EMBRULHOS DE(O) PRESENTE… –

E assim se passaram alguns dias…

Preferi não os contar. Deixei que cada um deles fosse apenas dia, com seus imprevistos e rotinas, com suas surpresas e apatias. Deixei que os ciclos diários se fundissem em seus próprios sentidos. Não havia o que fazer naqueles dias, para que amenizássemos as dores que nos corroía. Preferi
perder a noção do tempo e achar que o ontem está mais próximo de mim agora, tendo a frágil ilusão que o amanhã, quem sabe, será a ponte para o melhor de ontem.

Assim, se por um lado, estar no presente me torna um ser privilegiado, no sentido de ter belas lembranças de um passado, este recorte é cheio de desejos futuros. Por outro lado, estar no presente também significa a oportunidade de compreensão, racionalização e crescimento para, com isso, aprender a sábia lição de abstrair impulsos e ânsias que espreitam as relações humanas e provocam desencontros de almas.

Se eu me arrependo de algo do ontem?

É doloroso lembrar daquela decisão, proferida em tão poucas palavras. Pareceu-me mais a injeção letal de uma sentença de morte, daquelas que mata lenta e silenciosamente, pequeno coquetel de palavras capazes de nos
tomar os sentidos, paralisando os pulmões, sufocando, em arrependimento, até que o coração comece a parar. Do que a dúvida em compreender o significado do “acho que…”.

Ela, a parca frase, estava escrita no sentido exato das entrelinhas. Socou-me o estômago. Ainda trêmula do baque, que eu mesma me fiz tomar, tentava estabelecer limites entre os tempos de ontem, de agora e de futuro. Aceitar a impossibilidade de voltar algumas folhas do calendário, de não poder fazer valorosas modificações, aceitar o fracasso de trazer de volta os “ontens”, fez- me pensar que, algumas dessas mudanças, causadas por todo esse desencontro, seriam, indubitavelmente, a mola propulsora dos desvios de saltos e tombos que a vida me ofertou, e, em outro instante, a grande vilã, por me empurrar penhasco a baixo, sem direito a cama elástica, fazendo-me sentir o frio da queda, percorrendo todo o corpo, até que, esborrachar na dureza da vida seja a única alternativa, antes de recuar para, novamente, impulsionar…

Se, metaforicamente, o ontem e o hoje; saudade e arrependimento; verdade e acerto são pesos que terão sempre duas medidas, aceito a injeção de letargia em minhas forças hoje, em prol das modificações necessárias e pertinentes, que solidificarão as massas corporais e intelectuais de quem deseja aparar as arestas amanhã.

Assim eu tenho pensado…

É só seguir, pensar que é no agora que embrulhamos o melhor do nosso passado, com o papel de(o) presente, para mudarmos nosso futuro.

 

 

*Escrito em 09.06.16. Modificado em 15.01.18

 

 

 

 

 

 

Flávia Arruda – Pedagoga e Escritora, [email protected]

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