CULPADO ? –
De acordo com o ordenamento jurídico, em quase todos os países do mundo, considerar-se-á um sujeito inocente até que se prove o contrário, mas, infelizmente, nós costumamos condenar antes de averiguar. Como se culpar o próximo, assim como comer ou escovar os dentes, fizesse parte das nossas atribuições diárias. Como se ouvir todas as versões dos incidentes fosse uma atitude além do necessário em termos de justiça e sociedade.
Depositamos uma confiança exacerbada no nosso “olhômetro”, no instinto ou no “sexto sentido”. Confiança esta que deveríamos depositar na inocência e boa-fé do próximo. E, como se desconfiar sem motivos e baseado em critérios vis como aparência física ou situação financeira fosse pouco, nós costumamos condenar sem direito a julgamento, sem ouvir nenhuma das partes envolvidas, sem testemunhas. Nós, simplesmente, olhamos e culpamos.
Esquecer que somos feitos do mesmo material, que temos as mesmas chances de ser boas pessoas, que dividimos entre nós idênticas modalidades de qualidades e defeitos é o que nos torna tão contundentes, é o que nos deixa tão corretos e tão “donos da razão”. Desde que a regra de amar ao próximo mudou para condenar o próximo, nós, muito convenientemente, esquecemos de que somos os próximos de alguém que não nós mesmos. Esquecemos que a terra é redonda, que o mundo dá muitas voltas e tantas outras lições criadas para melhor ilustrar e nos lembrar da fragilidade das nossas posições e da inevitável “lei do retorno”.
Não há como fugir do que se semeou e, se a semente foi de parcialidade, impaciência, má vontade e desamor serão exatamente esses frutos que iremos colher. Não há como se esconder ou tentar enganar, a lei da vida nunca falha e não esquece de cobrar um preço proporcional por cada uma de nossas ações.
Enquanto o amor for a exceção, e não a regra, enquanto a mentira for dita com ares de verdade, enquanto passarmos pela vida como um furacão, destruindo o que houver pela frente, nada de bom nos acontecerá. Enquanto a máxima: “não julgais para não seres julgados” estiver esquecida, cometeremos sempre os mesmos erros, um círculo vicioso de julgamentos e condenações. Enquanto não deixarmos que cada um torne-se aquilo que gostaria, enquanto não dermos oportunidades de melhora e não mantivermos o benefício da dúvida, ficaremos acorrentados aos nossos próprios desmerecimentos e corremos o risco de encarcerar conosco alguém que pode ser inocente.
Ana Luíza Rabelo Spencer, advogada (rabelospencer@ymail.com)
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