Por 4 votos a 1, os ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram nessa terça-feira (23) anular as quebras dos sigilos do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que fazem parte do caso das “rachadinhas” na Assembleia Legislativa no Rio de Janeiro.
As chamadas “rachadinhas” consistem na prática de confisco, por parlamentares, de parte dos salários de assessores de gabinete.
A turma retomou o julgamento de três recursos da defesa de Flávio Bolsonaro que começaram a ser analisados em novembro do ano passado, mas tinham sido adiados por pedidos de vista (mais tempo para análise).
Na tarde de hoje, os ministros discutiram o recurso que questionou a legalidade das duas decisões da do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio, que autorizaram as quebras de sigilos do senador Flávio Bolsonaro e dos outros 94 investigados no esquema.
Votaram pela anulação os ministros João Otávio de Noronha, Reynaldo da Fonseca, Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik. O único voto contrário foi o de Felix Fischer. Os ministros entenderam que a decisão judicial que autorizou as quebras dos sigilos bancários e fiscal de Flávio Bolsonaro não foi devidamente fundamentada, como prevê a lei.
Fonseca e Dantas deixaram claro que a decisão envolve todos os investigados no caso das rachadinhas.
Noronha disse que Itabaiana afastou o sigilo de 95 pessoas sem a devida individualização. “Em verdade, o magistrado não se deu ao trabalho de adotar de forma expressa as razões do pedido do Parquet (Ministério Público), apenas analisou os argumentos, concluindo que a medida era importante. Apenas isso. A decisão é manifestamente nula”, afirmou.
Fonseca concordou com o colega. “Eu não posso concordar com a legitimidade do magistrado de primeiro grau em relação à quebra do sigilo bancário e fiscal. A decisão se limita a quatro ou cinco linhas. Isso não pode ser considerado uma decisão fundamentada, ainda que sucinta. Não há qualquer referência aos critérios necessários para a quebra de um sigilo bancário e fiscal”, disse.
Ribeiro Dantas classificou a quebra do sigilo de “absolutamente genérica”. “Entendo que a decisão não está devidamente fundamentada para esse tema da quebra do sigilo”, afirmou.
Joel Paciornik reafirmou o que considerou ausência de fundamentação para a quebra de sigilo. “Nessa hipótese da quebra de sigilo, eu vejo que essa decisão da forma como posta ela realmente está eivada de nulidade, porque carece de fundamentação adequada de acordo com as nossas exigências constitucionais e legais”, disse.
O ministro Félix Fischer, relator, ficou isolado e foi o único a votar pela rejeição dos recursos de Flávio. O ministro travou duros embates com Noronha, que abriu a divergência a favor da defesa do senador.
Diante da derrota, Fischer pediu para que os outros recursos da defesa de Flávio fossem julgados na próxima semana. Os pedidos podem impactar ainda mais o andamento do processo.
A turma ainda precisa julgar, na próxima terça-feira (2):
- supostas irregularidades na comunicação feita pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre movimentações atípicas do senador;
- validade de decisões tomadas pela primeira instância no caso, já que o foro especial foi reconhecido pelo TJ do Rio.
Também está na pauta uma ação que trata de supostas irregularidades na prisão preventiva decretada para Fabrício Queiroz.
Segundo fonte do MP ouvida pela TV Globo, a decisão desta terça-feira (23) deve impactar a denúncia oferecida pelo Ministério Púbico do Rio, uma vez que foram utilizados elementos das quebras de sigilo.
Caso o colegiado reconheça irregularidades no compartilhamento de dados do Coaf com o MP, isso pode impactar quase que a totalidade da investigação e levar o caso para a estaca zero. No julgamento de hoje, Noronha já indicou que deve votar contra a legalidade do trabalho do Coaf.
“Coaf não é o órgão de investigação e muito menos de produção de prova. Tem de fazer o relatório de investigação e mandar, e não pode ser utilizado como auxiliar do Ministério Público em termos de investigação o conjunto convence sim das irregularidade para fortalecer a acusação. convence ainda invasão intimidade que somente seria possível com autorização judicial, afirmou o ministro.
Noronha afirmou que a “privacidade e intimidade são garantias que defluem da dignidade da pessoa humana”.
Senador denunciado
Na ocasião, a defesa do parlamentar afirmou que Flávio Bolsonaro não cometeu qualquer irregularidade e que ele desconhece supostas operações financeiras entre ex-servidores da Alerj. A defesa de Queiroz afirmou à época que iria provar a inocência dele.
As investigações começaram em 2018, quando um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou movimentações suspeitas na conta bancária de Fabrício Queiroz quando ele trabalhava com Flavio Bolsonaro. Queiroz movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017.
O Ministério Público do Rio acusa Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz e outros 15 investigados de participar das “rachadinhas”, esquema no qual o parlamentar fica com parte dos salários dos funcionários. Os dois negam as acusações.
Fonte: G1