O JULGAMENTO AMPLIADO –
Aproveitando a trilha aberta (e desenvolvida) nos nossos últimos artigos, vamos continuar conversando sobre os institutos/técnicas processuais recentemente introduzidas em nosso direito pelo novo Código de Processo Civil. Hoje, especificamente, trataremos do denominado “julgamento ampliado”, previsto no art. 942 e parágrafos do NCPC.
Antes de mais nada, deve ser registrado que o instituto/técnica do julgamento ampliado veio (ao que parece em boa hora) para substituir o antigo recurso de embargos infringentes, previsto no CPC de 1973. De fato, privilegiando o voto vencido, mas com isso contribuindo para a morosidade do processo, afirmava o CPC revogado em seu art. 530: “Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência”. Trocando em miúdos, desses julgamentos não unânimes, caberia mais um recurso, para o próprio tribunal emitente da decisão recorrida, que seria processado e julgado conforme dispusesse o regimento desse tribunal (art. 533 do CPC/1973), quase sempre por um colegiado ampliado que podia, se assim entendesse, modificar a decisão recorrida”.
A existência dos embargos infringentes sempre causou polêmica. Se por um lado ele fomentava a segurança jurídica (permitindo uma nova e supostamente melhor análise da questão recorrida), por outro ele muito contribuía, sendo mais um de tantos recursos (e para o mesmo tribunal, às vezes para o mesmo colegiado), para a patológica morosidade processual brasileira. Seu cabimento foi sendo sucessivamente restringido com reformas à lei processual civil, culminando com a sua substituição, na sistemática do NCPC, pela técnica do julgamento ampliado.
A técnica/instituto do julgamento ampliado está previsto, como já dito, no art. 942 do NCPC que, em seu caput, dispõe: “Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores”.
No mais, segundo § 3º do art. 942 do NCPC, “a técnica de julgamento prevista neste artigo aplica-se, igualmente, ao julgamento não unânime proferido em: I – ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno; II – agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito”. Já não se aplica o disposto no caput do art. 942, segundo reza o seu § 4º, ao julgamento: “I – do incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas; II – da remessa necessária; III – não unânime proferido, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte especial”.
O melhor, entretanto, vem agora (como grande vantagem em relação aos embargos infringentes, que, como recurso, tinha toda uma formalidade e gasto de tempo): “Sendo possível, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado” (§ 1º do art. 942). Registre-se ademais que “os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento” (§ 2º).
Para se ter uma noção do quão mais desburocratizada e expedita é a técnica do julgamento ampliado, vou dar um exemplo prático do tribunal em que atuo, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Atuo, para fins de realização de sessões, perante a 3º Turma do TRF5, composta por três desembargadores. Nossas sessões são às quintas-feiras pela manhã. No mesmo dia e horário reúne-se a 1º Turma do tribunal. Se porventura, em razão de decisão não unânime em uma das duas turmas (pode ser que calhe acontecer em ambas), for o caso de se realizar um julgamento ampliado, as turmas se reúnem logo quando encerradas as sessões ordinárias, ali, no mesmo dia, com cinco desembargadores (e presidida pelo presidente da turma de onde se originou o caso), para o julgamento da questão. Ou seja, ao invés de se esperar a interposição de um recurso, toda sua tramitação etc., a coisa é resolvida incontinente, com segurança jurídica (valorizando o voto vencido) e rapidamente.
Um único problema – esse de ordem muitíssimo “prática”: em havendo julgamento ampliado, nossas sessões, que normalmente duram algumas horas, entram tarde adentro. E, sem almoço, haja fome, só mitigada por muito café e água.
Bom, mas esses são os “ossos do ofício” e, sem dúvida, somos pagos para isso.
Marcelo Alves Dias de Souza – Procurador Regional da República, Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e Mestre em Direito pela PUC/SP