa camiseta, alguém dá uma rasteira, um cartão nos impede de seguir com a jogada. Não nos entregamos e continuamos em frente. Sempre.

Mas, quando o Juiz sopra o apito final, não tem essa de pedir mais um segundo ou “deixa
terminar a jogada”.

Por isso, façamos a nossa partida excepcional!!

***
Fiz 46 anos!

 

 

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, Professora universitária e Escritora

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

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