COISAS QUE EU VI, OUVI OU VIVI: COISAS DO RECIFE DOS ANOS 50 e 60, A TURMA DE NATAL –

As décadas de 50 e 60 fizeram parte de uma época em que muitos jovens norte-rio-grandenses, cujos pais tinham condições financeiras, iam estudar em Recife, uma vez que os cursos de nível superior no Rio Grande do Norte eram ainda incipientes.

Normalmente, em grupos, alugavam apartamentos ou se hospedavam em pensões, que eram casas de particulares, que também forneciam as refeições.

Dessa época, muito tem para ser contado.

Numa dessas pensões moravam, Francisco Araújo (Chico Bola Preta) e Sergio Lamartine. Sergio era conhecido pelas suas atitudes corretas, seu comportamento retilíneo e respeitador. Trocando em miúdos: uma pessoa séria. Chico, ao contrário, um gaiato irrecuperável, sempre disposto a uma presepada.

Sergio, por ser metódico, remanchava nas suas atividades do banho, barbear, etc., que precediam às refeições. Aproveitando a ausência, Chico escolhia os maiores bifes e deixava para Sergio apenas os pequenos pedaços da “mistura”.

Como consequência, Sergio não andava satisfeito com a quantidade da comida oferecida e reclamava da situação.

Diante da insatisfação, Chico falou: Baixinho, chegue mais cedo e esconda um bife por baixo do feijão e do arroz. Assim, você come o suficiente para satisfazer a sua vontade. Eu faço desse jeito.

E assim foi feito. Só que agora, como a carne faltou para mais gente a insatisfação foi generalizada e todos combinaram levar a reclamação à dona da pensão.

Reunidos, e ainda contando com a presença do Galego Saldanha, outro presepeiro, resolveram, na hora do almoço, encaminhar o problema para conseguir a solução.

Tudo combinado, encarregaram Sergio, que era o mais formal, para tratar o assunto e quando o porta voz escolhido começou a falar e a Dona da pensão tentava justificar e contestar, Chico Bola Preta diz: “também Sergio, você coloca 3 bifes no seu prato, e logo os maiores, então, só pode faltar para os outros”.

Dizendo isto, espetou com o garfo, o bife que ele mesmo tinha sugerido ser escondido no prato de Sergio.

Foi aquele rebu, uma vez que Sergio é muito afobado e, obviamente, não imaginava a esparrela que tinha sido preparada para ele.

Essa, eu também OUVI do Galego Saldanha.

Passeando no centro do Recife, vão Sergio e Chico. Calçada estreita, na frente dos dois uma galega. Chico passa a mão no pescoço da mulher e adianta o passo. Quando ela olha pra trás só estava Sergio, que leva um “esporro”, como se diz na gíria, e, gaguejando, não consegue convencer a mulher que não tinha sido ele.

Imagine a situação!!!

Ainda bem, que na época, esse tal crime de assédio que a mídia televisiva, exageradamente, procura tornar amaldiçoado, não tinha importância.

Nos finais de semana, a turma de Natal, quando tinha folga de tempo e de dinheiro, ia ao “centro”, tomar Chopp, ver um filme ou mesmo se encontrar para bater papo no “quem me quer”.

O Cinema São Luiz era o ponto central, pois além dos filmes que oferecia, à sua frente ficava toda a área da beira do rio e ainda mais era vizinho do “Bar Big Lanche”, famoso pelo seu Chopp gelado e sua radiola de ficha.

De tão assíduo frequentador, o garçom já sabia minha música preferida: “Georgia is my Mind”, cuja ficha era H1.

Certa vez, no meio da semana, eu e Paulinho, Paulo Cesar Cavalcanti Melo, fomos assistir um filme. Como eram sessões contínuas, e nós não sabíamos, para não entrar no meio do filme, resolvemos fazer um lanche, para aguardar o início da próxima sessão.

Discutindo algum assunto “importante”, nos encaminhamos ao Big Lanche e sentamos sem chamar o garçom.  Ao nos ver, mesmo sem ser solicitado, Luiz trouxe dois Chopp e um prato com ovos cozidos, que eram as preferências, foi na radiola e colocou H1.

É desnecessário dizer que voltamos para casa já de noite, melados e sem assistir ao filme que pretendíamos.

O “quem me quer”, palco de muitas histórias da turma de Natal, era o calçadão, à beira do Rio Capiberibe. Ali, algumas figuras femininas passeavam como que se oferecendo, daí o nome como era chamado no Recife daquela época.

Dentre outros casos ali passados, escolho esse, que OUVI do meu irmão João Ferreira.

Mestre Guga, como todos o conhecem, é o meu amigo Augusto Coelho Leal, que fazia parte da turma de Natal.

Certa feita, ele estava batendo papo no “quem me quer”. No ardor do seu relato e com o entusiasmo que lhe é peculiar, colocando um pé em cima da mureta e se esquecendo que estava com uma tremenda diarreia, ao dar uma gargalhada solta um rojão.

O resultado já viu, nosso amigo Guga bateu em retirada para casa, todo cagado.

Era assim que a turma convivia com a velha máxima: “NÓS SOFRE MAS NÓS GOZA”.

Antonio José Ferreira de Melo – economista – [email protected]

 

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *