COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: COISAS DA PESTE –
CABRAS DA PESTE
Tempos bons, os tempos dos cabras da peste, cujo termo tinha o sentido de ser um cabra disposto e corajoso. O “cangaço” foi um movimento nascido em defesa do pessoal do sertão, face aos problemas sociais, por falta de defesa do Estado.
Nesses tempos, os seus componentes também ficaram conhecidos como cabras da peste, pela coragem de enfrentamento às “volantes”, que eram as patrulhas da polícia.
Depois, o termo foi se generalizando, para designar pessoas de coragem. Por exemplo, o vaqueiro que entrava no mato “encorado”, ou seja, vestido de “perneira e gibão”, roupas de couro, necessárias para enfrentar o mato fechado para pegar touro brabo, era um “cabra da peste”. Tornou-se expressão nordestina.
Hoje, se for designar com essa denominação, o apelidado vai se sentir ofendido, pois vai achar que ela é pejorativa.
AS PESTES
Nasci escutando as histórias das pestes, e ficava assustado com os números de mortes e a impotência diante dos trágicos eventos, enfim, de suas fantasmagóricas imagens, pelo fato de assustar, e o pobre vivente não ter como escapar. Como criança, me assustava, por não entender a dimensão.
Hoje já nos meus 75 anos, paro para pensar, ao ver o mundo trancado em casa, as ruas desertas, a economia parada e o caos econômico sendo instalado. Lembro das história da peste bubônica, da gripe espanhola, da febre tifoide, entre outras.
Sabe a pandemia mais antiga que se tem conhecimento? A peste bubônica. Aconteceu entre 542 e 546 e matou em torno de 30.milhões de pessoas.
Já ouviu falar na peste negra? Ela matou entre 1/3 e metade da população da Europa no século 14. Sabe de onde elas vieram? Da China.
DOS ENSINAMENTOS SEU MIGUEL CARRILHO
Da febre tifoide me recordo de um dos ensinamentos de vida do ’Velho” Miguel Carrilho. Sempre, aos sábados, íamos almoçar um cozido feito por Dona Lurdinha Carrilho e depois continuávamos a cachaça, mas eu, particularmente, não perdia um “merreis” de papo com Seu Miguel.
Um dia ele me falou: Toinho não adianta a gente se revoltar com os desígnios de Deus. Temos que saber enfrentar as diversidades, até por que somos insignificantes diante das coisas que Ele determina, e temos mesmo é que nos conformar.
Então, contou a seguinte história.
Lá em Catolé do Rocha chegou a febre tifoide e matou muita gente, sem que se pudesse fazer nada. Seu Miguel, tinha muitas irmãs, e, no início da madrugada, morreu uma delas. Segundo ele, foi um alvoroço. Muito chororô, e, como diz o matuto, muita “latomia”.
Já querendo clarear o dia, morre outra das suas irmãs. Como era natural imaginar, muitas lamentações, porém, em nível bem menor que a primeira. Dia claro, já na hora do café da manhã, morre a terceira. É aí que Seu Miguel fundamenta a sua teoria. Ele diz: Toinho, não houve mais choro, e eu concluí, que até com a morte, a gente se acostuma.
MALAQUIAS
Malaquias, que ainda vive, foi uma das primeiras pessoas que conheci em Monte das Gameleiras.
Casado com uma das herdeiras, era o responsável pela guarda e uso do terreno que eu comprei, e onde ele continuou a trabalhar.
Entre muitas de suas virtudes, era um poeta de grande sabedoria, uma vez que não sabia “fazer um O com uma quenga”.
Embora na região não tenha coqueiro, vale a expressão. Malaquias fazia versos com os diferentes tipos de abelhas, e também falava das desgraças e das doenças, curadas com as “coisas do mato”.
Me acostumei a ouvir seus louvores ao “limão comum”, aquele velho limão com sementes, que os mais novos passaram a substituir pelo “limão Tahiti”.
Falava Malaquias: Seu Antonio, nunca deixe morrer esses limoeiros, pois foi esse limão quem curou o povo de Gameleiras de uma peste que matou muita gente “no país”. Afirmava ele. Não sei se, com exagero, ou não.
Com os seus vastos conhecimentos, explicava: nessa época, a localidade pertencia ao Riacho dos negros ou Riacho do Logradouro, como chamavam e, só depois, veio a se chamar Tangará.
Sua afirmação: abaixo de Deus, somente esse limão para a saúde.
Quem tem ele, tem tudo. Outro dia cheguei no sítio e vi um dos limoeiros com uns galhos secos. Me preocupei, e perguntei ao caseiro o motivo.
Ele disse: excesso.
Como assim? Falei.
Ele disse coloquei adubo demais.
Escutando Bolsonaro, nesses dias da nova peste, me lembrei do fato.
O excesso do remédio passa a ser veneno.
UM FATO NA LEMBRANÇA
A peste da “gripe asiática” já ocorreu nos meus tempos. Estudava no Colégio Salesiano, em Recife, e um dos meus sonhos, era desfilar no dia 7 de setembro, todo fantasiado de soldado, inclusive, de quepe, parecido com um oficial da marinha.
Para minha desilusão, assim como nesses nossos dias de agora, foram suspensas as aglomerações, e, para a minha tristeza, foi cancelada a “parada de 7 de setembro”.
Além de tudo, o prejuízo da “farda de gala”, mandado confeccionar, para o desfile.
Mesmo tendo participado dessa evidência de peste, não lembro de qualquer consequência na saúde e nem na economia.
A PANDEMIA DO VIRUS DA CHINA
Passado tanto tempo, agora, estamos diante de um novo “corona vírus”. Fico imaginando. O Velho Miguel Carrilho, mesmo diante de tão grave ameaça, entendeu como natural os desígnios de Deus.
Malaquias, naquela época, de tão poucos recursos, depositou no limão comum, suas esperanças de cura. Eu, não vi nenhuma consequência, a não ser o cancelamento da “parada de 7 de setembro”, e a minha desilusão.
E agora, com todo o avanço da ciência, qual o porquê de tanta agonia? Não são mais os desígnios de Deus? Não é a cura simples, com os remédios caseiros?
Me parece que não. Somente as ambições pelo poder e das ideologias políticas, podem justificar tudo isso. São as atitudes do diabo vermelho. Essa é a PESTE de agora.
Antônio José Ferreira de Melo – Economista –[email protected]