CHEIA DE HISTÓRIAS E ALGUNS VAZIOS… –
“O homem é um vazio de infinito que
precisa ser preenchido…e apenas algo com
sabor de infinito poderá preencher este vazio”
Splett, pensador alemão.
– Não posso deixar o meu ego passar fome!
A frase não é minha, mas bem que poderia ser. Eu até já me apossei dela e a tomei como bordão. Na verdade, a frase foi proferida por uma amiga, logo após ela receber um elogio muito simpático. Eu achei a frase massa. Levou-me a percorrer muitos caminhos e estabelecer algumas conexões com espaços vazios. Daí a ideia de me valer dela, da frase, tentando alimentar os vazios que se amontam em minha alma.
Sim, temos muitos vazios preenchidos pelas ausências, pelos silêncios, pelas despedidas. Existem vazios cheios de saudades, vazios transbordando despedidas abarrotadas pelo tempo. Alguns vazios estão empanturrados de histórias desenhadas no cerne da razão pelos pincéis das emoções. Tem vazios cheios de palavras não ditas, de beijos não dados, de abraços negados. Tem vazios cheios de amores não correspondidos e olhares roubados.
Hoje, eu tento preencher todos os meus vazios com todas as oportunidades do agora, pois o ontem já não volta e o amanhã nem sei se virá. Então, só se for agora! Não há arrependimentos, apenas vazios das ausências de coisas e pessoas que um dia encheram os pensamentos de alegrias e afagos, hiatos de tempos pretéritos empanzinados de futuro do presente do indicativo composto daquilo que poderia ter sido.
Semana passada, mais precisamente no dia 5 de novembro, eu comprei um batom e um gloss labial, ambos na cor rosa. Tirei-os das embalagens, busquei um pequeno espelho na minha bolsa tiracolo e cuidei de passar em meus lábios. Eu estava na sala com outros colegas de trabalho. Um deles estava me observando, vendo-me cumprir um ritual – amo rituais -, desta feita, a simples ação de colorir, preenchendo meus lábios com o batom e, na sequência, passando o gloss labial para dar brilho e vida a minha boca.
– Já vai usar o batom? – perguntou-me o colega que me observava.
– Tenho urgência de viver, pois nem sei se estarei viva daqui para o final do dia. E mais, vai que acontece um acidente e tenho que ser hospitalizada, pelo menos eu chego lá com os lábios cor de rosa – e continuei numa fala meio fúnebre, mas com pitadas lúdicas, com um sorriso cor de rosa estampado na cara – A vida é agora, é já, afinal sou das que pensam: Só se for agora!
Na segunda-feira, 08/11/2021, minha amiga de trabalho, aquela que me observava passando o batom que eu acabara de comprar, veio me dizer:
– Flávia, assim que eu soube da notícia da morte de Marília Mendonça, a primeira lembrança que me veio foram as palavras que você nos disse, aqui nesta mesma sala, haras antes do ocorrido com a cantora. Eu fiquei refletindo e lembrando de suas palavras, da urgência de viver a vida e do quanto não sabemos nada sobre o que nos pode acontecer.
É sobre a vida que devemos refletir, não sobre a morte que é a única certeza que temos. Sobre não se lamentar ou interditar o trânsito, é sobre não impedir que as coisas ocorram e aconteçam. É sobre se permitir, com todas as responsabilidades que a vida em coletividade nos imputa, sem ferir nem causar danos ao próximo. É sobre possibilidades, oportunidades, desafios e, acima de tudo, é muito mais sobre você, sobre o que lhe faz bem e tudo aquilo que não pode ser deixado para depois.
Bora preencher os lábios, os dias e horas que nos restam. Bora encher os vazios da vida, cada um à sua maneira, com as cores que lhes convier… Então tá! E antes que eu esqueça: Só se for agora!
Flávia Arruda – Pedagoga e escritora
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