COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: COISAS DA POLÍTICA –
A POLÍTICA E O PODER
Nos idos dos anos 60, do século passado, fiz concurso e fui nomeado para a Assessoria de Planejamento do Governo do Estado, posteriormente, Secretaria de Planejamento.
Ainda muito novo, com 19 anos, recebi muitas incumbências importantes e aprendi a ter responsabilidade, além de aprender também, até onde vão os limites da competência.
A nossa sala ficava no Palácio da Esperança, portanto, nas vizinhanças do gabinete do Governador Aluizio Alves, ao qual tínhamos acesso e éramos consultados sobre números e disponibilidades orçamentarias.
Foi quando aprendi, o que eram as responsabilidades do poder, porem somente anos depois, vim aprender o que era o poder.
COISAS DA POLÍTICA – UMA CAMPANHA
Na campanha do João, Lavô e Jajá, contra Geraldo Melo, em 1986, tendo mais ligação com José Agripino, e também como eu era proprietário da Fazenda Alvorada, no Distrito de Sítio, lá em Ceará Mirim, e tinha um bom relacionamento com o povo, a coordenação geral da campanha me convocou para coordenar os trabalhos no Município.
Sabia que a “boca era quente”, mas aceitei.
Tinha conhecimento, inclusive, de notícias sobre os “capatazes” da usina, que, vez por outra, davam “surra” em algum cristão, que não rezava pela “bíblia” deles.
Teve amigo meu, que falou: você é doido, você vai é apanhar, pra aprender a não cutucar o cão com vara curta.
Isso não aconteceu, e, com relação a essa experiência, para mim, foi um grande aprendizado, por ter conhecido como é conviver entre contrários.
Chegando para a realização do meu “trabalho”, procurei Ricardo Cavalcante, que era o coordenador da campanha de Geraldo, e falei: Ricardo estou vindo aqui com uma tarefa, que é igual a sua, e, pretendo desempenhar a função, evitando problemas, ao invés de criar.
Como os ânimos eram bastante alterados, na cidade, falei: quero criar um canal de comunicação com você, de forma que possamos combinar atividades, entre elas, as passeatas, para que tenham roteiros diferentes, e que nunca se encontrem, uma vez que a nossa responsabilidade é grande, para conduzir o povo.
Tudo acertado, a campanha, embora “quente”, seguia sem problemas, e tínhamos tanto entendimento, que todas as noites, após as atividades, as coordenações contrárias se encontravam no “Passa e Fica” para jantar carne de sol e tomar umas cervejas, rindo das ocorrências engraçadas.
Porém, certa noite, Ricardo resolveu modificar o roteiro acordado, e as passeatas se encontraram, resultando vários participantes no hospital.
Embora sem consequências mais graves, apenas hematomas e cortes diversos provocados por porretes e facas peixeiras, foi um acontecimento que me deixou preocupado.
Chegando no “Passa e Fica”, falei: Ricardo o que você fez, é imperdoável, pois poderia ter resultado em situações graves, inclusive mortes.
Não foi isso, o que combinamos.
Ricardo responde: amigo, o negócio é que, com a sua presença contemporizadora, a coisa estava ficando “um meio sem graça”.
Lhe mandei a PQP e fomos comer carne de sol e tomar cerveja, para “desmastrear”.
AS PERSEGUIÇÕES E O PODER NA POLÍTICA
Apesar de ter passado incólume pela campanha, fiquei marcado como adversário de Geraldo.
Quando as “forças de ocupação” chegaram ao IDEC, eram comandadas por um sujeito, possuidor de todas as ferramentas, de um verdadeiro imbecil.
Não me lembro o nome dele, mas era um “garachué” de Bira Rocha, que me classificou como “não confiável”, e, como não permitia que me dessem qualquer trabalho pra fazer, fiquei “encostado”.
Coisa ruim, para quem estava acostumado a trabalhar.
Falei com Adilson Dantas, que era um dos diretores, e ele me disse: amigo, vá cuidar da sua vida, e esquece esse negócio de Governo do Estado, pois as coisas aqui, mudaram.
Veja bem, eu, Ex – Presidente do IDEC, e o funcionário mais antigo do Planejamento Estadual.
Mesmo Bira Rocha, o Secretário de Planejamento, sendo meu amigo – estudamos juntos em Recife, e, praticamente, moramos juntos – como diziam que ele devia favores a esse cara, eu vi que não tinha futuro conversar com ele, Bira.
Então, o meu amigo Ademarzinho de Medeiros Neto, me deu “asilo” na Secretaria de Administração, pra que eu escapasse da perseguição, que, obviamente, nem o Governador e nem o Secretário tinham conhecimento.
Sem função, sem ocupação, porém, sem perseguição, e com outra vantagem, ganhando, sem fazer nada.
Foi no governo Geraldo Melo, que eu conheci a importância e os prazeres do poder.
Veja como são as coisas: Antonio José Ferreira de Melo, eu. Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo, o Governador.
Em comum: o tamanho, e o sobrenome, quase igual.
Por onde eu andava, quando me identificava, a associação era inevitável, sendo tratado como irmão do Governador.
Nunca tive melhor atendimento e proteção.
Para que você tenha uma ideia, eu não tenho o “Câmara” no sobrenome, mas o meu cartão do Banco do Brasil tinha impresso: Antônio José C. Ferreira de Melo.
Não guardei o cartão, mas meu amigo Carlinhos Dantas, que era o gerente da agência do shopping, é testemunha.
Coisas do poder político.
Selecionei dois “causos”, dessa época.
O EMPRÉSTIMO DE CUSTEIO NO BANCO DO BRASIL
Como estava “liso”, imaginei fazer um custeio agrícola.
Era na agência de João Câmara, do Banco do Brasil, que abrangia a área onde estava situada a minha fazenda, localizada no município de Jandaíra.
Passei o fim de semana matutando e na segunda feira, me mandei pra lá.
Chegando na agência, tive logo uma desilusão.
Uns agricultores, escorados no balcão, conversando, reclamavam da demora na liberação do dinheiro, pois tinham feito propostas de custeio, há 3 meses, e, até agora, nada tinha sido liberado.
Ora, a minha necessidade era urgente, e fiquei logo desanimado.
Porém, eis que, o Chefe da Carteira Agrícola, ao me ver, diz: Dotor Antonio, entre pra cá.
Surpreso, levantei a tampa do balcão e entrei.
Perguntado sobre o que eu queria, falei das minhas pretensões.
Então, ele, mais do que imediatamente, chama um funcionário e manda “bater” a minha proposta.
Era no tempo das máquinas de datilografia, com papel carbono e tudo.
O cara colocou umas seis folhas do formulário, e começou o preenchimento.
Pelo atendimento do chefe, senti que a atenção estava sendo diferenciada, mas fiquei “na minha”.
Lá pras tantas, ele não se aguentou, e perguntou: e o “mano Geraldo”?
Aí, eu tive a certeza, de onde vinha tanta atenção, mas, me fazendo de “doido”, respondi: vai bem.
E fiquei calado, pra não “dar bandeira”.
Depois de um tempo, ele volta ao assunto Geraldo, e pergunta como estava a negociação do Governo com os professores.
Nessa época, estava havendo um problema com os professores, que eu nem me lembro o que era.
Querendo me livrar do “imprensado” mas sem ver a hora de terminar a história da proposta, falei: mestre diga aí um negócio complicado, esses assuntos de governo. São coisas que eu não entendo.
Então, ficou aquele silencio.
Pra meu alívio, o funcionário concluiu a proposta e eu, já me levantando, pra não receber mais nenhum “assédio”, perguntei se o dinheiro seria liberado “depois de amanhã”.
Então, ele falou: Doutor Antonio, dois dias não dá, pois tem que fazer o processamento, mas, sexta feira pode “passar cheque”.
De saída, chegando ao balcão, olhei para os coitados dos meus companheiros, que ainda estavam lá, sem serem atendidos, e pensei comigo mesmo: como é ruim não ter parente político e importante.
Na sexta feira, acabaram-se os problemas.
Conferi, o dinheiro tava na conta, e “tome” cheque.
São as coisas da vida e da política.
DETIDO PELA POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL
Tendo colocado o carro na oficina, peguei uma camionete da Construtora Meira & Meira, onde estava trabalhando – já que tinha tempo disponível – para me deslocar até minha casa.
A camionete, que estava “encostada”, era amassada, tinha um farol queimado, e as lanternas traseiras não existiam. Enfim, tinha uma situação “pecuária”, como dizem os matutos.
Resultado: fui detido em uma “blitz”.
Pelo retrovisor, vi o chefe da patrulha vindo em minha direção com um documento na mão. Era a minha carteira, que tinha sido entregue ao patrulheiro.
Chegando junto do carro, antes de qualquer observação, ele perguntou: como vai Geraldo? E eu respondi: vai lá com os problemas dele.
Continuando o “papo”, ele diz: também sou lá da região de Campo Grande – onde moraram os pais de Geraldo, na Fazenda Horizonte.
Dando sequência ao quase que monólogo, ele pergunta: o SENHOR também é de lá? E eu já sentindo mais segurança pelo tratamento de SENHOR, respondi: não, já nasci aqui por Natal.
Para finalizar, ele recomenda que eu faça os “pequenos” reparos na camionete e se despede mandando um grande abraço para o “mano Geraldo”.
POR FALTA DE UM GRITO, SE PERDE UMA BOIADA
Como o tempo é o senhor da razão, como o tempo é o senhor de tudo, dos encontro, e também dos desencontros, algum tempo depois, não lembro agora, qual o ano, sou convocado por meu amigo, Haroldo Azevedo, para tentar ajudar, no dia da votação, para a eleição de prefeito de Ceará Mirim, que tinha Edinólia, mulher de Geraldo Melo, como candidata.
Nessa época, já proprietário rural, no Município de Pureza – onde tinha o meu domicílio eleitoral – para atender a convocação de Haroldo, votei logo cedo e me mandei para Ceará Mirim.
Chegando no Município, fui “assuntar” a situação e me surpreendi com a grande quantidade de pessoas com camisas azuis, que, pelo que me lembro, era a cor do opositor de Edinólia.
Parei numa lanchonete onde tinha a presença de muitos “azuis”, pedi um sanduiche e um suco, e comecei a conversar com o pessoal, dizendo ser “de fora” e estar impressionado com tantas pessoas vestidas com aquela cor.
Recebi de uma das componentes da equipe a seguinte declaração: olhe essa camisa é porque estou recebendo dinheiro para trabalhar para o candidato, mas vou votar mesmo é em Edinólia.
Essa mesma afirmação me foi feita, por vários componentes da equipe, e outros que interpelei pela cidade.
Dirigi-me então para a “casa grande” da usina.
Em lá chegando, encontrei Geraldo, Edinólia, Haroldo, Diniz e Marluzia Saldanha, sentados no terraço e batendo papo, como se fosse um dia de fim de semana qualquer, esperando que o churrasco começasse a ser servido.
Na verdade, o que eu senti, foi um clima de velório, como se a campanha estivesse perdida, e não tivesse mais o que fazer.
Não querendo fazer parte daquele quadro, e, como tinha em mente o pedido de Haroldo, saí e fui visitar os locais de votação, nos Distritos, para fazer um balanço da situação.
Era evidente a falta de estrutura da candidata Edinólia, porém, era também evidente a tendência do povo, para votar nela.
Um caso interessante, foi quando encontrei na comunidade de Boa Vista, o meu amigo Xuxa Eloi, que “trabalhava” para o outro candidato, e ele me disse: Antonio, estou comprando voto, por picolé.
Era um sinal forte, de que estava faltando à Edinólia, além de dinheiro, organização e trabalho.
Liguei para Haroldo e falei, quase que irritado: amigo, diga a esse povo que tire o “rabo” da cadeira e vá trabalhar, que a campanha não está perdida.
Foi o que eles fizeram.
Só sei de uma coisa. Edinólia ganhou a eleição.
UMA CAMPANHA POLÍTICA EM PUREZA
Vavá, à época, Prefeito de João Câmara, lança a candidatura do filho para Prefeito de Pureza e, por achar que eu possuía um bom trânsito em todas as áreas do Município, me chama para fazer parte da coordenação da campanha.
A candidatura de Alison, um dos filhos de Vavá, era contra Neto Moura, que já tinha sido Prefeito, e embora tivesse realizado uma péssima administração, o povo gostava dele, pois era um político das antigas e “ganhava” o povo, distribuindo peixe ao invés de ensinar a pescar, como se diz no popular.
Embora eu tenha chegado, já do meio para frente da campanha, procurei organizar as tarefas e, então, partimos para tentar reverter a situação.
Os redutos eleitorais, onde existiam maiores concentrações de eleitores, já tinham sido “negociados”, e, sempre que chegávamos a uma liderança, esbarrávamos no fato de que ela já havia se comprometido com Neto Moura, e falava que já “tinha dado a palavra” e não podia voltar atrás.
Embora a campanha tenha tomado outro rumo, e criado uma forte adesão popular, em especial dos mais jovens, que atendiam aos apelos de Alison, também de pouca idade, eu ouvia dos “cobra criada”, que tudo voltaria ao que era, no dia da eleição.
Não deu outra. Os cabos eleitorais, utilizando a sua relação com os mais velhos da família, ameaçando nunca mais “ajudar” com telhas, tijolos e até a feira, conseguiram reverter a tendência, com o “convencimento” dos jovens, para a realidade deles.
Desse convencimento, fazia parte a marcação cerrada junto às filas para a votação, quando lembravam, a cada um, o que os seus familiares poderiam perder, para sempre.
Neto Moura ganhou a eleição.
Antônio José Ferreira de Melo – Economista – [email protected]