É SOBRE REENCONTROS, REMINISCÊNCIAS, CAFÉ E POESIA… –
Eu havia marcado um café na segunda-feira(20) com o amigo professor e escritor Sueldo Câmara, que acabara de lançar o livro Imagens da Prosa e da Poesia, pela editora Sarau das Letras, que, por sinal, também é a minha editora, por onde publico meus escritos. O final de semana foi por demais agitado, o que me fez passar batida quanto ao horário que havíamos combinado.
A mensagem recebida quinze minutos antes do horário marcado no Café Vila Rica me fez saltar da mesa e sair puxando minha amiga pelo braço, desviando das pessoas que estavam pelo meio do caminho, afinal, os shoppings nessa época do ano são sempre lotados, com pessoas apreciando vitrines em busca de presentes para o amigo secreto de mais uma confraternização de final de ano.
O encontro foi poético, estreitamos os laços de amizade, falamos amenidades, trocamos conhecimentos, experiências, relembramos histórias cheias de nostalgias. A tarde estava prometendo ser agradabilíssima. O meu café veio como eu gosto, coado no pano, já a minha amiga optou pelo café mais incrementado, algo mais sofisticado, enquanto o escritor pediu um chá.
O espaço estava propício para aquela tarde literária: café, livros, boa companhia, excelente papo, poesia, ambiente aconchegante e lindo, nos remetendo às casas de antigamente, com aquelas louças com frisos dourados, porcelanas das mais variadas, móveis rústicos e um acolhimento ímpar. Aquela tarde de dezembro de mais um ano atípico nos permitia receber afagos na alma através da literatura, do café quentinho e dos abraços trocados com as promessas de novos reencontros para falarmos acerca das nossas impressões sobre o livro. Já quero ler e resenhar, aguardemos cartas.
As horas voaram como já era de se esperar, pois quando o papo é bom não se percebe o tempo passar, mas era hora de cuidar dos outros compromissos. Pensam que os reencontros acabaram por aí? Na saída, na calçada do @vilarica.cafe, quem eu reencontro? A minha professora da terceira série. Incrível como as memórias afetivas são despertadas nas situações mais inusitadas. Fui aluna de Tia Zélia há 41 anos; o mais incrível foi olhar para aquela mulher em pé na calçada do café e ter a certeza que a conhecia, seu olhar me remetia a um lugar bom da minha história.
Eu fui descendo as escadas em sua direção e, quanto mais eu me aproximava, mais eu tinha certeza que a conhecia. Deixei minha timidez de lado e disse:
– Eu a conheço.
Ela me olhou como se quisesse me reconhecer também, no entanto, era nítido que ela não fazia a menor ideia de quem eu era. Mesmo assim ela disse:
– Eu fui professora – Disse me olhando, buscando resgatar algum tipo de lembrança.
– Em qual escola? – Perguntei tomada pela ansiedade de saber o nome da escola.
– Escola Doméstica.
Bingo! Era de lá que eu a conhecia, da escola em que eu praticamente estive desde a minha infância até a adolescência. Eu estava certa o tempo todo, ela fez parte de uma das esquinas que eu dobrei. Em uma delas, em uma das esquinas da minha existência, ela estava lá, ajudando-me a construir a minha história de vida, contribuindo, de alguma forma, no meu desenvolvimento intelectual, no meu crescimento e evolução como ser, como pessoa, como cidadã, com o que lhe cabia naquele momento, ser educadora.
Hoje eu sei que ela não passou despercebida em minha vida, sua contribuição e importância ficaram registradas nos meus guardados de memória, pois somos frutos daquilo que vivemos. Ela estava ali, de frente para mim, um filme passou pela minha mente, e eu só pude dizer:
– Tia Zélia, que felicidade a reencontrar! Obrigada por tudo.
Flávia Arruda – Pedagoga e escritora, autora do livro As esquinas da minha existência, [email protected]