BELICOSO –

Eu, que me considero um sujeito pacífico, tive um sonho belicoso. Felizmente, foi antes da II Guerra e no meu tempo de menino. Por volta dos anos 1938/1940. E as “armas” eram todas de brinquedo.

Talvez já pela beligerância que já começava a surgir nesse tempo, a maioria dos brinquedos masculinos tinham a ver com armas. Normalmente, eram de origem chinesa, japonesa ou alemães. As chinesas representavam bem a “surra” que estavam levando dos japoneses. Eram vagabundas, mal fabricadas, quebravam com uma enorme facilidade. As japonesas eram melhores. Mais bem fabricadas, mais resistentes e duravam mais. Mas, comparadas com as alemãs, que dominavam o mercado, não ganhariam nunca uma guerra. E todas tinham conotações belicosas.

Quisessem me fazer raiva, me dessem um brinquedo chinês. Chateado, me dessem um japonês, mas se quisessem me dar satisfação e alegria me dessem um brinquedo alemão. Os chineses e japoneses, os encostava na hora. Às vezes, por curiosidade, usava um ou outro, mas quebravam logo. Mal feitos e feios, embora muito baratos.

Os alemães eram bem mais caros. Mais valiam a diferença. Bem fabricados, qualidade excepcional, apresentação e acabamentos aprimorados, davam prazer brincar com eles. Tinham um problema, naquela época sem maior importância para um menino de minha idade. Eram todos belicosos.

Tanques, aviões, navios, caminhões cheio de soldadinhos de chumbo, motocicletas com “sidecar”, carros de comando, todos com os símbolos nazistas pintados dos lados. Os carros de comando eram esses usados por eles: pretos, sem capotas, para cinco pessoas, idênticos aos usados na Alemanha. Material de qualidade, raramente quebravam, e traziam inovações sensacionais. Tive um carro de comando que você podia usar em cima de uma mesa e, quando chegava na ponta, em vez de cair fazia a volta e continuava andando na mesa. A solução, supersimples; uma roda embaixo que, quando chegava no fim da mesa que as rodas da frente saíam, ela encostava e trazia o carro de volta.

E tinha os soldadinhos de chumbo. Eu tinha muitos alemães e ingleses, e os arrumavam para combater e sempre dava vantagem na arrumação aos ingleses. Apesar de não me lembrar de nenhum brinquedo inglês, sempre fui anglófilo.

Depois da guerra, tudo que prestava e a preço barato, era fabricado no Japão. Hoje, tudo é fabricado na China. Os dois copiaram muitas tecnologias americanas e europeias e faziam as mesmas coisas, com qualidade semelhante por metade do preço. Hoje, desenvolveram suas próprias tecnologias e já fabricam até vírus. Durma-se com um barulho desses. Felizmente, acordei logo.

 

 

 

Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores
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