A GRATA HERANÇA –
Quando falamos, quando comentamos sobre algo bom que sonhamos, ou que pretendemos querer que aconteça, sempre ficamos naquela ansiedade, naquele desejo que realmente venha a se realizar.
As coisas vêm, não de imediato, mas, sim, com a sequência da sua evolução, do seu jeito de ser e de existir – naturalmente.
Muitas vezes, não encontramos justificativas aparentes para os acontecimentos vividos. Ficamos muitas vezes surpreendidos e embaraçados.
Porém, quando nos aprofundamos e atiçamos nossa mente, vamos encontrar algum elo, alguma ligação, por menor que seja, que justifica o fato.
Não me recordo, nem sou lembrado da existência de alguém da minha família ter praticado o futebol, no entanto, no momento vivido da infância, fui “picado” pela mosca azul do esporte – o futebol, estimulado pela ausência de outras atividades recreativas na época. O futebol de rua era a “coqueluche”, era o quente na época, não faltavam “arenas” para receber os seus artífices e seus endiabrados moleques “craques”. Fui um “viciado” da bola.
Como disse, não encontrei relatos de alguém da família que tivesse jogado futebol. Teria sido somente a admiração, a prática diária da atividade os únicos incentivadores? Creio que sim! A habilidade é um dom nato, vem do berço. E foi através dessa habilidade que me identifiquei, me apresentei e me destaquei no mundo do futebol potiguar.
Na época, o futebol se restringia a uns pequenos grupos de meninos que se reuniam nas largas ruas de areias frouxas nos bairros de Tirol e Petrópolis para definir no par ou ímpar os seus times e decidir nas disputas os seus embates. Era tudo de bom, um mundo super feliz e bem vivido; despertava ali o sonho, a glória para que aqueles “endiabrados” moleques se exibissem no mais cobiçado palco de futebol do Estado: o Estádio Juvenal Lamartine. Era o encantamento maior, a consagração, o pódio para o peladeiro que tanto almejava alcançar.
E assim, aconteceu comigo: cheguei lá! A empolgação me abraçou, me envolveu e me enriqueceu de alegria e orgulho.
No entanto, mesmo assim, o vibrante entusiasmo não me tirou a ideia e a vontade de estudar. Segui em frente e me formei em Medicina. Usei muito a arte dos dribles de corpo do futebol para avançar na busca do troféu da arte de curar de Hipócrates.
O retrato da história abre e descortina as imagens que o passado tenta esconder e fazer esquecer.
A boa herança surge e entra em jogo: duas netas terminando Medicina, uma já formada em Análises Clínicas, um advogado e um dos mais novos já se apresentando em competições internacionais de futebol.
E, assim, chega e enche o corpo e a alma de orgulho para aquele que passa a fazer a escalação desse bom time e se envaidecer plenamente pela herança deixada e pela história registrada, com requinte, e o perfume enriquecedor de uma primavera florida.
Berilo de Castro – Médico e Escritor, [email protected]