CAFONA –

Um dia vi um casal de idade avançada escolhendo cortina. Ela olhava tecido por tecido e, por fim, escolheu o que levaria. O esposo a olhou e disse:

– Cafona.

Ela torceu o nariz e seguiu para o caixa. Comprou sua cafonice.

Ri da palavra. Não lembro qual a última vez que havia ouvido isso: cafona. Uma palavra perdida no tempo. E gostosa de falar! Como “farofa” “bumbum”. Não é delicioso encher a boca e falar estas palavras? Pois bem! Algumas palavras, ironicamente, tornaram-se cafonas, não usamos mais. Se perderam no tempo enquanto outras entram no nosso dia a dia. Parece que várias estão fora de moda ou “out”, como se diz atualmente. Como retrato. Virou fotografia e, agora, foto. Amo a palavra retrato. É forte, impactante. Retrato… Lembro de meu avô falando do califon de uma amiga. Achava engraçado, curioso mesmo, como ele se referia ao sutiã.

Estava assistindo a um vídeo ensinando a fazer pão. Nas instruções: pegue o bowl. Cadê a tigela? A vasilha? Flavinho me perguntou: qual a diferença de bowl para tigela? Estética na pronúncia, respondi.

– Ah, vou continuar chamando tigela, tá?

Não vamos brigar por isso!

Quando criança ganhei uma coleção de lápis de cor. Lembro do azul claro e do escuro, da mesma forma que o marrom, com duas opções. Agora, temos azul Tiffany! Que fantástico.

Nesta “vibe”, fui encomendar um “sousplat”, nova palavra no nosso convívio.

– Magenta? – a pessoa do outro lado sugere.

– Que cor é essa? – pergunto mostrando um desconhecimento total.

– Magenta, filha, fúcsia.

Fiquei na mesma.

– É um roxo leve?  – arrisquei.

– Não, filha. Magenta é magenta, ninguém usa mais o roxo.

– Oxente, eu uso!

Talvez “oxente” esteja, também, fora de moda. Desisti e pedi azul marinho.

– Você quer o azul petróleo, o Bic ou sub zero?

Caramba! Está ficando difícil. Mudo mais uma vez.

– Quero rosa choque!

Tranquilo, sem erro. Doce ilusão.

– Pink?

No inglês era, mas pode ser uma pegadinha. Prefiro não arriscar. Cansada, digo:

– Meu bem, escolhe uma cor bonita que confio no seu bom gosto.

Desisti. Desisti, também, de mostrar a nossos filhos a importância de frequentemente usar o Aurélio. Sim, ainda chamo o dicionário de Aurélio. Acho que eles não se adaptaram a isto. Até porque algumas palavras devem aparecer com significado descontextualizado.

Curtir tomou o lugar de gostar.

Compartilhar substituiu dividir ou encaminhar.

Culinária foi-se para gastronomia.

Dono de cachorro virou tutor ou mamãe dog.

Telefone é celular! Mas, celular é relativo à célula, processos celulares… Telefone seria só o fixo? Quem ainda usa? Palavra e objeto…

Algumas pessoas se tornaram “cases de sucesso”.

Qual será a próxima palavra que me fará refletir? A nossa língua já não é rica o suficiente para precisarmos incorporar wireless, pet e top? Achei que era.

Um dia perguntei ao nosso Felipe:

– Não é engraçado que manga pode ser a fruta, a parte da camiseta ou o verbo mangar, que usamos aqui no Nordeste?

E ele me responde:

– Mãe, quando o pato perde a pata ele fica manco ou viúvo?

Gargalhei.

Não achei a piada cafona…

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista e Professora universitária

 

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

 

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