CLORO DA FARMÁCIA –
A Farmácia Natal, nas décadas de 40 a 70, ficava na esquina das ruas Ulisses Caldas com a Vigário Bartolomeu. Nas outras esquinas as Lojas Singer, os Cafés Magestic e Nações Unidas. Era seu proprietário o Sr. Clodoaldo Marques Leal, conhecido como Cloro ou Cloro da Farmácia.
Cloro tinha um estilo de vida muito especial. Usava quase sempre camisa branca, com uma gravata de borboleta preta (daquelas que tinha que dar o laço mesmo) e um charuto na boca. Não tinha formação superior, mas conhecia tudo de farmácia. Algumas pessoas confiavam mais em sua opinião quanto ao uso de uma medicação correta para determinadas doenças do que a opinião de um médico. Mas, ele sempre dizia – “Não sou médico só entendo de remédio”. Disto ele realmente entendia.
A sua alegria, juntamente com a dos seus amigos, fazia do estabelecimento comercial em ponto de encontro diário. Senhores de várias classes sociais iam lá para prosear. Confirmavam presença: Iderval Medeiros, Paulo Brandão, Gentil Nesi, Omar Lopes Cardoso, Juvenal Faria, Rui Lucena, Lourival Pereira, Ovídio Vale, Jeno e Jairo Tinôco. Geraldo Fernandes, Miguel Dantas, Túlio, Carlos e Marcelo Fernandes, Prof. Sérgio Santiago, Professor Celestino Pimentel, Veríssimo de Melo, Luiz Cortez, Antônio Cortez, Manoel Procópio de Moura, Paulo dos Santos, Manoel Varela, José Varela, Salviano Gurgel, Osvaldo Ribeiro, Jofre e Jaime Ariston, Inamar Dantas, Seu Pacheco (Hotel Tirol), Emídio Fagundes, Prof. Coutinho, Protásio Melo, Jurandir Costa, Geraldo de Paula e outros. Juntos, transformavam aquele local em papos sérios e também em brincadeiras constantes.
Conta-se que determinado senhor, com idade avançada, solicitou a Cloro um remédio para melhorar a sua potência sexual, pois tinha encontro marcado com uma mulher bastante jovem e estava com medo de não dar conta do recado. Cloro pediu-lhe para passar pela farmácia dez minutos antes do encontro acertado. Preparou um laxativo (purgante) violento e deu ao Dom Juan para beber (que não sabia, obviamente, o que estava a ingerir). Não deu outra, o homem borrou-se na presença da mulher. Só não matou Cloro porque este se escondeu com a conivência dos amigos.
De outra feita, chegou um homem bastante embriagado conhecido de Cloro, querendo um remédio para morrer, pois estava desgostoso com a vida. Depois de muita insistência Cloro resolve dar o veneno solicitado. Foi no laboratório pegou duas cápsulas amiláceas, feitas de trigo e sem nada dentro. Mas exigiu que o cidadão assinasse um documento dizendo que gostaria de se suicidar e doar seu montepio para os amigos.
O suicida assina o papel e logo foi deitar-se no chão da farmácia para morrer, com quatro velas acesas e os amigos rezando para a alma do futuro morto. Depois de esperar mais de uma hora pela morte, o suicida levanta-se e diz: – É o negócio parece que não é pra hoje não. O riso foi geral.
Contava Veríssimo de Melo que o plantão da Farmácia era uma verdadeira festa. Depois que o último bonde passava, por volta das 22h, a Rua Ulisses Caldas era fechada na altura da Prefeitura e então os donos dos cafés colocavam as mesas nas ruas. Cloro mandava chamar um sanfoneiro na Ribeira, convidava algumas “senhoras” que eram inquilinas das boates do mesmo bairro e aí a festa ia até o sol raiar.
Era assim Cloro, alegre, brincalhão, e gostava da sua farmácia. Onde passou quase toda sua vida ao lado de João Dias companheiro de várias décadas, que a tudo assistia com uma paciência enorme, vendo senhores alguns já bisavôs, transformarem aquele local de trabalho em um jardim de infância. Viravam meninos, muitos já se foram, mas a lembrança permanece viva para aqueles que conheceram Cloro.
A Farmácia Natal continuou na Rua Vigário Bartolomeu, onde funcionava seu laboratório de manipulação. A nós, filhos, netos, bisnetos e amigos restam à saudade. Uma lembrança que o tempo não apagará.
Guga Coelho Leal – Engenheiro e escritor