CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCEITO DE LIBERDADE –
Numa perspectiva jurídica, a prevalência maior ou menor da liberdade antiga na gênese da norma jurídica é o que permite como aponta Kelsen, diferenciar uma democracia de uma autocracia. A prevalência da liberdade antiga também entreabre o tema da legitimidade das normas numa dimensão existencial. Esta se traduz na possibilidade da liberdade de expressão do indivíduo, que toma sobre si a responsabilidade pública do seu próprio destino e que reconhece, ao mesmo tempo, a situação-limite que provém da condição humana no seu inter-relacionamento plural com os outros. Este reconhecimento se traduz num NÃO a toda tentativa de subordinação do indivíduo e num SIM a todo esforço de colaboração e de diálogo, na auto revelação intersubjetiva do ser nas deliberações da comunidade política.
A liberdade antiga é a liberdade do cidadão e não a do homem enquanto homem. Ela só se manifesta, por isso mesmo, em comunidades políticas que regularam adequadamente a interação da pluralidade. Daí a relação entre política, liberdade antiga e formas democráticas de governo, que criam um espaço público ensejador pela liberdade de participação na coisa pública, do diálogo no plural, que permite a palavra viva e a ação vivida, numa unidade criativa e criadora.
Esta presença avassaladora do Estado e da sociedade na vida dos indivíduos é o que permite compreender a importância de uma outra dimensão da liberdade, chamada de liberdade moderna. Já os romanos, que diferenciavam juridicamente o estatus civitatis do estatus libertatis, definiam a liberdade como “…a faculdade natural de se fazer o que se quer com exceção daquilo que se proíbe ou pela força ou pela lei…”, conforme o Digesto. Liberdade, neste sentido, não é o obrigatório, nem mesmo do autonomamente consentido, mas sim o que se encontra na esfera do não impedimento.
A liberdade como não impedimento é uma liberdade negativa e privada no sentido que responde às perguntas: “Quanto sou governador? ”, “Qual o grau de interferência dos outros e do Estado na minha vida? ”.
Num Estado, isto é, numa sociedade onde existem leis, liberdade não é fazer o que se bem entende, na subjetividade, por assim dizer, irrestrita do estado de natureza. Numa sociedade politicamente organizada, a liberdade adquire como ensina Montesquieu, uma objetividade e pode ser definido como no “O Espírito das Leis”: “Le droit de faire tout ce que les lois permettent”. Nesta acepção, o conceito de liberdade coincide com o do lícito, vale dizer, está na esfera, como diz Norberto Bobbio, daquilo que, não sendo nem comandado nem proibido, é permitido.
Josoniel Fonsêca – Advogado, professor, membro da Academia de Letras Jurídicas do Rio Grande do Norte, ALEJURN
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