ADMIRAÇÃO E RESPEITO –
Sustento com o mar uma relação de afinidade e respeito. Admiro-o. Mas dele guardo distância regulamentar, buscando-o quando necessário e agradável para mim. Pelas suas magníficas proporções, sempre o encontro disponível. Ingresso em seu ambiente com muita cautela, ciente da minha pequenez em comparação à sua majestade. Especificamente quanto às suas ondas, tenho namoro à moda antiga: contemplo a sinuosidade dos seus volteios; as evoluções dignas das mais hábeis acrobatas; as apresentações plásticas e a docilidade com a qual se submetem às imposições dos ventos.
Por vezes a vinculação contemplativa é alterada, quando aceito o chamado das espumas, em franjas fartas, e sigo para um trato mais epidérmico, com breves carícias recíprocas de mãos e pés, prenunciando algum envolvimento corporal mais intenso.
Talvez por vindita aos meus arreceios de um envolvimento maior, o mar responde de forma agressiva e oportunista quando me esqueço das cautelas desse conúbio. Assim, não são raras as devoluções bruscas do meu corpo à areia, encerrando-se de forma pouco gentil os ensaios de aproximação. Noutros episódios, a reação marinha pode ser mais severa. E já foi. Certa vez, na juventude primeira, ofereci-me em conversa a uma mulher que se banhava nas águas lustrais do entardecer de uma praia natalense. Em uma danadice natural, o mar roubou-me a areia que sustentava os meus pés, conduzindo-me ao encontro de rochas escuras, reclamando fé e paciência para desvencilhar-me daquele suplício, no qual poucos minutos pareciam ser horas infindas. O sucesso da salvação teve por preço o desaparecimento da fêmea que era abordada, sumindo no contrafluxo da claridade solar. Jamais a reencontrei.
Seria uma sereia, à encarnação de Loreley, a ninfa que em beleza e canto seduz barqueiros no Reno, levando iates e homens à destruição pelo embate violento com penhascos?
Pelo não, pelo sim, prefiro ficar atento aos comandos de Netuno e Éolo, deuses do mar e do vento. E permanecer com o meu liame platônico para com os oceanos. Pode ser triste e desprovido de aventuras. Mas é mais seguro, o que é uma virtude da maturidade.
IVAN LIRA DE CARVALHO – Juiz Federal e Professor
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