A PISTA –

– Estou na pista!

Foi a frase que ouvi, surpresa, de alguém ao se separar depois de muitos anos de um casamento onde nós, aqui de fora, julgávamos perfeito.

Lembrei de nossa missa, minha e de Flavinho, quando celebrávamos 20 anos de casados, bodas de porcelana. O padre disse:

– Cuidado! Porcelanas quebram.

Verdade!

Casamento é constante cuidado. Com o outro e conosco. Fiquei pensando no Rossandro  Klinjey que postou sobre autocuidado um dia destes: higiene, sair com amigos, descansar, ler. Hoje a gente ouve o tempo todo falar em “skincare”, mas pouco se fala no cuidado com os relacionamentos.

Ouvi o “estou na pista” não com preconceito, inveja ou incômodo. Ouvi pensando como deve ser difícil você abrir mão de uma vida que planejou ser “para sempre” e notar que ela não existe mais.

Abrir mão da rotina. Mais uma vez a rotina. Sou apegada a ela. Não me entenda mal. Mas amo pegar o mesmo caminho para deixar nosso caçula na escola e observar as galinhas numa pracinha por onde passamos. Depois vejo o senhor idoso tomando um café em copo descartável enquanto come uma coxinha frita antes das 7h e eu penso imediatamente que isto acabaria com meu estômago o dia todo. Olho o rapaz que se senta em meio ao caminhar com seu cachorro, para o serzinho de quatro patas acompanhar o movimento dos carros. Passo pela garota na bicicleta, mascando chiclete, com a farda da escola e mochila nas costas e sei que ambas, eu e ela, não perdemos a hora. Amo estas doces rotinas. O mexer dos meus pés encostando-se à perna dele. Os travesseiros que iniciam sob nossas cabeças e acordam no chão. Os medicamentos (fazem parte de nosso cuidado diário) que coloco ao lado de sua xícara para ele não esquecer após o desjejum.

Casamento… muito ouço dizer que é difícil, que se abre mão de tudo, que devemos ter cuidado para não cair na rotina. Entretanto, a rotina de conhecer alguém, para mim, é deliciosa…

Preciso dela…

 

 

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, Professora universitária e Escritora

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