DO CALIFON AO SUTIÃ –
Sempre que leio o delicioso poema de Jussier Quirino, Vou-me Embora pro Passado, me vem a lembrança o tempo de vida despreocupada na minha Natal, sem barulho, sem sufoco, sem poluição, sem violência e sem ninguém enjaulado em edifícios.
Temos de admitir que era salutar ver circular pelas poucas ruas pavimentadas da cidade os carros de marca Jeep e Rural Willys, Vemaguet, Gordine, Sinca Chambord ou as motonetas Lambreta, Vespa e Berlineta. Ou se deleitar numa das poltronas do cinema Rex para assistir aos seriados de Roy Rogers, Buck Jones, Bill Elliott, Rex Allen, Tom Mix e Hopalong Cassidy.
De acompanhar a namorada ao cine Rio Grande, vestindo calça Faroeste, ou outra de nycron ou tergal, com camisa Volta ao Mundo e sapatos Clarck ou Passo Doble; enquanto ela desfilava num tubinho, com anágua ou combinação, maquiada com ruge ou pó de arroz da Cashmere Bouquet, cabelos arrumados com laquê, e cheirando a perfume English Lavanda Atkinson.
Passear na Praia do Meio, aos domingos, para ver moçoilas desfilarem vestindo maiôs de fio helanca da Catalina, esperando alguém que lhes clicassem com uma Kodak Brownie ou Roleiflex – nunca fotografei ninguém com uma dessas máquinas, porque nunca pude uma delas comprar. Enquanto marmanjos viciados em nicotina fumando cigarros Yolanda, Astoria ou Continental, tentavam impressionar as garotas praticando esportes à beira-mar.
Entrar numa farmácia e adquirir medicamentos que nem sabíamos ao certo para o que serviam, mas gostávamos de ouvir a sonoridade dos nomes, tais como: Pílulas de Vida de Dr Ross, Capiloton, Asmapan, Postafem, Rubusterina, Regulador Xavier, Terebentina, Bromil e Capivarol. Retirar uma garrafa de água geladíssima de um refrigerador Kelvinator ou Gelomatic, em seguida tomar um cafezinho feito na hora num bule de ágata.
Como era bom receber convites para participar de “assustados” organizados por gurias da turma para arrumar namorados ao som de vitrolas, onde tocavam long-plays de Ray Conniff, Nat King Cole e, mais adiante o ritmo do twist extraído do rock n’ roll, culminando com a Jovem Guarda e ditos como: É uma brasa, mora! – as meninas forneciam os salgadinhos e os marmanjos as bebidas.
Sacanagem era o petisco mais servido, pelo baixo custo dos ingredientes, pois eram feitos com rodelas de salsicha entre pedaços de queijo enfiados num palito. E os pileques inocentes decorrentes de doses, em excesso, de conhaque Castelo, Rum Montilla com Coca-Cola ou whisky Old Eight servido On the rock.
Quanta saudade dos quatro dias dos antigos carnavais, que começavam com blocos de rapazes e moças fantasiados, tomando de “assaltos permitidos” as casas de amigos ou de familiares para dançar, bebericar e petiscar durante o dia. Tratava-se do “esquente” para participar do corso da Avenida Deodoro e terminar nos bailes dos clubes América, ABC, Assen, Alecrim e AeroClube até a manhã do dia seguinte. Isso anestesiados com lança-perfumes Rodouro ou Colombina.
Jamais renunciarei ao progresso com suas inovações, facilidades e melhorias tecnológicas, e na ampliação do tempo de vida das pessoas. Nunca renegarei as conquistas nos diversos campos das atividades humanas. Da mesma forma que não poderei esquecer a beleza que foi a nossa juventude.
Por isso faço questão de relembra a época que vivemos e sobrevivemos sem internet, fibra ótica ou viagens interplanetárias, no tempo que caritó era ficar solteira e califon o nome dado ao sutiã.
José Narcelio Marques Sousa – engenheiro civil
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Feliz são os que vivenciaram a época sem mídias sociais.
Narcelio, mesmo sem as modernidades atuais, que todos gostam , não podemos esquecer a época da nossa juventude, que foi muito bem curtida por todos nós , mesmo sem as liberdades e facilidades de hoje. Soubemos curtir bem o nosso tempo, não foi Edilza??