O ser humano tem a tendência natural de ampliar em demasia seus problemas, suas preocupações. Apesar de sermos dotados de uma capacidade extraordinária de criar soluções, temos o hábito de enxergar nossos conflitos numa dimensão muito superior à dimensão real em que devem ser focalizados. Exemplo? A mulher diante de uma barata. Se um extraterrestre chegasse numa casa qualquer e visse primeiramente a mulher, seu porte, sua graça, sua valentia (muitas dão ordem até nos maridos) e depois tivesse contato com uma barata (sim, aquele bicho fedorento, desprezível, horroroso), em quem apostaria? Na mulher, não é verdade? E o que vemos, seja em Natal, Patu, Nova Iorque ou Honolulu? Mulheres intelectualmente bem dotadas, mulheres empresárias, mulheres atletas, médicas, professoras, aboletadas em cadeiras, com medo de uma diminuta barata. Há exceções, é claro…
Diante dos conflitos que a vida nos oferece tendemos naturalmente a criar tigres de papel. Fatos, episódios, pessoas, tudo nós superestimamos em detrimento da real dimensão que de fato esses elementos devem ter. Basta você assistir a uma partida de futebol da seleção brasileira. Galvão Bueno vai logo comentando “esse camisa 10 da Inglaterra é muito perigoso”. Termina o jogo, o Brasil vence e fica demonstrado que o que parecia ser não era. É claro que, de vez em quando, ocorre uma zebra. Mas a realidade é que os tigres de papel estão sempre à nossa frente. O vestibular, o teste para o emprego, a concorrência da vida em geral, os conflitos… Nossos adversários assumem proporções enormes diante de nós, enquanto a nossa capacidade de luta, de encontrar soluções permanece muitas vezes embutida num lugarzinho escondido do nosso cérebro.
Na vida o combate é uma constante. O nascer é um ato de combate entre a perspectiva de vida e a realidade da morte. Sair do aconchego do ventre materno para o enfrentamento da pedreira da vida configura-se um desafio e tanto. Enfim, para onde você se volta, a necessidade do combater estará sempre adiante, logo ali. O aprender, o se relacionar, o se mover, tudo se constitui em uma operação constante a ser desafiada e vencida – diariamente. Mas, além dessas dificuldades naturais, queremos aqui ressaltar mais, nos fixar mais na figura do tigre de papel. Aquela dificuldade, aquele adversário que nós fazemos bem maior do que realmente são. Hoje em dia, com as vaidades e os egos atingindo proporções avantajadas, com o individualismo e o egoísmo se fazendo a cada dia mais forte na vida das pessoas, os tigres de papel pululam em todo lugar.
São pessoas que, movidas por sentimentos e instintos altamente centrados em si mesmo, levam a vida sem considerar o espaço e os direitos do próximo. Pensam que são espertas, inteligentes, sabidas, competentes. Na verdade, são pobres tigres de papel, desprovidas do conteúdo interior que transforma fracos em fortes, pequenos em grandes, derrotados em vencedores. Hitler, por exemplo, é um digno representante desse rebanho. Enquanto teve um forte exército à sua disposição vociferava feito leão para seus inimigos. Desprovido da espada, quedou-se feito gelo ao sol, entregando-se à morte através de um ato covarde de suicídio. Pilatos diante de Jesus, tendo o poderio romano à mão, bradou ao Mestre “fala que eu posso te salvar”. Dos dois, sabe-se que Jesus ressuscitou, enquanto Pilatos não suportou atrelar aos seus dias o peso da morte de um justo. Suicidou-se tempos depois.
Está na hora de você começar a identificar e combater com destemor os tigres de papel que a vida coloca à sua frente. Na África, conta-se que a gazela está na mata fechada onde o leão não pode lhe devorar. Aí o leão ruge, a gazela se assusta e, inocentemente, vai para o descampado – onde é caçada facilmente pelo leão. Tem muita gente agindo como a gazela, se assustando a toa, perdendo a capacidade de raciocinar, de analisar as condições reais da luta, a força do adversário, a dimensão da dificuldade e desistindo de lutar. Ou lutando sem a convicção necessária para a conquista da vitória. Lembro-me agora de Davi diante de Golias. Preferiu escolher sua própria arma, ao invés de ir na conversa do gigante. Uma simples pedra entre os olhos pôs fim à vida de um tigre que rugia como tigre, mas que na verdade era recoberto de papel. Aliás, você já sabe onde encontrar a sua pedrinha?
Públio José – jornalista
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