ATIRE A PRIMEIRA PEDRA QUEM NUNCA… – 

Quem nunca caiu na tentação de um pãozinho francês com manteiga? quem nunca desejou a beleza e a vida confortável de um artista de cinema ou estar no topo da pirâmide financeira com o glamour de uma celebridade do Prêmio Nobel? Pois é, quem nunca, não é mesmo? Quantas vezes tivemos que invocar os deuses da paciência para que a nossa ira não esganasse nossos desafetos? Ah, nem me lembrem dos dias que tive que me arrastar para cumprir com as obrigações, quando na verdade, a vontade era a de chutar o pau da barraca e ficar no balanço da rede estendida na varanda de casa.

E a carteirada (tão na moda nesses tempos pandêmicos)? Quem nunca teve vontade de esnobar e dizer: Você sabe com quem está falando? Agora, espere um instante, pense bem e responda a si mesmo, e não me venha dizer que nunca sentiu atração pela namorada de seu melhor amigo, ou não foi tentado por ter ou realizar fantasias indecorosas?

Quem nunca… rebole a primeira pedra. Rebole e corra ligeiro, batendo as pernas na bunda. Se avexe, avie, porque a pedra pode retornar, atingindo seus alvos. Por que escolhemos, conscientemente, o que sabemos ser errado? Por que optamos pelo errado? Essas indagações estão no primeiro capítulo do livro Pecar e Perdoar: Deus e o homem na história, do historiador Leandro Karnal. Partindo desse princípio, interrogo-me: O pecado voluntário estaria fadado ao fato de que tudo seria perdoado desde que justificado?

Não obstante, ou desde sempre, temos nos deparado com fatos estranhos, ações – desde as mais corriqueiras, socialmente aceitáveis, mesmo sendo incorretas -, até as mais bizarras atitudes que contradizem os princípios religiosos, morais, éticos e de convivências sociais.

São tempos em que uma basílica custa “Bilhões, minha filha, bilhões”, sem dia nem hora para ficar pronta, mesmo com dinheiro em caixa e toda tecnologia à disposição, acho que nem as pirâmides de Gizé levaram tanto tempo para ficarem prontas, considerando o tempo e espaço de cada evento. São tempos em que a vontade de uma comunidade educacional não prevalece, há sempre alguém com poder maior e interesses diferentes, fazendo valer sua vontade, sua posição de poder. São tempos em que a família, a crença e a fé justificam atos ilícitos como resultado da “cura”. São tempos em que precisamos entrar pelas portas dos fundos para fazer valer nossos direitos.

O que é mais cristalina, nas sóbrias compreensões, em todas essas condutas, ferrenhamente defendidas como corretas e acima de quaisquer julgamentos, é o fato de que as pessoas usam a fé, as leis, as normas e a moral, desabonando-as em benefícios próprios, em causas individuais, mesquinhas e egoístas. Levantando “bandeiras” incrédulas e cruéis, antidemocráticas e absolutistas. É fato que, desde que mundo é mundo, o homem arruma desculpas para justificar seus atos ilícitos, para torná-los “corretos”.

Não, não atiro… ela poderia voltar-se contra mim, contra tantos que amo e respeito, contra os que tentam fazer o certo, mas erram pelo simples fato de serem humanos, e não há nada de errado em sermos humanos e sucumbirmos, em algo momento, em nossas fragilidades. O que não podemos deixar acontecer é que isso, o sucumbir ante a nossa fragilidade, vire rotina, que se torne normal e que a consciência se envernize ao ponto de justificar atos que maltratam o próximo e corrompem a alma, aprisionando o ser nas correntes da maldade voluntária, encarcerada pelo egoísmo e doenças de uma alma violada pela maldade que assola nossos dias. Pior daquele que age voluntariamente é aquele que concorda, defende e luta descaradamente por pura conveniência e conivência.

Quem nunca… Atire!

 

 

 

 

Flávia Arruda – Pedagoga e escritora, autora do livro As esquinas da minha existência, [email protected]

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