EU E A TECNOLOGIA –
Há pouco mais de três anos, em uma noite de encontro entre amigos músicos, precisando voltar para casa e não estando com o meu carro, solicitei a um deles a chamada de um aplicativo de taxi, a partir do seu telefone celular. Pedro Neto, poeta, violonista e compositor, a quem fiz o pedido, estranhou que eu não usasse celular e disse-me, brincalhão e repreensivo que eu precisava abandonar o meu obscurantismo (expressão dele) e adotasse o uso dessa ferramenta tão útil, indispensável e facilitadora. Eu era conhecido por ainda usar um celular ultrapassado e de ínfimos recursos, mas que já havia sido o sonho de consumo de muita gente. Concordei com Neto, porém ainda demorei um pouco a me deixar seduzir por essa maravilha técnica moderna e atraente e só dali a alguns meses é que comprei o meu primeiro smartphone, uma peça de nome pomposo, emblemático e deveras sedutor.
Considerei uma verdadeira conquista e um enorme avanço, porque eu sempre fora um involuntário resistente às inovações tecnológicas, sempre estive atrasado para aquisição desses bens de consumo que nos fazem sentir integrados ao mundo moderno e cheio de novidades eletrônicas. Só comprei o meu primeiro televisor preto-e-branco depois de esgotar a paciência dos vizinhos e até da minha sogra, nas casas de quem ia, às vezes, assistir a algum programa. Até bem depois da Copa do Mundo de 1970, eu ainda não possuía um aparelho. E a primeira TV a cores só compraria alguns anos mais tarde, quando quase todo o Brasil já dispunha da regalia.
Voltemos aos telefones e ao tempo em que tive o primeiro contato com um deles. Foi em uma dependência do prédio da Rede Ferroviária, quando mostraram um aparelho para me comunicar com o meu pai, que estava em outro local. O número que me indicaram, mesmo com apenas quatro dígitos, eu não consegui discar por conta do nervosismo da minha “estreia”, embora tendo já 15 anos de idade. Na sede da União dos Estudantes de Comércio, aos 17 para 18 anos, evitava usar o telefone disponível, com medo de violar alguma regra ou sigilo da comunicação telefônica. Era o início do governo militar, e até me assustava a desenvoltura dos colegas nas suas eventuais chamadas.
Atualmente, não se concebe ou não se conhece um jovem ou mesmo uma criança que não utilize um smartphone com habilidades e destrezas que alguns adultos às vezes não possuem. Essa clientela, com acesso facilitado, corre o risco de perder a pureza e a curiosidade natural, fascinada pelos celulares cheios de recursos e possibilidades. Esse envolvimento pode ser amenizado com vigilância, precauções e zelo paternos. O confinamento que ainda estamos enfrentando ensinou aos mais puros e resistentes como eu que tais ferramentas podem ser úteis e proveitosas. Os encontros virtuais, o alívio das saudades, a remota continuação e fortalecimento das amizades, dos amores distantes, a dinâmica dos negócios, o suprimento de carências materiais, são alguns dos elementos tornados possíveis por meio dos presentes recursos tecnológicos.
Por outras razões, impressiona a maneira como a telefonia celular está impregnada na vida das pessoas como algo absolutamente regular, indispensável, e nos assombra a influência que um fruto dessa tecnologia, as tais redes sociais, exerce hoje nas nossas decisões e atividades. Estamos dependentes de um canal não só de entretenimento, fatos agradáveis e cotidianas utilidades. Também vivemos à mercê de um caudaloso disseminador de informações irreais, distorcidas, mentirosas, tornadas verdadeiras e aceitas pelo simples fato de emergir do passe de mágica dessa forma de comunicação confortável e instantânea, que parece não carecer de análises ou confirmações.
Alberto da Hora – escritor, cordelista, músico, cantor e regente de corais
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