DA FANTA AO ALCOOL EM GEL –
Nas crises vividas pelo mercado financeiro, a população sofre prejudicada pela oscilação dos pilares da economia mundial. Há, contudo, quem lucre, pois conforme sabemos ser o dinheiro, o mais selvagem dos animais: com mínimo ruído, foge…muitas vezes para o bolso dos que sabem aproveitar as oportunidades.
Em recente ida a Berlim, visitei o Museu do Holocausto, com ampla área à céu aberto, recheada por blocos de concreto parecendo um campo ondulado de pedras, dispostas no solo de forma a produzir no visitante, tanto intranquilidade, como um clima de confusão. Em sua parte subterrânea, há inúmeras gravações, uma delas relacionando os que mais lucraram com o segundo conflito bélico que abalou o planeta, século passado.
A Volkswagen usando judeus prisioneiros durante o regime nazista, fabricou e massificou o uso do fusca em regiões de guerra. Hugo Boss, amigo e costureiro de Hitler, fortaleceu a sua marca, fazendo fortuna ao confeccionar, com o trabalho escravo, uniformes para o exército chucrute. O Deutsche Bank confiscou bens semitas e vendeu ouro das vítimas do Holocausto, enquanto a Bayer (a mesma que hoje é a esperança de Trump na busca da vacina contra o Covid19) fabricou o gás usado em centros de extermínio. A gigante americana IBM, comercializou em larga escala as máquinas Hollerith, consideradas precursoras dos computadores, usadas para a contagem, organização e sistematização de dados de prisioneiros de campos de concentração.
Todos ganharam muito, apesar da época de caos financeiro. Até a Coca Cola, lucrou em demasia. Como não possuía em solo germânico “cola”, insumo básico para o seu famoso refrigerante, recebendo gratuitamente do Estado, laranjas ali cultivadas em abundancia, criando a “Fanta”, distribuída gratuitamente com os combatentes locais e vendida à população.
O industrial Oskar Schindler, membro do partido Nazi, foi oportunista: inicialmente interessado no lucro, mostrou iniciativa e dedicação extraordinárias ao salvar as vidas dos 1200 empregados judeus de suas fábricas de esmaltes e munições, localizadas na Polónia e República Checa, respectivamente.
Hoje com a explosão do coronavírus, o mundo se rende à necessidade de um constante uso de produtos de limpeza e higiene, das máscaras faciais, serviços de entrega online como uber eats, ifood e similares, preocupando-se ainda com o desaparecimento de itens como álcool em gel, que quando encontrados, são ofertados a preços inflacionados.
Meditando sobre esta situação, chega-se à conclusão de que o homem, de todos os tempos, sempre viveu uma tensão entre dois dilemas: Por fora, o equilíbrio da imagem. Em público, todos deveriam ser como que sacerdotes, comportamento impecável, com retidão moral absoluta e espinha dorsal inflexível. Por dentro, porém, irrompendo a força da lei de Gérson, jogador tricampeão mundial, garoto propaganda dos cigarros Vila Rica, veiculado nos anos setenta: “O importante é levar vantagem em tudo, certo?”
Nesta nossa vida, de posse da mínima oportunidade, os homens se repetem e, não raro, atropelam as regras cujas transgressões acabam por prejudicar milhares de pessoas.
Alberto Rostand Lanverly – Presidente da Academia Alagoana de Letras