DIA DA PIZZA –
“O segredo do demagogo é se fazer passar por tão estúpido quanto a sua platéia, para que esta imagine ser tão esperta quanto ele.” Karl Kraus –
Eu acordei temeroso de assistir aos telejornais ou ler os jornais de circulação nacional ou estadual, ouvir locutores de rádios, difusoras de parques de diversão e de quermesses de igreja ou do vendedor de picolé Caicó e, de repente, me deparar com a notícia da mudança do dia da controversa independência brasileira, por um ápice de inteligência de algum parlamentar, para o dia 10 de julho, no qual se comemorou o dia da pizza. Nada mais brasileiro. Por isso me inspirei naquele dia e escrevi o que segue.
O cardápio da dissimulação política nacional variou muito nos últimos tempos, incluindo, o churrasco, o panetone, sangue humano e até galhinhos de arruda, entre outros nomes de sentido furtivo, mas a pizza continua sendo a sinonímia da falta de decoro do sistema político nacional e de caráter dos seus representantes mafiosos, equipados com “air bags” para todos os tipos de escândalos. Talvez por isso ela tenha o formato redondo. Nos moldes da perversa desfaçatez, a política nacional se mede por uma pizza, com variáveis, apenas, para os tamanhos: esquerda, direita, centro e baixo clero, todos megalomaníacas no tamanho gigante, mas, obrigatoriamente, redondas como homenagem à enganação que representam. É a condecoração sob a forma de carretel, com queijo mussarela e orégano.
Quem não gosta de uma boa pizza? Estou perguntando aos que pagam a conta, pois para os que apenas comem e engordam seus glúteos patrimoniais e, descaradamente, endossam a conta para o povo pagar seria tão inócuo perguntar, quanto à recepção de denúncia contra políticos corruptos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que, insidiosamente, recebe, mas não julga. Sinceramente não sei o verdadeiro papel da Suprema Corte, mas, como bom nordestino, aprendi que quem cala consente. Qual seria o segredo que o STF cala não sei, mas sei que cala ou estou ruim das “oiças”, embora a surdez seja comum na terceira idade. Mas, esquecemos os pizzaiolos e comemoramos o dia da pizza.
Dizem que em São Paulo há tantas pizzarias que daria para um cidadão qualquer comer uma por dia sem repetição da pizzaria e dos sabores da pizza. Vejamos pelo lado prático. Quantos quilômetros o cidadão não precisará andar e quantos riscos não correrá (assalto, balas perdidas, flanelinhas e outras firulas mais) para saborear uma boa pizza em São Paulo? Por que, então, não elegemos a cidade de Brasília, a capital brasileira, como a capital nacional da pizza? Nada mais prático. É só nos dirigirmos a Praça dos Três Poderes, na Esplanada dos Ministérios e, encontramos o maior centro gastronômico de pizza do Brasil e o cardápio varia de versões municipais a federais, de preparadas por pizzaiolos pé de chinelo a altas autoridades da República. É uma variedade tão grande que a tortuosa Torre de Pizza da Itália foi o padrão adotado. Empilhando a quantidade de pizzas produzidas, por dia e em ritmo de Brasil grande, a torre que se formará será tão alta e inclinada quanto o monumento italiano, embora os intentos sejam menos exemplares e menos nobres.
Essa é quente!
Dizem que, por criatividade de uma CPI nas massas, e sem medo ser feliz ou da esperança vencer o medo, estão lançando um novo tipo a ser acrescida ao cardápio: a pizza Petrolão (e já estão ampliando o cardápio com outras iguarias: BNDES, Eletrobrás, Eletronuclear). Dizem que a qualidade das pizzas coloca Nova York no chinelo. Como qualquer pizza tem a massa fina ou grossa, com bordas recheadas por um creme chamado “conversa mole”; queijo mussarela, de feite cabra ruim; orégano, e o recheio principal será de notas comestíveis, nas versões real, dólar ou euro e, para se tornar única no mundo e em embalagem longa vida, uma versão especial adornada, além das notas, com um protocolo de uma denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) no STF. O protocolo, como na tradição japonesa, trará uma mensagem para o cliente, mas, mas seguindo a tradição da casa, em segundos, tudo virará dejetos a serem despejados em sofisticada rede de esgoto. Dizem que a mensagem é tão escabrosa que os poucos clientes apolíticos que conseguiram reserva de mesa estão comendo os tais adornos por vergonha ou medo de serem envolvidos nas enlameadas transações comuns no planalto central ou, pior, se acostumarem.
Mas há um problema quase insuperável para os amantes de uma boa pizza. A fila de reservas está cheia até o ano de 2020, mas, saindo um “toco” por fora, você pode conseguir uma mesa no prédio anexo. Os felizardos, que tem lugar garantido, são todos filhos da P… ou, desculpem-me, afiliados a um dos “P” que transformam Brasília na Chicago dos tempos de Al Capone, sem o risco de aparecer um Elliot Ness, embora o Juiz Sérgio Moro esteja fazendo um grande trabalho no sentido de socializar as receitas das pizzas, mas, a cada tentativa, os frequentadores ameaçam com uma indigestão nacional. Para garantir a privacidade do ambiente e a boa frequência de pessoas abastadas e seus coloridos rabos presos, a única forma de pagamento aceita é com Cartão Corporativo. Não são válidos Cartões do Ministério Público, Receita Federal do Brasil e da Polícia Federal. Os cartões dos diversos órgãos do poder judiciário e da PGR serão aceitos mediante acerto prévio. Pense num grupo fechado.
Por fim, foi proposto no Congresso Nacional um projeto de lei ou de emenda constitucional, por iniciativa de todos os partidos, que tornará obrigatória a aposição, na porta de entrada da tal pizzaria, de uma placa em neon, tal um puteiro, com os seguintes dizeres: É PROIBIDA A ENTRADA DE POBRES, MOTORISTAS E EX-MULHERES DOS FREQÜENTADORES VIPS, no caso, os parlamentares e políticos de todo o Brasil, numa grande conjunção carnal, digo, nacional. Por fim, tem uma recomendação que corre em sigilo (e a boca pequena) entre os frequentadores e por eles tratada com rigor: nunca peça uma “Brahma”, as coisas podem se complicar e, de repente, o risco de se ouvir sirenes dos carros da Polícia Federal e escolher alguns frequentadores para encenarem uma condução coercitiva até Curitiba e indiciá-los como cúmplices. De que? E eu sei. Eu nem conheço Brasília, não gosto de pizza e sou abstêmio.
Logicamente, pelos critérios impostos, eu e milhões e milhões de brasileiros estamos fora. Pobre não come pizza, recebe bolsa família e vota. Curto e grosso. Simples assim. Mas, eu conheço um “mano”, afilhado de um senador, que é garçom na tal pizzaria que afirma que o movimento é fantástico e que a pizza mais pedida tem um nome esquisito que ele não sabe o que é, mas sabe que se chama “habeas corpus preventivo”. Para ser a mais pedida deve ter algum recheio camuflado, mas ele não soube dizer. As receitas são guardadas a sete chaves. Mas vocês queriam o que? Participarem da festa? Tolinhos! Vão para casa e já que estamos em época de eleições, a noite vai ter vários comícios.
Quem sabe você não dá sorte e é contemplado com um pedacinho de pizza fria para experimentar as delícias republicanas degustadas, em seu nome, pelos mequetrefes que elege. Em época de campanha vale tudo, o risco é você gostar. Sem chances, nem o endereço do “mano” eu sei. Mas, concordo, poderia ser uma remota possibilidade de você, com a influência que o mancebo tem nos governos da capital do país, conseguir um emprego de garçom e, por ter se viciado, comeria, na calada das noites do cerrado, as sobras de campanha, desculpem-me, das pizzas. Fique tranquilo que não há perigo de contágio.
Os frequentadores podem não ser éticos ou com alguma moral, mas são limpinhos e quem trata a saúde no SUS é você. E se você adoecer? Bem, é uma resposta complexa. Se for uma disenteria simples, causada pelo excesso das sobras das pizzas, acho que o SUS resolve. Se o caso for mais grave recomendo anotar o número do telefone de Casas Funerárias próximas ou aproveitar a proximidade com os “homens” e conseguir uma “bolsa caixão de defunto” e morra como o mais besta dos pobres. Ataúde de madeira? Tolinho. É aquele velho e tradicional caixão coberto de tecido roxo, um crucifixo de alumínio no centro da tampa e alças tão frágeis que impõem o risco do pobre defunto cair no caminho, mas, pelo pouco que conheço a democrática sociedade brasileira, nem será notado, afinal, o que não faltam nos caminhos dos cemitérios brasileiros são pobres.
Adauto José de Carvalho Filho – AFRFB aposentado, pedagogo, Contador, Bacharel em Direito, Consultor de Empresas, Escritor e Poeta.
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