O diretor da Escola da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, João Maria de Lima, foi denunciado no Ministério Público do RN por assédio e importunação sexual contra uma servidora da Casa Legislativa. O caso passou a ser investigado pelo órgão, que acionou a Polícia Civil para abertura de inquérito.
Diante das denúncias, a ALRN comunicou nesta segunda-feira (17) que decidiu exonerar o diretor, que estava no cargo desde abril de 2019, e disse em nota “que repudia assédios de quaisquer natureza” e que “acompanha com atenção o encaminhamento dos fatos que estão sendo apurados”.
Em nota, o ex-diretor disse que ele mesmo pediu exoneração e que recebeu com “perplexidade” as acusações. Ele disse ainda que foi acometido de “inverdades e injúrias”, que confia na Justiça, sendo o “maior interessado na apuração rigorosa dos fatos”, e que “toda manifestação será oportunamente esclarecida dentro dos autos e perante as autoridades”.
O assédio foi denunciado pela jornalista Sayonara Alves, que trabalha na ALRN desde 2011. Ela disse que começou a perceber uma mudança de comportamento do diretor por volta de 2021, mas que as ações se intensificaram há cerca de um ano.
“Eu sempre tive muito medo de denunciar. Medo de não acreditarem em mim, medo dos julgamentos, do que as pessoas iriam pensar”, disse a jornalista ao g1.
Na denúncia feita por ela, constam tentativas forçadas de beijo, abraços excessivos, mensagens indecorosas por celular e até uma oportunidade em que o diretor ofereceu apoio à jornalista, a chamou para almoçar e a levou até um motel.
“Eu só quero que seja feita justiça, voltar ao meu ambiente de trabalho e retomar minha vida. Eu não desejo nada de mal. Estou sem dormir, um pedaço de mim foi embora”, lamentou a jornalista.
Na solicitação de inquérito à Polícia Civil, obtida pelo g1 e pela Inter TV Cabugi, o MP cita que diretor teria constrangido a jornalista “prevalecendo-se de sua condição de superior hierárquico desta, com o intuito de obter vantagem de cunho sexual”.
Ele também teria “intensificado esse comportamento em várias ocasiões, chegando a praticar contra a noticiante e sem a sua anuência atos libidinosos com o objetivo de satisfazer a própria lascívia”.
Servidora da Assembleia Legislativa desde 2011, Sayonara começou a trabalhar na Escola da ALRN em 2017 e desde 2019 está em um cargo na direção. Os assédios, no entanto, não começaram nessa época.
“A gente tinha uma relação muito bacana, profissional, viramos amigos e tudo fluía muito bem”, contou a jornalista.
Em 2021, ela explicou que começou a perder peso e notou uma mudança de comportamento do então diretor.
“Começaram umas brincadeirinhas, mas em agosto do ano passado a coisa foi se intensificando, as brincadeirinhas deixaram de ser brincadeirinhas para ser mais persuasivo, e começou a me incomodar”, contou.
As ações do diretor a fizeram mudar na rotina. Sayonara contou que deixou, por exemplo, de usar perfumes e blusas que pudessem “chamar a atenção”.
Pelo fato de gostar de trabalhar na Escola da ALRN, ela tentava relevar o que o diretor fazia ou falava. Durante a Copa do Mundo de futebol masculino no ano passado, o cenário piorou.
“Eu comecei a me incomodar mais, porque foi quando começaram com os abraços, os cheiros no pescoço. Comecei a me incomodar, fui adoecendo, não queria mais ir trabalhar”, contou.
“Pedia para ele parar, dizia que íamos perder a amizade, mas ele não parava”, completou.
Em abril deste ano, a jornalista teve uma piora nas crises de ansiedade e recebeu um atestado do médico psiquiatra. “Comecei a ter falta de ar, coração palpitando…. Emendei o atestado em duas férias e não voltei”, contou.
A situação, então, ganhou contornos que afetaram as relações profissionais da jornalista.
“Eu soube que ele andava falando de mim na AL. Coisas do tipo: ‘Eu tive um caso com ela e não quero mais. Ela não está rendendo no trabalho, falta demais, quero tirar ela de lá'”, relatou.
Esse, segundo ela, “foi o gatilho que eu tive pra denunciar”. “Eu pensei: ‘já estou vivendo um inferno emocional, eu vou preferir continuar nesse trabalho ou vou dar um basta?’ Não posso viver dessa forma”.
Em fevereiro deste ano, a jornalista conta que viveu a pior situação dessa relação com o então chefe. Ela contou que passava por um momento financeiro complicado e que o diretor soube disso.
No dia 26, ele disse que tinha como resolver o problema e marcou um almoço para o dia seguinte, contou.
“A gente saiu da escola [da ALRN], ele parou e comprou dois vinhos. Ele desceu a Ladeira do Sol [na Zona Leste de Natal] e eu falei: ‘João, você está indo pra onde? Você tá me levando para um motel?'”
A resposta do diretor foi: “Essa palavra é muito forte, não vamos usar ‘motel’, estou indo pra um lugar mais reservado e ninguém vai fazer o que não quiser”.
Segundo a jornalista, o ex-diretor tomou os vinhos e pediu petiscos. Ela não bebeu nada.
No motel, ela conta que viveu o pior momento. “Ele tirou a camisa, tentou me abraçar, me beijar, perguntou porque eu resistia tanto e eu disse que não gostava dele”, contou.
No próprio local, ele teria ligado para um agiota e pedido dinheiro emprestado para que ela pudesse se resolver financeiramente. “Aí eu vi que eu estava totalmente nas mãos dele”, contou.
Ao entender o cenário, a jornalista contou o problema para o ex-marido, que pagou a dívida.
“Eu poderia ter pulado do carro, ter gritado, mandado parar o carro, mas eu não tive essa reação. Eu estava fragilizada emocionalmente”, disse.
A Polícia Civil confirmou que o boletim de ocorrência com a denúncia de assédio foi registrado nesta segunda-feira (17) na Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM) das zonas Sul, Leste e Oeste de Natal e que o inquérito será concluído no prazo legal. “O caso está sendo apurado sob sigilo”, informou a Polícia Civil.
O MP informou que, como a investigação ainda está em fase inicial, não irá se pronunciar no momento.
“O MPRN já requisitou à Polícia Civil a instauração de um inquérito policial para aprofundar as investigações, inclusive indicando diligências a serem cumpridas”, comunicou.
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Norte (Sindjorn) se solidarizaram com a jornalista e pediram “rigor e agilidade” para apuração das denúncias.
Foi solicitado ainda à AL que a “Comissão de Mulheres da própria instituição acompanhe de perto todo o andamento das investigações”.
Fonte: G1RN
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