Carlos Alberto Josuá Costa 

“Essa taça é especial para você!”

Acompanhando a sentença, num gesto carinhoso, ‘pousou’ diante de meus olhos aquela de vidro grosso e pesado, com bolotas em alto relevo, de cor avermelhada e, sem haste.

Detive-me silenciosamente em sua graciosa forma e sem nenhum senso de caridade, balbuciei introspectivamente: ótima para “tomar” abacatada.

Quando a garrafa de vinho desfilou seu rótulo me senti mais aliviado, pois ali estava um red wine que faria a diferença: MONTECILLO, Crianza, 2008, Rioja, Spain.

Antes que jorrasse sua cor púrpura e seus aromas de cedro, cereja e beterraba, e algum floral agradável ao olfato, minha astúcia – burilada no livro “A ARTE JUDAICA DE RESOLVER PROBLEMAS”, aguçou a prática do meu aprendizado, e ‘enchi’ a tal taça, especial para mim, com a cristalina água e, num sorriso maroto, decantei minha aflição e ditei o lema do encontro: – primeiro vou me hidratar. Deu certo!

Outra taça se fez presente, agora sim, de cristal de vidro, leve, transparente, apropriada para vinhos tintos, tanto na sua forma – bojo grande, permitindo mais contato com o ar, e proporcionando um buquê mais sensitivo. Aliás, combinava certinho certinho com o vinho Rioja servido.

Foi uma noite agradável!

Não raro, tenho um amigo que ao pretender ou já degustando um determinado vinho, grava em digital a garrafa, com destaque no rótulo e me envia como uma espécie de consideração e desafio ao meu comentário sobre tal feito: “- E esse, conhece?”.

Claro que ninguém, ninguém mesmo, é conhecedor do universo de vinhos produzidos nos terrois afora. Porém é possível se apoiar em, pelo menos, quatro vetores importantes para segmentar a análise pretendida: a casta, o ano, o país e a região produtora.

Assim, quando me é familiar, de imediato emito meu parecer. Um detalhe: é o meu parecer. Portanto pode e deve divergir do seu, do dele, do expert, mas nunca será possível dissimular os quatros vetores de outros elementos, também significativos.

Gosto de fugir das respostas tradicionais, tais como, ‘encorpado’, ‘boa acidez’, ‘frutado’, me prendendo no que aquele vinho é capaz de proporcionar ao seu degustador.

Vejamos:

            – Um vinho cheio de intenções. Seus aromas despertam a vontade de se aproximar do alguém que te corteja ou que te admira. Tem uma característica única de realçar o espírito contemplativo, deixando-o com o olhar fixo e longínquo em horizontes cheio de cores. Ideal para ser degustado de forma lenta, com sorrisos suaves e movimentos quase que orquestrado do corpo, em sintonia com o silêncio que envolve esse encontro. Uma varanda de madeira rústica, uma arandela a meia luz, uma cadeira de palhinha, uma taça de cristal, para num suspiro observar atentamente a dança do rubi se confundir com o rubro do teu sangue.

Mas, voltemos às taças.

Rigorosamente cada uva, quase que egoisticamente, exige uma taça para “exibir” sua performance e atrair para si os desejos mais nobres que seu degustador é capaz de externar.

Mas não é preciso chegar a tanto requinte e, ter disponível a menor variedade de taças sem sacrificar o prazer de antecipar a visão, o cheirar e o saborear que o vinho desperta.

Afinal, que tipos de taças não podem faltar para compartilhar os tintos?

Para os vinhos que costumam ‘habitar’ nossas adegas, podemos simplificar e optar por apenas dois tipos de taças. Só?!

Sim. Os modelos Bordeaux e Borgonha, atendem perfeitamente aos súditos de Baco, e preenchem as expectativas de não perder a afinidade com o ouro das videiras.

Afinal o vinho tinto é exibicionista e, exige espaço, transparência, leveza para respirar, dançar e exalar seus aromas e sabores.

As taças Bordeaux acolhem melhor os vinhos das castas Carbenet Sauvignon, Carbenet Franc, Merlot, Syrah, Tannat, Touriga Nacional, Alicante Bouschet, entre outras. As taças deste modelo possuem o bojo grande, bordas mais fechadas, aba fina, concentrando as características das uvas que originaram a bebida dos deuses.

As taças Borgonha, são para os vinhos mais exigentes. Seu bojo é maior do que a Bordeaux, proporcionando mais contato com o ar e consequentemente liberando um buquê que toma conta, na maioria das vezes, do micro ambiente. Ideal para os perfumes e mistérios da Pinot Noir e, para as castas Rioja, Amarone, Gamay, Barricato, Grenache e similares.

Fáceis de encontrar, preços justos e, qualidade afeita aos belos encontros da degustação, que simboliza o romance e o glamour das amizades feitas e refeitas aos aromas de um red wine.

E em copo? Não faça isso. Deus não fez você para ser teimoso.

Converse com alguém que “esteve” nas Bodas de Caná e verá que mesmo naquele tempo as taças já eram apropriadas para o evento.

Carlos Alberto Josuá Costa – Engenheiro Civil e Consultor (josuacosta@uol.com.br)

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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