CADÊ OS INTELECTUAIS ? –
Esta semana que passou, veio-me à cabeça as palavras que Hegel (1770 a 1831), noutro contexto, escreveu no inicio de um ensaio sobre a Constituição alemã: “A Alemanha não é mais um Estado”.
Quem observa o patropi, fica deveras embaraçado. Antes de tudo, deve colocar de lado esses documentos sem valor que são as constituições (nacional e estaduais) e as leis orgânicas municipais. O patropi caminha como se estivesse numa aventura, sem mapa, numa região sacudida por um terremoto ou por um ciclone. Nem mais o Supremo Tribunal Federal, última instância para defesa do cidadão, é respeitado.
Alguns chamam isso de “anomia” (falta de objetivos, regras e perda de identidade).
Trata-se, portanto, de propor alternativas culturais e ideias novas que cimente redes solidárias.
Todavia, o foco da minha preocupação é a ausência (ou omissão?) de formuladores e, consequente, não produção do conhecimento novo acerca de nossa sociedade, e das tendências mundiais.
Há cerca de quatro décadas que, no patropi, não se conhece análise consistente sobre nossa experiência histórica recente. Tudo se passa como se um grande desalento houvesse tomado conta da nossa “intelligentsia”. Como consequência, a imprevisibilidade caracteriza o nosso tempo histórico.
Resgato aqui o que foi esse processo em nosso país:
No Brasil do século XIX, não havia espaços próprios para a intelectualidade. Já durante o Império, uma alternativa dos pensadores de então era a carreira na diplomacia, posto público que garantia ganho financeiro, permitindo atividade intelectual paralela.
Só no século XX se dá a consolidação de instituições “propriamente intelectuais”, como as universidades, abrindo as “cátedras” autônomas e, a partir disso, ocorre a profissionalização da atividade.
Provoco: no século XXI, qual o papel do intelectual na Sociedade da Informação? O da omissão?
Como ensina a professora Angela Alonso (USP), há “profissionais do conhecimento”, vinculados à Universidade “da porta para dentro”; e há “intelectuais públicos”, empenhados na enunciação e posicionamento político-partidário.
Entendo, e lamento, que a universidade brasileira tenha passado por um processo de burocratização, tornando-se um “lócus” de habilitações, mais instrumental do que produtora de conhecimento novo.
Tem alguém pensando, na Universidade?
É o que pondera também o jornalista Bernardo Kucinski, para quem a fase da grande Sociologia acabou. “Não é mais a ciência em busca da verdade histórica, mas é a “ciência das carreiras docentes”.
O status da carreira docente passou a nortear os requisitos da Universidade, como a “produtividade”, publicações de artigos “científicos”, títulos, orientações e bancas, que aprovam teses que não são lidas.
Lamentavelmente, os intelectuais desta geração se dividem:
1) os que se despolitizam, impregnados pela ideia-mestra de que “não há mais utopias”, dedicando-se unicamente à Academia – onde, “a rigor, não há diferença entre um filósofo e um engenheiro e; 2) os que assumem novas ideologias niilistas (a vida não tem sentido) ou estoicas (resignação).
A historiadora Maria Helena Capelato corrobora essas considerações e faz uma distinção entre os pensadores comprometidos com a vida política. “Há intelectuais orgânicos ligados a partidos políticos; há aqueles engajados, mas sem vinculação partidária; e há os que apenas produzem conhecimento mantendo a velha postura, típica do século XIX do “sábio”, pensando e falando para si mesmo”; ou pregando no deserto.
Dou de graça estas provocações e, penso que os intelectuais têm obrigação de formular respostas:
Que cenário novo está sendo montado, ao longo do século XXI? Quais as grandes tendências?
Que ideologia está dominando a mídia à essa altura da história da humanidade? Conseguirá o capitalismo consolidar um novo padrão de acumulação viável? Que novas formas de gerenciamento da economia internacional estão surgindo? Como explicar a desconstrução das famílias e das empresas? Por que milhões de seres humanos estão vivenciando, epidemicamente, a depressão e a ansiedade?
Qual o novo conceito integrador das ciências? Os conceitos da Física quântica, ou não?
Que valores morais servirão de referência para a humanidade?
A ambição, a ganância, o individualismo, a competição, a busca do lucro máximo, a destruição ambiental, a desigualdade social e regional, o colonialismo, a dominação, o autoritarismo, a multiplicação dos refugiados e a violência crescente; ainda serão os nossos paradigmas? No Século XXI?
Por que não se produzem textos novos sobre temas tão impactantes?
Nesse sentido, somos ainda uma sociedade sem alternativas. Fico assuntando: cadê os intelectuais?
Rinaldo Barros é professor – [email protected]