CRÉDITO EDUCATIVO PRECISA VOLTAR ÀS ORIGENS –

Permita o leitor algumas recordações sobre fato histórico, inserido nos Anais do Congresso Nacional.

Quando exercia mandato de deputado federal apresentei, pioneiramente, o projeto de lei número 274/75, em 15 de abril de 1975.

Essa proposta originou no Brasil o programa de “crédito educativo” (CREDUC), sistema de financiamento de estudos superiores, que beneficiava os estudantes universitários de Universidades, públicas e privadas, através de valor mensal (em média dois salários mínimos), que atendia, além de mensalidades, os custos do lazer, alimentação, vestuário, transporte, habitação e demais necessidades pessoais.

O aluno só começava a pagar o valor financiado, após dois anos de conclusão do curso, com prazo de quitação de até o dobro do tempo da graduação, de acordo com a renda e o emprego conquistado.

Era ministro da educação na época, o senador Nei Braga, do Paraná, que me chamou em seu gabinete e disse:

Xará, a sua ideia nesse seu projeto 274/75 é excelente e eu vou encampá-la. Vamos implantar imediatamente, através da criação de uma linha de crédito da CEF, que é mais rápido do que aprovar uma lei específica, que demora muito” E perguntou-me: “concorda com essa fórmula?”.

Concordei e assim nasceu o crédito educativo, a maior conquista da minha atividade parlamentar.

Em agosto de 1975, o CREDUC já concedia empréstimos para o custeio de despesas, durante a graduação. O jornalista Murilo Melo Filho, que escrevia coluna nacional na revista “Manchete”, classificou a iniciativa como pioneira no país.

Posteriormente consumou-se o crime contra os estudantes universitários, quando o governo “apelidou” o crédito educativo de FIES (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior). A partir daí a ideia original do PL 274/75 transformou-se em porta aberta para “negociatas”.

O programa foi colocado a serviço das instituições privadas de ensino superior, com o financiamento usado exclusivamente no pagamento das mensalidades das Universidades e/ou Faculdades “privadas”. Os estudantes de Universidades públicas foram excluídos. Protestei veemente à época. Nada adiantou.

O crédito educativo transformou-se numa operação bancária qualquer.

As Universidades particulares, beneficiárias desse “paraíso”, passaram a explorar um dos “melhores negócios” do país, com os privilégios de liberarem os créditos oficiais (dinheiro vivo) e até fazerem a seleção dos beneficiários.

O descontrole fez com que algumas dessas universidades transferissem para o FIES alunos que já pagavam mensalidades e assim reduzissem a zero os seus riscos financeiros.  Só em 2014, o Tesouro liberou RS$ 14 bilhões para o FIES, meio Bolsa Família.

Como justificar que empresa privada manuseie dinheiro da nação para emprestar e facilitar o recebimento das suas próprias mensalidades, na “boca do caixa”?

A Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) constatou que o FIES estava sendo utilizado por faculdades e universidades particulares para transferir aos cofres públicos o risco de inadimplência de seus alunos.

E mais: auditoria do TCU classificou como “descalabro” a gestão do FIES. Constatou que nos governos Lula e Dilma, apenas com os contratos firmados até 2015, existia um passivo de 55 bilhões com as universidades privadas, que deve ser pago pelo Tesouro Nacional, até 2020 (???).

Além disso, a auditoria comprovou aumentos despropositais das mensalidades cobradas.

A liberalidade foi de tal ordem, que entre 2009 e 2015, vários fundos internacionais investiram no setor educacional privado brasileiro, com ações cotadas em bolsa e lucratividade altíssima. Tudo isso aconteceu, durante governos do PT.

Agora, ao invés de resgatar a ideia original do crédito educativo (PL 274/75), o governo Temer dá continuidade à “farra”. Anuncia linha de crédito no BNDES (cerca de R$ 2 bilhões) para financiamento aos alunos de faculdades privadas, com juros elevados e redução dos prazos de carência e quitação.

Diante das comprovadas denuncias de uso dinheiro público em negociatas, o governo teria que agir com maior sensibilidade social.

Afinal, o crédito educativo é um direito da cidadania.

O ideal seria voltar às origens dessa proposta, com o mesmo formato originário do projeto de lei n° 274/95, que fui autor no Congresso Nacional, em 1975.

Tudo para que o estudante carente não continue a “ver navios”, como se encontra atualmente…

Fica o meu apelo!

 

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal – [email protected]  www.blogdoneylopes.com.br
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *