FEROZES E FURIOSOS –
Não! Não errei o título.
Aqui falo sobre o Enem, essa saga anual que culmina em janeiro. Por isso descartei a possibilidade de uso do adjetivo “velozes”. Aliás, não só por isso! São quatro dias de angústia. Como posso considerar este tempo veloz, diante de tanto estresse?
São dias conturbados. Recebemos as notas na semana passada e vimos, via Instagram, a vitrine das escolas, mostrando seus alunos e suas notas de redação. Sim! Uma boa nota DEVE ser comemorada, mas, por trás disso (não tão por trás, podemos dizer), surge uma rivalidade entre colegas de turma, pais, escolas e uma angústia diante da ausência da foto do seu filho sorrindo ao lado da conquista de uma redação 900 mais. E é só o começo…
Depois de alguns míseros dias começa a saga Sisu e aqui podemos mudar, mais uma vez, o título do filme e pensar na trilogia JOGOS VORAZES.
Quem sobreviverá?
São dias escolhendo primeira e segunda opções de curso, examinando ponto de corte, comparando cursos e instituições.
São dias construindo estratégias para encaixar seu filho na ampla concorrência, com, geralmente, menos de 50% das vagas.
Não! Não vou falar sobre cotas. Só digo que é terrível ver como temos poucas vagas na ampla concorrência (para quem não sabe, é onde não se encaixam as cotas que, salvo engano, são mais de sete modalidades).
Então, no primeiro ranking disponibilizado no segundo dia de Sisu (era para sair meia-noite, mas só saiu depois das 8h!) seu filho se encontra na quarta posição. Você vibra. Comemora. Respira aliviado. Sai o segundo ranking. Ele vai para décima sétima posição. Só tem dezoito vagas. O que você faz? Muda a primeira opção? Muda a segunda? Sugere que ele fique em lista de espera após o resultado final?
Você não sabe! Apenas enlouquece junto com o filho e…
Aí, entram os influencers! São muitos! Eles dão dicas, fazem vídeos comprovando suas teorias e você sai do Instagram decidido a ajudar seu filho a não perder a batalha. Volta para o computador e vê seu filho, aquele adolescente que acha que só tem essa oportunidade de conquistar a tão sonhada vaga (Mentira! É só a primeira vez! Acalme-se!) se desfazendo em incertezas e decepções, acreditando que é o pior ser humano do mundo, porque caiu no ranking e não terá uma foto sua postada pela escola e compartilhada pela família.
Você enche ele de esperança, frases repetidas mil vezes, compara o ponto de corte do curso matutino com o vespertino, em diferentes faculdades , diferentes cursos e acha uma possibilidade de ajudá-lo.
E no dia seguinte…
Tudo se repete!
De 17 a 21 de janeiro.
Todos os dias sendo FEROZES E FURIOSOS com o sistema. Acreditando que só há uma vitória, a conquista da aprovação, como JOGOS VORAZES onde só um sairá vencedor.
Não é uma batalha só do estudante. É de toda família! Todos cansados, desgastados, descabelados, torcendo para o tempo voar e isso ter fim.
Todos tentam ajudar e, talvez, esqueçam o mais importante. O estudante (filho, cheio de sonhos e desejos de dar aos pais a alegria da vitória) pode entrar em algum curso apenas para satisfazer as necessidades da sociedade, sem ter perfil nenhum para aquela área.
E se frustra… talvez mais com isso do que com a impossibilidade de ser aprovado…
E o jogo termina muitas vezes com uma conquista que não é uma vitória, pois o essencial não foi obtido…
E penso como é tudo tão cruel…
Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, Autora de “O diário de uma gordinha” e Escritora