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SÃO CRISTÓVÃO, PADROEIRO DOS MOTORISTAS: LENDAS, SANTIFICAÇÃO E REVISÃO –

Quando criança, eu vi uma “procissão de carros” (hoje chamam “carreata”), passando à frente da minha casa, puxada por uma caminhoneta em cuja carroçaria seguia a imagem de um santo e músicos de filarmônica, entoando hinos sacros e dobrados. Perguntei ao meu pai o que aquilo significava; ele explicou-me ser o Dia de São Cristóvão, padroeiro dos motoristas, daí a homenagem dos choferes.

Anos passaram e eu compreendi melhor a razão da devoção: conta-se que Cristóvão, um líbio  de corpo avantajado e força descomunal, dedicava-se a conduzir nos ombros os viajantes que não conseguiam transpor o rio em cuja margem habitava o referido homem. Uma das lendas em seu entorno diz que certo dia transportou uma criança que pesou-lhe terrivelmente às costas. Indagando qual a razão de todo aquele peso, recebeu do infante a resposta de que era a encarnação de Deus, que ali conduzia as virtudes e os pecados do Mundo, o que induziu Cristóvão à conversão ao cristianismo, fé que lhe custou a própria vida, condenado que foi no reinado do imperador romano Décio, no ano 251, na Anatólia (hoje integrante da Turquia).

Muitas outras versões são apresentadas acerca da vida e do suplício de Cristóvão e a própria Igreja, em 1969, ao fazer uma revisão mais criteriosa de todos os seus santos, extirpou vários do rol sagrado, à míngua de evidências históricas e documentais de serem dignos desse posicionamento. Porém,  poupou o “Gigante Carregador” dessa espécie de “impeachment”, retirando-o do calendário litúrgico, mas admitindo as celebrações reservadas em seu louvor. 25 de julho ficou confiado apenas a São Thiago Maior, irmão de São João.

Uma luz se acendeu no rumo da reabilitação de São Cristóvão à inteireza sacral. É que em 2004 o Papa João Paulo II fez voltar as honras de um “patronato opcional” a Santa Catarina de Alexandria, cuja voz teria sido ouvida por Santa Joana D’Arc e cuja extirpação ocorreu pelos mesmos motivos da de Cristóvão: falta de elementos probantes do merecimento. Almejo que essa revisitação dos processos eclesiásticos seja retomada pelo Papa Francisco, sob os influxos de uma nova visão de aliança entre o sagrado, o histórico e o científico, para confirmar ou infirmar o status ora comentado.

E os motoristas? Os que têm fé continuam a depositá-la aos pés do seu multissecular patrono, pois nem só com combustíveis e pneus poderão levar a bom termo a missão de conduzir pessoas e coisas, contribuindo para o progresso da humanidade. É preciso ter ajuda divina. Amém!

 

Ivan Lira de CarvalhoJuiz Federal e Professor da UFRN – [email protected]

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