ENCONTRAMOS AS BOTAS DE JUDAS… –

Mais um dia de viagem pelo interior potiguar integrando à Comissão Permanente de Acompanhamento e Fiscalização do Transporte Escolar do Estado do Rio Grande do Norte – CPATE.  Desta vez, a viagem foi em direção ao litoral, precisamente, para a Mesorregião Oeste, desaguando na Microrregião Vale do Açu, na antiga Vila do Mangue, que teve sua emancipação em 28 de dezembro de 1995.

O então município, de clima tropical úmido, agora chamado de Porto do Mangue, tem área de 318,968 km² e (est. IBGE/2019) 6.437 habitantes. Outro fato legal para destacar são seus municípios circunvizinhos: as cidades de Areia Branca, Serra do Mel, Carnaubais, Macau e, baba baby, o Oceano Atlântico. É mole ou quer mais?

O paraíso não pode ser de fácil acesso. Achar facinho assim… que nada! Concordam comigo? O paraíso é logo ali, pode acreditar, porém, o fato é que penamos (diria até que, antes de chegar ao paraíso, é preciso passar pelo purgatório) para pôr os pés lá. Nada é propício, nada converge para que se abeire na hora marcada com a secretária de Educação e, também, com o prefeito interino da cidade (que acabara de assumir por questões que não nos cabe colocar aqui, pois, nessa crônica, só nos servem elementos despretensiosos e leves). Eles iam nos receber com o propósito de facilitar a averiguação dos ônibus que transitam com os alunos da rede Estadual de Ensino do RN.

Paramos algumas vezes durante o trajeto, no meio do caminho (e do nada), para nos certificarmos que estávamos na rota certa (estou sendo generosa, confesso, mas paramos, no mínimo, umas 10 vezes. E a cada vez que isso acontecia, a cada ser vivente avistado, diante da lonjura que nos colocava em dúvida sobre estarmos no trajeto certo) perguntávamos:

– Por gentileza, onde fica Porto do Mangue?

A resposta era sempre a mesma (acho que o costume é o que mata, como diz o dito popular):

– Pode seguiiiiiiiiiiiiiiiiiiir seeeeeeeeeeeeeeeempre em frente, que vai dar lá!

Acontece que a estrada não tinha fim e, muito menos ainda, as crateras que tínhamos que desviar para não nos causar acidente. E só para não causar nenhum alvoroço, a probabilidade seria de, no mínimo, pelo andar da carruagem, termos um pneu estourado antes de chegarmos ao bendito destino. Numa dessas paradas, quando perguntamos ao primeiro senhor que vimos, naquele momento, pasmem! Ele emitiu a mesma resposta que os demais abordados anteriormente:

– Pode seguiiiiiiiiiiiiiiiiiiir seeeeeeeeeeeeeeeempre em frente, vai dar lá!

A minha colega de labuta, já desenganada da vida, com uma tremenda vontade de abortar a operação de fiscalização, pensando que talvez chegasse primeiro à capital e nunca ao destino, insistiu:

– Demora muito, senhor, para chegar?

O senhor de pronto respondeu a frase clichê naquelas redondezas:

– Siguaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa em freeeeeeeeeeeeeeeeente, que vai dar lá (Isso, apontando com o dedo indicativo, para o horizonte à frente do nosso veículo).

A minha amiga agradeceu, com toda simpatia que lhe restara, assim:

– Obrigada senhor, voltaremos por aqui com as botas de Judas!

Nisso, olhou para mim e completou a frase:

– Tenho certeza que foi lá que Judas perdeu as botas.

Juro que não esperava por essa sua tiragem, que me rendeu, vale relatar, altas e estrondosas gargalhadas por todo o trajeto, isso, até que víssemos algumas dunas esbranquiçadas, dunas de sal marinho, a tal miragem que tanto desejávamos ver em meio ao deserto nordestino. Era, por certo, o milagroso sinal de que estávamos, às vistas do oásis em meio ao deserto nordestino, possivelmente, na entrada da cidade do Porto do Mangue.

Pelo menos as gargalhadas nos fizeram esquecer os buracos (e a distância colossal da estrada) – da capital do Estado para a província paradisíaca.

Ah, tem um porém nessa história toda, que vale a pena frisar: “rapadura é doce mas não é mole!”

 

 

 

 

 

Flávia Arruda – Pedagoga e escritora, autora do livro As esquinas da minha existência,  [email protected]

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