A Controladoria Geral da União (CGU) apontou que houve fraude processual nos contratos de compra de 50 ventiladores pulmonares por parte da Secretaria Municipal de Saúde de Natal (SMS) em uma dispensa de licitação.
Segundo o relatório de auditoria, na Dispensa de Licitação nº 40/2020, no valor de R$ 1.397.500,00 (cada ventilador por R$ 27.950,00), constam três propostas de preços, além da proposta da empresa vencedora, e todas elas com datas anteriores à abertura do processo.
“A partir da análise inicial das propostas comerciais desses potenciais fornecedores, foram verificadas inconsistências que, no exame mais aprofundado, se confirmaram na negativa de participação da empresa LemOde e desconhecimento do processo e especificações dos ventiladores por parte das empresas TopLum e White Martins”, cita o relatório.
As três empresas foram questionadas pela auditoria da CGU.
A empresa LemOnde negou que o documento que consta no processo tenha sido enviado por ela para participação no certame. “Como se observa na manifestação da empresa consultada, ela não participou do certame e desconhece a autoria da proposta que leva a sua logomarca, o que acena na direção de tratar-se de um documento falso”, diz o relatório da CGU.
Já a segunda empresa, a Top Lum, apresentou proposta de preço para ventilador pulmonar móvel, ou seja, para uso pelo SAMU, que não somente não serve para uso hospitalar como não compete em preço com o ventilador para unidade hospitalar por ter características diferentes.
A empresa declarou “que, ao solicitar a especificação técnica dos ventiladores pulmonares à SMS, essa não o disponibilizou e o orientou verbalmente que apresentasse os modelos disponíveis da empresa e assim foi feito”, cita o relatório. “Em virtude da omissão da SMS quanto à liberação das informações solicitadas, esse fornecedor fez o pedido formalmente o qual foi protocolado em 06.05.2020, porém, não obteve êxito em seu pleito”.
A empresa White Martins informou que fez uma cotação à SMS solicitada verbalmente, porém, sem qualquer especificação do ventilador e não obteve mais conhecimento do resultado da dispensa. “O fato demonstra que não havia na Secretaria de Saúde uma especificação do respirador que iria adquirir, deixando em aberto a aceitação da proposta na discricionariedade de quem estava à frente do processo”.
Para a CGU, confirma-se que não houve cotação de preços junto às empresas. “Os fatos demonstram a frustração ao caráter competitivo, fraude documental e montagem de processo na Dispensa de Licitação nº 40/2020”, diz o relatório.
Ainda de acordo com o relatório, com relação ao trâmite do processo, o projeto básico foi elaborado utilizando a especificação do produto do fornecedor previamente escolhido, após o recebimento das propostas de preços, ou seja, fez constar na especificação a marca e o modelo do ventilador pulmonar do fornecedor, que no caso foi a empresa Philips (CNPJ 58.295.213/0021-11). Isso descumpre o inciso I, parágrafo 7°, do artigo 15°, da Lei n° 8.666/93.
“Todas as empresas consultadas negaram conhecimento da realização da dispensa de licitação ou terem recebido documentos a esse respeito, inclusive, negam ter recebido as especificações técnicas dos equipamentos. Os fatos expostos demonstram que houve uma fraude documental e consequente montagem de processo de dispensa, causando também a frustação do caráter competitivo do certame”, cita o relatório.
Por meio de inspeção física desses ventiladores pulmonar, de 18 a 21 de setembro de 2021, a maior parte desses equipamentos se encontram armazenados nas unidades de saúde de destino por falta de demanda de uso.
Em nota, a SMS disse que o processo para a aquisição dos equipamentos se pautou pela Lei n 13.979/2020, editada para facilitar compras públicas durante a pandemia, “cabendo ressaltar que a contratação foi realizada de forma direta, como permite a lei, sem a necessidade de concorrência, em face da falta de ventiladores pulmonares do mercado”.
O órgão citou que optou por realizar levantamento de preços de mercado, “a fim de comprovar que a aquisição se daria do modo mais vantajoso e econômico possível, como de fato ocorreu, bastando comparar os preços ofertados pelos concorrentes”.
Os 50 ventiladores pulmonares novos da marca Philips foram comprados diretamente do fabricante por R$ 27.950,00, segundo a SMS. “Ao contrário do que foi interpretado pela CGU, a Empresa LemOnde, ofertou, sim, respiradores idênticos, da marca Philips, ao preço unitário de R$ 150.000,00, conforme e-mails fornecidos à CGU pela própria SMS/Natal”.
“A referida empresa alega que desconhece o representante comercial que fez contato com a Secretaria de Saúde de Natal, porém, como a proposta da empresa não chegou nem perto do valor ofertado pela vencedora, a SMS não se obrigou a realizar a análise documental da LemOnde, tendo descartado a possibilidade de contratação, em razão desta não ter ofertado o menor valor, conforme a própria auditoria da CGU demonstrou”.
Por isso, segundo a SMS, “não existe fraude ao processo de contratação, mas tão somente uma modalidade de contratação permitida por uma legislação excepcional, editada em decorrência da pandemia, a qual acabou com qualquer lógica de mercado”.
A SMS disse ainda que os valores foram discutidos com o Ministério Público Estadual “justamente visando evitar qualquer irregularidade no processo” e que os equipamentos “continuam à disposição da rede assistencial do Município, não havendo assim que se falar em qualquer dano ao erário”.
O relatório da CGU também apontou que houve um prejuízo de R$ 1.498.000,00 aos cofres públicos decorrente da não utilização de 14 de um total de 15 ventiladores pulmonares adquiridos pela Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap). O valor de cada ventilador, da empresa Baumer, foi R$ 107 mil.
“Os hospitais que os receberam não os utilizaram sob a alegação da existência de problemas técnicos e operacionais, porém, nem a direção dessas unidades de saúde nem a Sesap tomaram providências quanto aos fatos, visto que esses equipamentos estão cobertos com garantia e assistência técnica do fabricante”, cita o relatório.
Um dos técnicos especialistas explicou que “ao se utilizar esse tipo de aparelho, é necessário se fazer incialmente um autoteste dos parâmetros selecionados e durante esses testes os aparelhos não mantiveram os parâmetros. Assim, por precaução, esses ventiladores não foram utilizados nos pacientes, de tal forma que eles ficaram inutilizados, permanecendo com o uso dos equipamentos já existentes no hospital”.
Em nota, a Sesap disse que os 15 aparelhos – que possuem registro da Anvisa – foram comprados para utilização em pacientes Covid-19. Seis foram para o Hospital Regional Deoclécio Marques, em Parnamirim, e outros nove cedidos à Prefeitura de Parnamirim, sendo oito para o Hospital de Campanha de Parnamirim e um para o Hospital Deputado Márcio Marinho – apenas esse último está sendo utilizado.
“Vale salientar que até a inspeção da CGU, nem o Hospital Deoclécio Marques e nem o Hospital de Campanha de Parnamirim comunicaram os problemas à Sesap“, disse em nota a pasta.
Diante disso, segundo a Sesap, foi dado início aos procedimentos de conserto dos equipamentos e reinstalação. A solicitação à Baumer para o conserto dos 14 ventiladores pulmonares que apresentaram problema de calibração aconteceu em dezembro de 2020.
Seis aparelhos que estavam no Deoclécio Marques foram consertados, dos quais quatro já estão no hospital e 02 foram transferidos para o Hospital Giselda Trigueiro, em Natal.
“Já em relação aos nove ventiladores cedidos para a prefeitura, informamos que oito equipamentos destinados para o Hospital de Campanha do município estão sendo calibrados e, tão logo seja concluída essa etapa, serão disponibilizados para funcionamento nas unidades”, explicou a Sesap.
Fonte: G1
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