“É natural que eles fiquem ansiosos com a incerteza da situação”, disse à BBC Mundo Abdulgani Serang, do sindicato Indian Boaters’ Union, que representa a equipe do Ever Given.
Mas Serang também destacou que a Bernard Schulte, empresa alemã que alugou o barco e contratou a tripulação, é conhecida e os marinheiros têm acordos sindicais adequados.
Quando o Ever Given encalhou, inicialmente se culpou as condições meteorológicas. Mas logo os investigadores passaram a questionar a competência do pessoal e uma possível negligência.
Alguns meios de comunicação na Índia noticiaram a preocupação do sindicato de que a tripulação pudesse ser usada como bode expiatório, inclusive com possibilidade de prisão domiciliar.
Mas Serang lembra que, embora “o navio tenha sido apreendido por ordem dos tribunais egípcios, não foram levantadas dúvidas sobre seu profissionalismo”.
No momento, o status oficial do navio é de “confiscado”, segundo a Evergreen, empresa de navegação que aluga porta-contêineres da holding japonesa Shoei Kisen Kaisha. Ninguém foi formalmente acusado pelo incidente.
Especialistas alertam que a resolução desse litígio internacional entre todas as empresas, seguradoras e agências governamentais pode levar anos.
Enredo legal
Enquanto a Autoridade do Canal de Suez argumenta que os esforços para libertar o navio foram caros e deveriam ser compensados, os armadores entraram com um processo no Reino Unido contra a empresa que operava o Ever Given.
Em meio a esse intrincado contexto jurídico está a tripulação.
“Não houve perda de vidas, nenhum derramamento de óleo ou atividade criminosa no incidente. É apenas uma questão civil sobre as implicações financeiras negociadas pelos proprietários egípcios, fretadores, seguradoras e autoridades”, disse o representante do Sindicato Indian Boaters’ Union.
“Parece que a tripulação indiana a bordo do Ever Given terá que estar preparada para uma longa prisão”, disse o capitão Sanjay Prashar ao jornal The Times of India.
Pelo lado positivo, a investigação da ITF concluiu que não houve violação dos contratos de pessoal do navio e que todos receberam seu salário de março.
É por isso que neste momento não se considera um caso de abandono como o do marinheiro Mohammed Aisha, que foi obrigado a ficar quase quatro anos num navio abandonado na costa sul do Egito. As autoridades só queriam permitir que Aisha deixasse a embarcação quando o dono do navio encontrasse um substituto para o lugar dele ou quando o navio fosse vendido.
De acordo com a Federação Internacional de Trabalhadores em Transporte, no Egito, oficiais a bordo de navios detidos ocasionalmente acabam em um status equivalente a prisão domiciliar, às vezes por anos.
Não é a primeira vez
Na verdade, não é a primeira vez que a tripulação de um navio fica presa contra sua vontade.
Em junho de 1967, 15 navios que passavam pelo canal foram pegos no fogo cruzado entre Israel e o bloco formado pelo Egito, Síria e Jordânia durante a Guerra dos Seis Dias.
Enquanto o conflito estava sendo resolvido, os barcos ancoraram no Grande Lago Amargo para não virarem alvos.
A guerra terminou no dia 10 de junho, com a derrota dos três países árabes.
Mas o Egito manteve o bloqueio e os 14 navios não puderam partir.
Graças às negociações diplomáticas, alguns dos marinheiros partiram em duas semanas, disse Peter Snow, apresentador da BBC Radio 4, no programa de 2010 The Yellow Fleet. Mas o resto da tripulação ficou preso por três meses.