Nosso Sol emite um fluxo constante de plasma, ou gás ionizado, chamado de vento solar, que atinge todo Sistema Solar. Fora da magnetosfera protetora da Terra, o vento solar passa correndo a velocidades que chegam a mais de 500 quilômetros por segundo. Mas os cientistas ainda não conseguiram descobrir de onde vento solar obtém energia suficiente para atingir essa velocidade – até agora.
Nossa equipe de heliofísicos publicou um artigo em agosto de 2024 que aponta para uma fonte de energia que impulsiona o vento solar.
Descoberta do vento sola
O físico Eugene Parker previu a existência do vento solar em 1958. A sonda Mariner, lançada com destino a Vênus, confirmaria sua existência em 1962.
Desde a década de 1940, estudos mostraram que a coroa solar, a “atmosfera” do Sol, poderia se aquecer a temperaturas muito altas, de mais de 1 milhão de graus Celsius.
O trabalho de Parker sugeriu que essa temperatura extrema poderia criar uma pressão térmica externa forte o suficiente para superar a gravidade e fazer com que a camada externa da atmosfera do Sol escapasse.
À medida que os cientistas faziam medições cada vez mais detalhadas do vento solar próximo à Terra, no entanto, rapidamente surgiram lacunas na ciência do vento solar. Em particular, eles encontraram dois problemas com a parte mais rápida do vento solar.
Primeiro, o vento solar continua a se aquecer depois de deixar a coroa do Sol, sem explicação. E, mesmo com esse calor adicional, o vento mais rápido ainda não teria energia suficiente para os cientistas explicarem como ele é capaz de acelerar a velocidades tão altas quanto as registradas.
Essas duas observações significavam que alguma fonte de energia extra deveria existir além dos modelos de Parker.
Ondas Alfvén
O Sol e seu vento solar são plasmas. Os plasmas são como gases, mas todas as partículas nos plasmas têm uma carga e respondem a campos magnéticos.
Semelhante à forma como as ondas sonoras viajam pelo ar e transportam energia na Terra, os plasmas têm o que chamamos de ondas Alfvén se movendo através deles. Durante décadas, as ondas Alfvén foram consideradas como influenciadoras na dinâmica do vento solar e desempenharem um papel importante no transporte de energia no vento solar.
Os cientistas, porém, não sabiam dizer se essas ondas estavam de fato interagindo diretamente com o vento solar ou se geravam energia suficiente para alimentá-lo. Para responder a essas perguntas, eles precisariam medir o vento solar muito próximo ao Sol.
Em 2018 e 2020, a NASA e a Agência Espacial Europeia (ESA) lançaram suas respectivas novas missões para estudar o Sol: a Parker Solar Probe e a Solar Orbiter. Ambas sondas carregavam os instrumentos certos para medir as ondas Alfvén perto do Sol.
A Solar Orbiter viaja entre 1 unidade astronômica (UA) – cerca de 150 milhões de quilômetros, a distância média da órbita da Terra do Sol – e 0,3 unidade astronômica, chegando um pouco mais perto do Sol do que Mercúrio. Já a Parker Solar Probe mergulha mais fundo no interior do Sistema Solar. A sonda chega a apenas cinco diâmetros solares do Sol, entrando nas bordas externas da coroa. Cada diâmetro solar equivale a cerca de 1,4 milhão de quilômetros.
Com essas duas missões operando juntas, não apenas cientistas como nós podem investigar o vento solar próximo ao Sol, mas também podemos estudar como ele muda entre o ponto em que Parker o vê e o ponto em que o Solar Orbiter o vê.
Reversões magnéticas
Na primeira aproximação da Parker do Sol, ela observou que o vento solar próximo ao Sol era de fato abundante em ondas Alfvén.
Os cientistas usaram a Parker para medir o campo magnético do vento solar. Em alguns pontos, eles notaram que as linhas de campo – ou linhas de força magnética – oscilavam em amplitudes tão altas que invertiam brevemente a direção. Os cientistas chamaram esses fenômenos de magnetic switchbacks (reversões magnéticas). Com a Parker, eles observaram essas flutuações de plasma contendo energia em toda parte do vento solar próximo ao Sol.
Nossa equipe de pesquisa queria descobrir se essas reversões continham energia suficiente para acelerar e aquecer o vento solar à medida que ele se afastava do Sol. Também queríamos examinar como o vento solar se modificava à medida que esses comutadores cediam sua energia. Isso nos ajudaria a determinar se a energia das reversões estava sendo usada para aquecer o vento, acelerá-lo ou ambos.
Para responder a essas perguntas, identificamos uma configuração única de órbitas em que ambas as sondas cruzavam a mesma porção do vento solar, mas a distâncias diferentes do Sol.
O segredo das reversões
A Parker, próxima ao Sol, observou que cerca de 10% da energia do vento solar estava armazenada nas reversões magnéticas, enquanto a Solar Orbiter mediu essa energia em menos de 1%. Essa diferença significa que, entre a Parker e a Solar Orbiter, essa energia das ondas foi transferida para outras formas de energia.
Nós fizemos algumas modelagens, da mesma forma que Eugene Parker fez. Desenvolvemos implementações modernas dos modelos originais de Parker e incorporamos a influência da energia das ondas observada a essas equações originais.
Comparando os conjuntos de dados e os modelos, pudemos ver especificamente que essa energia contribuiu tanto para a aceleração quanto para o aquecimento do vento solar. Sabíamos que ela contribuía para a aceleração porque o vento era mais rápido na Solar Orbiter do que na Parker. E sabíamos que ela contribuía para o aquecimento, pois o vento era mais quente na Solar Orbiter do que teria sido se as ondas não estivessem presentes.
Essas medições nos informaram que a energia das reversões era necessária e suficiente para explicar a evolução do vento solar à medida que ele se afasta do Sol.
Nossas medições não apenas informam os cientistas sobre a física do vento solar e como o Sol pode afetar a Terra, mas também pode ter implicações em todo o Universo.
Muitas outras estrelas têm ventos estelares que levam seu material para o espaço. A compreensão da física do vento solar de nossa estrela local também nos ajuda a entender o vento estelar em outros sistemas. Aprender sobre o vento estelar pode dar aos pesquisadores mais informações sobre a habitabilidade de exoplanetas.
Fonte: G1