Estou tensa com o avançado da hora. A partir da meia noite, terei que me desligar dele. Não me preparei psicologicamente para esta separação. Não poderei vê-lo, pegá-lo ou apertá-lo. Ele é meu companheiro de todas as horas. Sem ele, não me deito. E se me deito, não consigo dormir. Tem sido o meu grande amor e eu não consigo viver sem ele. A separação é compulsória, e a saudade dele está “doendo em mim”.
Pela primeira vez, depois 10 anos, vi-me obrigada a me afastar dele. Nunca imaginei que isso fosse possível. De repente, não mais que de repente, isso aconteceu.
Para mim, ele é do tamanho do mundo. Um mundo de paz e alegria.
A tranquilidade bateu em minha porta, desde o dia em que o conheci.
Fecho os olhos e tento mudar o pensamento. Sem ele, perdi “meu norte” e nada me satisfaz.
De repente, senti falta dele. De repente, o mundo parou. A sensação de que o ar iria me faltar tomou conta de mim. Senti pânico. Medo da vida, medo de tudo.
Já no Centro Cirúrgico, super nervosa, senti dificuldade de respirar. Pensamentos confusos embaraçam minha mente. Clamei por ele, mas ninguém me ouviu. Pedi água e a resposta foi “não”. Quase sem poder respirar, fechei os olhos.
O Centro Cirúrgico estava gelado. A sede tomou conta de mim.
Saí “do ar. Só me lembro de uma voz dizendo “não, não pode!”
Quis chorar, por me sentir abandonada. Nunca tinha ouvido tanto “não” na minha vida. Adormeci.
Despertei, quando uma voz de homem me chamou:
Pronto! O pesadelo terminou! Correu tudo bem!
A cirurgia de vesícula foi um sucesso. Com alegria, recebi de volta meu inseparável SORINE, razão dessa minha agonia.
O cirurgião, tranquilo e risonho, disse que ali no Centro Cirúrgico, já tinha visto de tudo: Paciente segurando terço, escapulário, “agnus dei”, medalha milagrosa, e até imagem de santo. Mas, pela primeira vez, na vida, tinha visto uma paciente desesperada, agarrada com um vidro de “Sorine”, na hora de ser anestesiada.
Violante Pimentel – Escritora