CRINGE –
O que danado é cringe e por que só se fala nisso nas redes sociais? Procurei entender no que consistia a expressão e cheguei à raiz do problema. Não passa de mais um devaneio das novas gerações inconformadas com o status quo – será que tais jovens entendem o significado de tal termo latino -, desejosos de marcar as suas presenças no espaço social que habitam.
Até imaginei, mas constatei não se tratar de descaso para com os acima dos cinquenta anos, haja vista tais indivíduos estarem inseridos na condição de pré-históricos e já desmerecedores de quaisquer críticas. Pois bem, trata-se de disputa entre a Geração Z – nascidos a partir de 1990 -, contra os Millennials – oriundos dos anos 1980 e 1990.
Ser um cringe, aqui no Brasil, serve para designar alguém brega, ultrapassado e fora de moda. Atitudes como gostar da Disney, de Harry Potter, de café e de repartir o cabelo ao meio, são práticas cringe – no inglês, cringe significa algo como atitude vergonhosa.
Não antevejo nenhum alarmismo nessa prática. Entendo como uma bobeira, mas se puxarmos pela memória descobriremos que também criamos nossas próprias expressões em tempos pretéritos, propiciando a puristas da linguagem as mesmas reclamações de agora. Ou seja, trata-se do ciclo natural dos conceitos da juventude em permanente ebulição.
É puxar pela lembrança e desencavar os nossos modismos de décadas atrás. Externávamos surpresa dizendo: Carambolas! Papagaio! Mostrava-se desagrado afirmando: É de arder! Acho pau! É de morte! Ora que pinóia! Será o Benedito! Se algo ou alguma mulher nos era agradável aos olhos, manifestávamos a satisfação exclamando: Um brinco! Uma tetéia! Bonita como uma estampa! Um biju! Bacana!
Ao sentir receio de algo expressávamos com um Estou frito! Também se afirmava: Fizeram minha caveira! Para se combinar um negócio recorria-se a ditos como: No duro! ou De fio a pavio! Mulher rica era Cheia da gaita. Ir ou vir depressa cobrava-se com um Chispando! Caracterizava-se uma mentira afirmando: É potoca!
O gabola era um Garganta Pura. Pessoa franzina não passava de um Espirro de Gente. Recém-casado era um Casadinho de fresco. Ser rigoroso era Entrar de Sola. Pedia-se calma dizendo: Sossega o periquito! Externava-se alguma contrariedade falando: Comigo não, violão!
Diante da possibilidade de um namoro era comum falar: Ela te dá bola! Faz fé com tua cara! Para acusar alguém de esnobismo ou de afetação, comentava-se: Não me venhas com chiquê, com nove horas! Para definir uma pessoa sonsa ou de dupla personalidade, afirmava-se: Mas que mascarado você é!
No fundo, as gírias de hoje traduzem o mesmo significado de outrora, com a diferença de estarem maquiadas com um vocabulário pesado, sem originalidade e, em muitas situações, chulo. Soltando a imaginação, até que seria pitoresco um trabalho cotejando expressões idiomáticas extraídas do cotidiano do nosso povo, relacionadas a diferentes épocas de nossa história.
Algum saudosista ao ler tal trabalho, certamente, deixaria escapar a seguinte manifestação: É um número! Digno de Almanaque! Portanto, nada de estranhar com os modismos linguísticos da atualidade. É só esperarmos um pouco e logo, bem mais depressa que possamos imaginar será cringe falar cringe.
José Narcelio Marques Sousa é engenheiro civil