AS PRÁTICAS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS –
Depois de um ano como Deputado Federal, eleito pelo Rio Grande do Norte, penso que vale a pena refletir — deixando que outros também o façam — sobre o jogo dentro da Câmara dos Deputados e como os congressistas tratam os reais interesses da população.
Desde o início, muitos amigos — especialmente familiares e militares — disseram que eu não tinha o perfil necessário para bem transitar como parlamentar. Não concordei com eles porque, afinal, somos representantes de uma das carreiras de Estado e, embora formados para nos mantermos afastados da política partidária, temos que saber representar nossos eleitores na vigência do pleno estado democrático de direito.
Assim, optei por enfrentar mais uma missão de vida. Apesar de não ser uma missão de natureza militar, encarei o desafio com o mesmo espírito e guardando os mesmos princípios e valores, éticos e morais, que devem orientar os servidores públicos.
Juntamente com minha equipe, planejamos, administramos, coordenamos, articulamos e oferecemos estudos para que decisões fossem adotadas. Estudamos e discutimos temas de interesse nacional e local, conversamos com pessoas, bem como oferecemos apoio aos que nos pediram orientações de naturezas diversas.
Na atual legislatura, a 56ª da história da República, passei a conviver com outros 512 Deputados Federais e 81 Senadores sabendo que, pela própria ritualística do legislativo em todo o mundo, um parlamentar sozinho não decide nada. Ele pode e deve articular com os demais colegas as ações de interesse da população, oferecendo experiências e conhecimentos. Para isso existem comissões permanentes e temporárias, com funções legislativas e fiscalizadoras. Há também bancadas, frentes e grupos parlamentares. Contudo, todas as principais discussões, articulações e embates são levados ao plenário, para as decisões finais.
Nesse ambiente de plenário, lamentavelmente, estão as maiores distorções. As votações são pautadas conforme acordos de lideranças, delimitando desde o entrar ou não na pauta, o quando entrar e até como cada partido ou bloco deve votar. Com isso, proposições importantes são esquecidas e outras ganham celeridade, ao sabor de acordos feitos entre poucos. Além disso, não é incomum que novos textos e emendas sejam apresentados intempestivamente, terminando por serem aprovados sem que a maioria possa avaliar o mérito com a profundidade que a sociedade exige.
Exemplo recente foi a chamada Lei da Ficha Limpa, cujo formato inicial foi totalmente reconfigurado ao longo do processo em plenário, sem que muitos parlamentares tivessem como examinar adequadamente os conteúdos aprovados. Por isso considero que o rito praticado no Congresso funciona mal.
O Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD) é seguido somente nas práticas convenientes à cúpula que, não raro, cede às pressões dos partidos mais bem organizados, praticantes da “velha política”.
Os artigos 83 e 117, por exemplo, permitem uma série interminável de manobras protelatórias da oposição, com o intuito de atrasar e acumular a pauta de votações. São requerimentos relacionados a preferência, urgência, adiamento, retirada da Ordem do Dia, inversão de pauta, prorrogação de prazo, audiência de Comissão, destaque, votação por determinado processo, e votação de proposição, artigo por artigo, ou de emendas, uma a uma.
Na maioria das vezes, a Mesa Diretora aceita passivamente todos esses recursos, embora os parlamentares saibam que, ao fim e ao cabo, por ocasião das votações nominais, o mais comum é que a esquerda seja fragorosamente derrotada, no mérito. Contudo, esse retardo obtido por meio dessas medidas protelatórias, causa danos à celeridade dos trabalhos e, a pauta de reformas e votações termina por ficar progressivamente acumulada, com graves prejuízos para a população brasileira.
Por outro lado, outros dispositivos do RICD são constantemente desobedecidos, sob o beneplácito da cúpula. No começo do ano legislativo de 2019, entramos com requerimento junto à Secretaria Geral da Mesa para que fosse cumprido o art. 74, o qual estabelece que o Deputado só poderá falar, durante as sessões plenárias, “sobre a proposição em discussão”. Esse requerimento sequer foi respondido, e a prática continua sob o pretexto de que “é um hábito da Casa”.
Assim, o cidadão de bem que tenta acompanhar as discussões plenárias da Câmara dos Deputados certamente deve ficar revoltado com os discursos da esquerda, totalmente divorciados das matérias em pauta, em atitudes que mais parecem de escárnio frente aos anseios e às necessidades do povo brasileiro.
Winston Churchill, primeiro-ministro do Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial, disse certa vez que “se as pessoas soubessem como são feitas as salsichas e as leis, não comeriam as primeiras e não obedeceriam às segundas”. Lamentavelmente, podemos estar passando por situações semelhantes, no Brasil de
hoje.
Quanto à convivência com os pares, já ouvi algumas afirmações não muito educadas ou apropriadas como, por exemplo, “aqui não é quartel”. É uma pena que não seja, porque faltam disciplina e respeito para com a sociedade e com os demais parlamentares.
Encerro afirmando que toda essa conjuntura — complexa e eivada de vícios — não me desanima. Na verdade, trata-se de uma série de desafios que se apresentam em mais essa missão de vida, como servidor da Pátria. E, contrariando os amigos, sinto-me cada vez mais preparado e revigorado para lutar contra essa “política tupiniquim”, ao tempo em que conclamo os demais companheiros de farda a juntarem-se a nós, porque assim esperam os cidadãos de bem — maioria esmagadora da sociedade brasileira.
Eliéser Girão Monteiro Filho – Deputado Federal pelo Rio Grande do Norte
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