AMIZADES LITERÁRIAS –
O livro cria parceiros. Muito já se diz que é o melhor amigo do homem. O companheirismo criado pela literatura ultrapassa o território da imaginação. A união de Batman e Robin continua presente no imaginário infantil.
Na vida real ou na ficção, a amizade literária é vasta e, algumas vezes, icônicas. Lembremos o Cavalheiro da Triste Figura Dom Quixote, o sonhador, sempre apoiado pelo amigo escudeiro pé-no-chão Sancho Pança.
Shakespeare escreve sobre amizade no desconfiado Hamlet com o confiável Horácio. O príncipe da Dinamarca, shakespeareano, não tinha dúvidas quanto à fidelidade do fidalgo. O chileno Pablo Neruda teve um companheiro solidário, em viagens e sonhos, o baiano Jorge Amado.
O famoso filme “O Carteiro e o Poeta”, baseado no romance de Skármeta, emociona a plateia de todo o mundo. O carteiro aprendeu com Neruda a fazer metáforas poéticas.
Câmara Cascudo era um fazedor de amizades, principalmente com os potiguares e com intelectuais, inclusive dos admirados pela leitura. Entre tantos, comemorava com vinho o aniversário de Verlaine. Era íntimo de Baudelaire e Rimbaud. A amizade com Mário de Andrade, com mútua influência, está expressa na correspondência por mais de duas décadas. A aproximação com seu primeiro editor, Monteiro Lobato, rendeu histórias e estórias. A falante boneca Emília não largava Narizinho, personagens lobatianos.
Larga correspondência revela-nos a cotidiana e inseparável amizade entre os poetas portugueses Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro. Também está documentada em cartas, a ligação estreita, intelectual e emocional, da ucraniana-recifense Clarice Lispector com o mineiro Fernando Sabino. O seu amor impossível pelo poeta Lúcio Cardoso, em revelações de encanto e frustração. Normalmente, o amigo aceita e respeita o jeito de ser do outro.
As amizades literárias tornam fraternas as relações. Os intelectuais congregam-se em academias e outras instituições. Fazem publicações de obras coletivas em revistas. Estimulam e potencializam a atividade dos companheiros. Os não integrantes gozam dos associados ao dizerem que estes formam “igrejinhas literárias” e “vivem em torres de marfim”.
A amizade, reconhecida como virtude pelos filósofos, é uma necessidade humana. Carece de zelo, cuidado, carinho e admiração. Temos amizades inesquecíveis, como a que tive (tenho) com o meu mestre Luís da Câmara Cascudo, os encantados Veríssimo de Melo, Dom Nivaldo Monte, Luís Carlos Guimarães, Nilson Patriota, Dorian Gray. Todos são amigos essenciais, que muito me ensinaram, em conhecimento e vida.
Não lembrarei dos amores tão parecidos com amizade, que são, no dizer de Machado de Assis, muito mais serena. Anotamos as amizades produtoras de alumbramento, das emoções de pessoas dedicadas à música e à poesia. Vivem Vinicius de Moraes e Tom Jobim.
Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN
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