CAFÉ DA MANHÃ –
O café da manhã é a continuação do banho. Claro, alguns não seguem essa ordem natural, mas eu e muitos outros fazemos isso. Primeiro, o banho matinal e, depois, o café da manhã.
Ao pensar nisso, me veio à lembrança um amigo, radioamador do meu tempo dos 40 metros, com quem eu falava todos os dias de manhã cedo. Pernambucano, morador do Recife, era figura imperdível pela manhã, pela sua verve, simpatia e bate-papo.
Os assuntos eram os mais variados. Falava-se de tudo e de todos, aqui com certa parcimônia e cuidado, para não melindrar quaisquer outros circunstantes na frequência. Essa conversa devida durar uns 45 minutos, uma hora, no máximo. E ele se despedia com um “até amanhã, moçada; vou tomar o meu café covarde”.
Confesso que ficava em dúvida: que diabo era café covarde? Um dia, não aguentei e lhe perguntei. Fernando, que diabo é café covarde? A reposta dele nunca esqueci: é aquele que não vem só para a mesa. Sempre acompanhado com pão, queijo, pamonha, canjica, um ovinho frito ou à lá cock, ou qualquer outra coisa que o possa acompanhar. Ou seja, com alguma coisa adicional, que lhe dá a coragem necessário para se apresentar.
Pois bem. Depois do banho tomo o meu café covarde. Como não sou de comer muito, o meu vem acompanhado, mas não tão bem acompanhado quando o do meu amigo radioamador.
Junto com ele, o café, minha secretária traz dois ovos fritos ou fervidos, um queijinho, claro que o pão, francês de minha preferência, um suco de entrada, normalmente de laranja. O que mais me magoa nisso tudo é que estou sempre só. Embora o café crie coragem e apareça, às vezes eu que não gosto de aparecer. Minha mulher não me faz mais companhia e isso me tira o prazer do café, por mais acompanhado que possa vir. É a vida.
Repito esse ritual todos os dias, que complemento com um almoço e jantar também covardes, mas sempre evitando comer muito, para manter a “plástica”. Usualmente só, o que não me dá nenhum prazer. Felizmente, sábados e domingo, geralmente, saio com um ou outro neto para almoçarmos em algum lugar. Isso quebra um pouco a monotonia, e me dá coragem para enfrentar a semana seguinte. É a vida, que tento levar da melhor forma, superando esses obstáculos, que sei não serem só meus. Coragem, vivo me dizendo, “bola pra frente que o Real Madrid não é de nada”.
Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN