A LINGUAGEM DOS SINOS –

Os sinos falam, cantam ou até mesmo choram. Ao menos, é o sentimento de artistas, escritores, poetas. O Cardeal Dom Eugênio Sales reconhece essa linguagem: eles falam do bem, da concórdia e da fraternidade. Rachmaninoff descobriu neles uma sinfonia. Em meio a uma pandemia, o poeta Guerra Junqueiro lamenta os mortos: “Os sinos choram lágrimas de bronze na amplidão”. Vinícius de Moraes recomenda que leves ou vibrantes cantem para os amantes e para os que vão amar.

Sino para mim é um bem da infância. Fui coroinha da matriz de Nossa Senhora da Apresentação em Nova Cruz. Ajudava na celebração da missa, em latim. Por generosidade do sacristão Sales da Cunha, aprendi a tocar o grande sino. Era o maior instrumento de comunicação da cidade. Chamava os fiéis católicos para missas e missões. Emitia o alvíssimo toque dos batizados e o escuro dobrado dos defuntos. A liturgia era vivida com toques especiais no Natal e Ano Novo.

Vivendo em Natal, constatei, com tristeza, que o velho sino novacruzense já não existia. Rachado, fora transformado em pequenos sinos de capelas. Mandei confeccionar outro de dimensão semelhante com o nome do coroinha que só os passarinhos verão. O novo toque relembra os sons que o menino produzia. A bênção foi dada por Dom Nivaldo Monte e toda a igreja cantou a canção composta, por Tico da Costa, especialmente para a celebração: “Sou ex-coroinha, coroinha sim senhor, se já fui coroinha, coroinha ainda sou”.

O sino tenor, que alegra a minha casa, em razão da pandemia, está mudo, não se ouve a sua voz aguda e masculina. Infelizmente, o mesmo ocorre nas igrejas.

Digo que toda casa deve ter um canhão antigo, uma âncora e um sino. O canhão para lembrar que a tua vida é uma luta, a âncora registra que o lar é o teu porto seguro, o sino é para celebrar as mais finas alegrias. O meu sino tenor festeja amigos, a presença de uma personalidade exemplar, a satisfação de ganhar uma causa justa. Merecem registro em livro especial com assinatura de celebrantes Ad hoc.

A invenção tem afiliadas. O escritor José Paulo Cavalcanti adotou em sua fazenda. O senador Garibaldi Alves trouxe Mário Soares para jantar em nossa casa. Após o toque festivo, o ex-primeiro-ministro e ex-presidente de Portugal afirmou que iria aplicar em sua Fundação. O processualista Fredie Didier adotou também a cerimônia do sino. Um dos maiores juristas brasileiros, Ives Gandra, imortalizou o acontecimento com um soneto.

Nas festividades natalinas, a singeleza do toque de sinos recorda a humildade de Jesus. Um poema meu, magistralmente musicado por Roberto Lima, diz: “Lembro no Natal/ cantigas de sinos/ que o Deus-menino/ nasceu num curral.”

Por muito amar a capital potiguar, sonho que a iniciativa privada ou o poder público mande fazer um sino de 12 metros, talvez produzido com aço e fibra de vidro. Seria posto sobre o gabião da Praia do Meio. Todas as tardes um locutor anunciaria o toque emprestado dos sinos das grandes catedrais do mundo. O natalense e o turista sentiriam que a nossa cidade é universal e cristã.

 

 

 

Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN

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