CRISE POLÍTICA BRASILEIRA VEM DE LONGE –

O presidente Bolsonaro condenou a forma “espetaculosa” da prisão de Fabrício Queiroz, assessor do seu filho. Mostrou-se irresignado, diante das últimas decisões judiciais e ameaça reação.

Tudo que acontece hoje no Brasil são efeitos de crises políticas, cujas causas vêm de longe. Análise dos últimos sete anos confirma essa realidade.

Senão vejamos.

Em 2013, de celular na mão, o povo ocupou as ruas, em processo de catarse coletiva (purgação), no “Movimento Passe Livre”, um grito de insatisfação com a representação política.

No ano seguinte (2014) é deflagrada a “Operação Lava Jato”, contra a corrupção. Alastrou-se no país o “Eu sou Moro”. Anos depois, o candidato Bolsonaro usou a expressão como “carro chefe” de sua campanha.

Em 2015, o palco do antipetismo instalou-se na avenida Paulista e clamou o impeachment de Dilma Rousseff.

Em 2016, Dilma é afastada, a Lava Jato avança e começa o clamor popular da anti-política, simbolizado no pedido de “faxina geral”.

Em 2017, o “#Fora Temer” aprofundou a divisão do país e acelerou o perigosíssimo sentimento de negação da classe política, elemento fundamental para o exercício da democracia.

Em 2018, surge a candidatura de Jair Bolsonaro, com discurso de extrema direita e oposição ao establishment político.

Vitorioso, assumiu a Presidência em 2019 e não teve gesto de pacificação política. Ao contrário, estimulou antagonismos entre o seu governo, o Congresso Nacional e o judiciário, mesmo após a decretação da trágica pandemia.

Com a nação mergulhada em permanentes conflitos, a instabilidade atinge o estado de direito, que nada mais é do que o fenômeno político, originário da necessidade de disciplinar o poder, através da lei, com respeito ao princípio da separação dos poderes.

A “faxina geral”, pregada em 2016 e incorporada à bandeira eleitoral do Presidente Bolsonaro, deu causa a “judicialização”, entendida como as questões nacionais de repercussão política e social, passando a serem decididas pelo Judiciário e não as instancias políticas competentes.

Em consequência surgiram “interrogações”, envolvendo direitos, garantias individuais, inclusive os limites dos espaços discricionários, sobretudo do Ministério Público, cujo exemplo foi o caso de Luiz Carlos Cancellier, reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, acusado de obstruir investigações, sendo preso pela Lava Jato, submetido à revista íntima, ficando em cela de segurança máxima, tudo acompanhado de grande repercussão midiática.

A acusação era desvio de R$ 80 milhões. Dias depois, ele se suicidou. Encerrado o inquérito constatou-se que não existiam provas para incriminá-lo.

A propósito, cabe observação acerca da “delação premiada”, que é inegavelmente instrumento jurídico facilitador no combate a corrupção, “desde que” não seja banalizada e obedecida a cautela de somente tornarem-se públicas as acusações, após o início do devido processo legal, para evitar condenações antecipadas na mídia.

Outra interrogação é a aplicação do princípio do “domínio do fato”, que consiste em condenar criminalmente, não apenas aquele que pratique o ato ilegal, mas também quem supostamente esteja “por trás”, mesmo inexistindo provas materiais.

O criador dessa teoria é o jurista alemão Claus Roxin, que em 2014 esteve em São Paulo e disse ter havido falsa interpretação da tese, pois a sua intenção era unir nos crimes do “nacional/socialismo” da II Guerra, os executores e os membros do Alto Comando de Hitler, que emitiram as ordens sumárias de extermínio contra judeus.

Em tais casos, a prova já era evidente e notória. Nos demais, a prova é indispensável.

Indagado sobre a “pressão popular” no julgamento de delitos do tipo “Lava Jato”, declarou o professor alemão: “O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública”.

O presidente Bolsonaro, atualmente inconformado com os excessos judiciais, que declara ser vítima, caso tivesse ouvido o jurista Claus Roxin, não teria mandado “recado” recente ao STF, de que “não são as instituições que dizem ao povo o que ele deve fazer, mas o povo que diz às instituições o que elas devem fazer”.

Até o Código de Hamurabi, a legislação mais antiga que se tem conhecimento, colocou a lei interpretada pelos tribunais, como fonte de autolimitação dos poderes.

Com tanta turbulência e desencontros políticos, a maior aspiração dos brasileiros é a chegada da Paz, o mais breve possível.

 

 

 

Ney Lopes –jornalista, ex-deputado federal e advogado –  [email protected]

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

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