COALHADA COM RAPADURA –

Numa das campanhas eleitorais para Governador do Estado, um conhecido deputado estadual, candidato à reeleição, após um comício numa cidade do interior, foi dormir em sua fazenda, que ficava a poucos quilômetros de distância. De manhã cedo, acordou com alguém batendo palmas no portão da sua propriedade. Era a esposa de um antigo morador e eleitor, à procura de socorro para o marido, que, desde a noite anterior, encontrava-se passando mal. Segundo ela, à noite, durante a ceia, ele havia exagerado na coalhada com rapadura, e logo foi dormir com o estômago muito cheio, sem fazer a digestão. Literalmente, o eleitor se empazinou. As cólicas eram tantas, que o homem “desfaleceu”.

Como se encontrava em plena campanha política, o deputado viu-se na obrigação de transportar o doente para Natal, no seu luxuoso carro, à procura de socorro médico. Mandou, então, que o colocassem deitado no banco de trás, muito bem forrado, com a cabeça no colo da esposa, e sentou-se no banco da frente, ao lado do motorista.

A violenta indisposição gástrica, realmente, havia derrubado o seu fiel eleitor, que agora estava passando por maus momentos. Após uma noite inteira de fermentação, a barriga do homem, cheia de gazes, parecia um zabumba.

O gesto de solidariedade do deputado, para ele, iria comover as pessoas da redondeza, e, com certeza, seria uma forma de angariar mais votos para a sua reeleição. Por isso, fez questão de acompanhar o doente a um pronto-socorro da capital do Estado.

Nessa época, as estradas eram de barro e esburacadas. Com os constantes solavancos do carro, o mal-estar do doente aumentou ainda mais durante a viagem. O pobre coitado sofria com os balanços e com os “embrulhos” no estômago. Não parava de vomitar.

Muito encabulado, mesmo trincando os dentes, não podia evitar que os salpicos dos resíduos estomacais atingissem as costas do deputado. A coisa foi ficando feia, e o deputado olhou para trás, visivelmente irritado, ao sentir sua camisa molhada de vômito. Estava bastante chateado e arrependido de estar transportando o doente na sua “Hilux”. Num dado momento, o parlamentar olhou para trás e resmungou um palavrão. O velho eleitor percebeu a sua irritação, e então, num humilde pedido de desculpa, balbuciou:

-Calma, “cumpade”…o soro sai, mas a “quaiada” fica…

O pior é que o mau cheiro de fezes se misturava com o de vômito azedo.

O paciente foi levado ao melhor Pronto Socorro de Natal, onde foi medicado, permanecendo internado até o dia seguinte.

Essa viagem deixou o deputado tão contrariado, que, para esquecê-la, trocou de carro na mesma semana, e fez uma jura de nunca mais fazer sua “Hilux” de ambulância, para eleitor nenhum.

A infecção intestinal, ou no português rasteiro, a “dor de barriga” é fator nivelador da igualdade humana, e ninguém está livre dela. Seja rico ou seja pobre, não importando a classe social, o homem sempre estará sujeito a esse tipo de constrangimento.

Mas o deputado não se lembrou disso.

Violante Pimentel  – Escritora

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