Da colonização aos dias atuais (II)

Adauto José de Carvalho Filho

E a história continua: Proclamação da República, que ninguém sabia o que era; as guerras internas, todas com objetivos de roubar da corte ou de se proteger dos roubos da corte; a inconfidência mineira, que atingia a quem negociava com ouro e malograram um alferes qualquer como mártir, os golpes de Estados populistas, uma coluna que de “preste” não tinha nada; o golpe de 1964 e a maior de todas as vergonhas nacionais: a redemocratização do país por figuras carimbadas e que se acossaram do poder e, até hoje, o utiliza nos estritos interesses pessoais e corporativos e que se faz o presente da nossa pátria mãe gentil.

O tempo passou e, depois de sucessivos desastres políticos e após 30 anos de ditadura militar, chegamos a nefasta nova república e com ela convivemos com o mais medíocre de todos os sistemas políticos vividos pela nação e berço das mais variadas e especializadas quadrilhas formada por homens públicos, que se dizem senhores de biografias honradas, mas que demonstram que nada mais são do que batedores de carteiras, com todas as desculpas aos legítimos. Na verdade, são batedores da porta do tesouro nacional, deixando-o desprovido do mínimo para sustentação do Estado e distribuído entre comparsas que se protegem com falsos álibis e com a inércia do poder judiciário, em especial, as cortes superiores. Um único homem, o Juiz Moro, fez mais pela justiça brasileira do que o STJ e o STF em toda a história desses inúteis colegiados. Se buscarmos a quantidade de escândalos nacionais gestados por habilidosos políticos e autoridades públicas, a partir da nova república, para não se estender no tempo, e o número de condenações de políticos corruptos e autoridades de colarinhos brancos chega-se a um espantoso índice perto de zero que, nada mais expressa, do que a inapetência das cortes superiores de julgarem os confrades. As leis brasileiras não atendem ao princípio constitucional da igualdade, mas a compadria dos que fazem do poder a maior mercancia da nação. Incluída, inclusive, a palhaçada do escândalo do mensalão.

A bola da vez é o petrolão e hábeis jogadores de bilhar começam a cruzada de tirar os verdadeiros culpados da reta e, mais uma vez, a suprema corte exerce o papel decadente de medo e submissão e agride a lógica processual, que a práxis mostrou eficiente, e desarticula o núcleo de apuração da operação lava a jato, comprometendo todo o trabalho de um Juiz singular que mostrou que a justiça poderia ser feita. Ele, talvez por romantismo, esqueceu que a eficácia do sistema jurídico, passa pelo anoréxico STF e sua fraqueza institucional defronte dos grandes. Seria desnecessário justificar por que algumas autoridades tem foro privilegiado. A justiça brasileira inverteu a pirâmide da racionalidade. Se o processo subiu, ninguém sabe, ninguém viu.

O petrolão está se mostrando um escândalo atípico que só apequena a justiça brasileira. Os corruptores foram presos e alguns permanecem, entre eles o cagaço Marcelo Odebrecht, denunciaram, explicaram, mostraram, detalharam, desenharam e quando chegou na linha do meio campo empacou. Começou o famoso jogo de xadrez entre os pérfidos políticos brasileiros. O escândalo compromete toda a linha de sucessão do cargo de mandatário da nação. Todos estão envolvidos, inclusive o apontado como cabeça, que reage às acusações com suas bravatas imbecis e suas metáforas ignóbeis e a justiça nem aí. Tudo bem pensado. Prender José Dirceu foi a permissibilidade máxima permitida, talvez já não fosse mais útil ao sistema. Para cima a coisa muda. A própria soberania nacional é aviltada pela tal figura e alguns outros mequetrefes como Stédille e o Cutizinho e não se viu ou se vê uma autoridade exigir explicações e punir exemplarmente. A soberania nacional nada vale diante da desfaçatez dos poderes da República e seus mandatários quadrilheiros.

Os nossos partidos políticos, os P, se tornaram verdadeiros PQP, com todo o respeito as respectivas genitoras. Um sistema político autofágico, corporativista, venal, servil e a célula mater dos mais hediondos crimes nacionais levando a ignorância, a fome, a desassistência social a milhões de brasileiros que, por uma “bolsa” qualquer, cujo preço é calculado friamente para perpetuar a pobreza, cuja massa crítica é embotada pela dependência do gestor de plantão, retroalimenta todo o sistema de sustentação do poder a qualquer preço. E nesse preço, qualquer que seja ele, está incluído a impunidade, o mais invisível dos tributos pagos pela sociedade. E os PQP são ardilosos e sabem, com maestria, dominar a premeditada arma da passionalidade do povo brasileiro.

A teoria do caos mais uma vez prevalecerá. Tudo está aos cacos. Qualquer índice institucional, nacional ou internacional, está abaixo da média e por motivos estruturais. A crise, anunciada por falso profeta, como marolinha, um claro desrespeito a cidadania e à postura como homem público, tratando com deboche um fato que o mundo tratou com responsabilidade e o resultado explodiu nas próprias i irresponsáveis mãos. O governo está acuado e as tentativas de levar no grito já não gera os efeitos premeditados.

O Estado brasileiro está sob a mira da história. Nada funciona. Tudo é enganação. O povo sofre as necessidades mais básicas e o governo não reage ou não tem como reagir. Os sistemas político e econômico estão falimentares. Um por falta de homens, o outro por falta de dinheiro decorrente de políticas públicas nada estadistas ou republicana e da falta de homens. Aliás, o país, em todos os aspectos, não tem políticas públicas, mas politicagens de um governo desvergonhado e medíocre. Herdou o que há de pior do próprio sistema político, com bases na venalidade de homens públicos crápulas e que hoje se torna um fardo difícil e caro para carregar. A raposa está acuada e o sistema de galinheiro a que foi submetido o poder em suas diversas esferas, começa a mais autêntica briga de galinhas. Todos querem ganhar no carcarejo e o preço do milho do silencio e da inércia subiu no nefasto mercado do cinismo político.

Conta a história, segundo a religião católica, que a humanidade foi salva por um dilúvio. Não garanto o fato, mas, em tempos tenebrosos, mesmo com a fúria de Deus, Seria impossível encontrar nos meandros do poder constituído, um Noé e sua determinação em construir uma arca. Esta com certeza superfaturada e, na hora das enchentes, Noé seria o primeiro a ser jogado às águas e o mal enfrentaria a tempestade e ressurgiria, depois de quarenta dias e quarenta noites, reciclado em suas maldades e premeditando o que fazer para ficar com o mundo todo para si, quiçá travestido de besta fera com enorme mão de quatro dedos apontando para os camaradas escondidos no porão da arca e, como zumbis, atormentar os homens crentes que tiveram o trabalho de conduzir a arca a salvo no meio das provações mais adversas.

O bem seria o timoneiro para que o mal fizesse a travessia comodamente instalado no porão da nau e, com o mais imbecil proselitismo, instigando os que trabalhavam em pequenos motins para que o bem, ao chegar ao píer da nova humanidade, já sofresse o mais traiçoeiro dos golpes: a relatividade da palavra de Deus e a realidade da palavra do Demo, o partido político que surgiria a partir de então e reescreveria, à sua maneira, a história de um povo que jamais ousou lutar pelo bem maior da sociedade em que vivia, a cidadania, e a entregou a falsos profetas e ladrões verdadeiros.

Adauto José de Carvalho Filho, AFRFB aposentado, Pedagogo, Contador, Bacharel em Direito, escritor e Poeta.  

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