DE CARONA NA COVID-19 –
Acordei, pra variar, um retardado como sempre. Vencido, hoje, pela bola da vez, a diferença de fuso horário. O que adoro mesmo é ler notícias do dia anterior e assuntar extrapolações começando a se esboçar. Mas hoje chegou a ocasião da exceção à regra. Plugado estou na RTFrance a exibir as peripécias dos “gilets jaunes” em Paris. Não quero encher meu saco nem o de vocês, com avulsas considerações críticas sobre o evento. Mas me parece, só me parece, que a meninada não estaria muito por dentro da nova filosofia da aglomeração (palavra maldita em dias de pandemia). Mas a juventude sabe de si. E escrever dessa forma só me dá prazer. Uma maneira de pensar sem causar incomodo aos sábios, pois tudo é relativo na vida. Se tiverem a paciência de continuar lendo eu diria que alimentar opiniões sobre esses tipos de coisas me remonta ao ato de comer carne crua. A alimentação carnívora se aplica aos dentes cravados nas vítimas, provoca emissão de sangue, da qual ela própria se alimenta. Daí, abaixo as abordagens críticas e circunstanciais e a minha disposição em me fazer um tanto só emocional. Adorar ficar vendo todo o rebuliço, consoante as circunstâncias, como quem vê um seriado televisivo. E ficar imaginando o que poderia suceder. E atentar para uma possível razão que me poderia servir como resposta. Aí, então, se abre um leque imenso de variáveis possíveis, embasada em duas assertivas. A motivação da malta exaltada a favor, segundo ela, na defesa da democracia, em questionar a imposição do dito “novo normal”. E a ameaça de retaliação por parte da autoridade constituída, segundo ela, preocupada em salvaguardar a segurança e o bem estar da população. Só a turma da psicologia para tentar chutar algo produtivo. Dúvida, medo, pudor, vergonha? Ou seria que a revolução francesa (um fiasco do ponto de vista prático) e a Inquisição espanhola tiveram um braço tão comprido que ainda hoje incomoda? Que os outros escrevam sobre as coisas aborrecidas da vida. “Hoje é sábado, amanhã é domingo/A vida vem em ondas, como o mar / Os bondes andam em cima dos trilhos…” E o mundo gira, não muito bem, mas gira. E conjecturar, sobretudo num sábado, coisas profundas e mais enigmáticas me cansam, como procurar descobrir a fronteira entre a vida pública e a privada. Confesso meu voyeurismo um tanto neurótico sobre o assunto. Pensava escrever, no máximo, a propósito de nada. Findei fazendo. Tô achando ótimo passar a manhã assim, vendo todo esse escarcéu. Nem caminhar eu fui. Fazer o quê?
José Delfino – Médico, poeta e músico
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