A CONFISSÃO –
Chegou aos ouvidos do Padre Cipriano que a sua Paróquia, protegida por Nossa Senhora dos Aflitos, estava com a vizinhança “minada”, ou seja, comprometida, com a degeneração dos costumes. Por perto, agora, havia “casas de recurso”, ou cabarés.
Uma vez por outra, algumas prostitutas apareciam na Igreja, distraindo os fiéis.
A notícia era de que algumas mulheres estavam recebendo rapazes e velhos divertidos, em suas casas, os quais ali ficavam até altas horas da madrugada, ouvindo música, dançando e bebendo à vontade..
Escandalizado com a notícia, o padre encarregou o sacristão de agir rapidamente, anotando os números das “casas de recurso” que ali haviam se instalado. Aquilo só podia ser obra do Demônio. E o reverendo explicou o seu plano.
Era preciso que o sacristão, que conhecia toda a gente do bairro, indagasse quais eram as casas suspeitas ali instaladas, e fizesse um levantamento, anotando os números dos prédios.
O sacristão saiu pelas ruas do bairro, a indagar, de café em café, de botequim em botequim, de antro em antro, onde estavam situados aqueles focos de pecados.
À tardinha, retornou à casa paroquial, para entregar ao vigário as anotações que tinha feito, dizendo que tinha descoberto todos os endereços das casas suspeitas.
Eram somente quatro “casas de recurso”. O padre Cipriano tomou nota num caderno, decorou os endereços e no dia seguinte foi, como de costume, confessar e absolver os fiéis.
Estava ele no confessionário, ouvindo os pecados do seu rebanho, quando percebeu que a última mulher da fila havia se ajoelhado. Era uma das senhoras que frequentavam a Igreja, cujas virtudes não mereciam grande confiança. Suas confissões eram muito pecaminosas. Cauteloso, o padre, em certo momento, perguntou à mulher:
-E você, filha, nunca abandonou o seu lar, para ir à Rua dos Barbados, nº 28?
-Não, senhor! -Respondeu a mulher.
-E à Rua do Amor? À Rua dos Sonhos?
-Também não!
-E à Rua das Paixões? -Não- Respondeu novamente.
O padre absolveu a linda “ovelha”, e, como não houvesse mais ninguém a confessar, deixou-se ficar no confessionário alguns minutos, meditando. Ao sair, avistou à porta da Igreja a linda paroquiana, que, por último, confessara. Com um lápis na mão, a mulher fazia anotações em uma pequena caderneta. Desconfiado, o vigário encaminhou-se para a porta, arrastando em silêncio as suas sandálias. Chegando perto da mulher, indagou, interessado:
-O que é que você tanto escreve, minha filha?
A mulher, sem pestanejar, respondeu:
-Esses endereços que o senhor falou, Padre Cipriano, eu ainda não conhecia. Mas faço questão de conhecer.
Violante Pimentel – Escritora
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