A fragilidade econômica e social em uma região do Nordeste brasileiro facilita o tráfico de fósseis de dinossauros para o exterior, segundo afirma a professora de paleontologia do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Aline Ghilardi.
Ela é uma das articuladoras do grupo de pesquisadores que começou uma campanha para tentar repatriar um fóssil de dinossauro que se encontra em um museu na Alemanha há mais de 30 anos.
Junto com um colega da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Juan Carlos Cisneros, e paleontólogos estrangeiros, Aline escreveu uma carta aberta a Petra Olschowski, Ministra de Ciência, Pesquisa e Artes de Baden-Wüttemberg, exigindo a repatriação do fóssil do dinossauro retirado da região do Araripe, que fica entre o Ceará, o Piauí e Pernambuco.
A carta aberta agora está em uma campanha para arrecadação de assinaturas de pesquisadores na internet.
O fóssil é um crânio preservado de um dinossauro da espécie Irritator challengeri, que teria sido tirado do país e adquirido pelo museu em 1991. Segundo a pesquisadora, a região do Araripe é uma área rica de fósseis bem preservados de um grupo raro de dinossauros: os espinossauros – dinossauros bípedes e carnívoros com focinhos longos, e que podiam alcançar até 6,5 metros de altura.
A espécie foi descrita pela primeira vez em 1996 a partir de fósseis de 115 milhões de anos descobertos na Bacia do Araripe.
Porém, apesar da proibição de legal de fósseis serem retirados do país, a região teve muitos materiais como esse traficado, ao longo dos anos, segundo a professora. Atualmente o fóssil está no Museu de História Natural de Stuttgart, no estado de Baden-Württemberg.
“A Bacia do Araripe é um dos cinco depósitos de fósseis mais importantes do mundo, com fósseis muito bem preservados, o que gera interesse de colecionadores e de museus. Por ser uma região frágil economicamente e socialmente, há uma facilidade de crimes como tráfico de fósseis. As pessoas interessadas oferecem dinheiro para a população e acabam levando esse material para fora. Os moradores da região ganham muito pouco. Quem ganha mais são os intermediários nessa rota do tráfico”, afirma a professora.
Segundo a pesquisadora, o próprio nome dado à espécie reflete os prejuízos causados pelo tráfico de fósseis. Ao analisar o fóssil pela primeira vez, os pesquisadores constataram que ele tinha sido adulterado pelos traficantes para parecer mais bonito e completo e, dessa forma, mais valioso.
Se voltar ao Brasil, o crânio de dinossauro deverá ser transferido para o Museu de Paleontologia de Santana do Cariri, no Ceará.
Outro caso
Em 2020, brasileiros protestaram na internet contra o Museu de História Natural de Karlsruhe, na Alemanha, que mantinha ilegalmente outro fóssil brasileiro, o Ubirajara. A campanha começou quando Aline publicou sua insatisfação com a situação, dando início à hashtag #UbirajaraBelongstoBR (Ubirajara pertence ao Brasil).
A professora participou de uma frente de trabalho com outros paleontologistas para pressionar as autoridades brasileiras e as do estado de Baden-Württemberg, onde fica o Museu. Após dois anos, a repatriação do fóssil foi determinada em 2022 e Ubirajara voltou ao Brasil em junho deste ano.
Agora, a paleontologista busca repetir o feito com o Irritator. Aline e outros paleontologistas lançaram uma carta aberta a Petra Olschowski, Ministra de Ciência, Pesquisa e Artes de Baden-Wüttemberg, exigindo a repatriação do fóssil do dinossauro. Petra é a sucessora de Theresia Bauer, ministra que ordenou a devolução de Ubirajara para o Brasil.
O caso do Irritator chamou a atenção do público em maio deste ano, quando uma publicação científica divulgou um artigo descrevendo características anatômicas do dinossauro. Após a polêmica, o artigo foi removido, e dois dos autores conversaram com a frente de paleontologistas, apoiando a repatriação.