GENINHA –
O autor deste texto somente recebeu a anuência de publicá-lo após assumir o compromisso de mesclar as identidades dos envolvidos na história.
Geninha, divorciada, sem filhos, amava a vida, os homens e a liberdade. Há três anos deixara sua Natal querida para matar a saudade do Rio de Janeiro de onde guardava boas recordações do tempo de casada. Beirando os 50 anos possuía a vitalidade de uma mulher de 30.
Romildo, o seu último relacionamento, ficou lambendo as feridas por ser abandonado e atenuando as mágoas com a leitura do Evangelho. Ao passo que ela se esbaldava esbanjando amor e vitalidade. Por ser independente superava facilmente as decepções decorrentes dos envolvimentos afetivos. Amargou várias desilusões amorosas, em contrapartida, destroçou inúmeros corações apaixonados por ela.
E assim deixava a vida lhe levar. Geninha jamais imaginou enfrentar o revés que o destino lhe engendrou utilizando o mesmo fio das teias nas quais subjugava as suas conquistas. Há seis meses namorava, simultaneamente, dois solteirões na faixa dos 40 anos de idade, moradores da Zona Sul do Rio.
Caio, ela conheceu explorando trilhas na Floresta da Tijuca; Abel, em curso de bioenergética e danças circulares em Saquarema. Sobre ambos, ela repetia serem boas pessoas, porém com temperamentos e personalidades totalmente opostos.
Caio gostava de aventuras ecológicas e de esportes radicais; Abel, de tênis, ciclismo e fotografia. A agitação de Caio o direcionava para embalos, música pesada e a companhia de muitos amigos. A tranquilidade de Abel o conduzia para peças de teatro, bons restaurantes e vinhos de qualidade.
Abel adorava Geninha, mas ela era vidrada em Caio. Enquanto Abel se declarava encantado por ela, Caio se esquivava evasivo. Meses passaram sem que o triângulo amoroso alcançasse a dualidade.
De tanto Abel insistir para Geninha conhecer a sua família, ela finalmente capitulou e lá se foi compartilhar uma feijoada na casa dos pais do namorado apaixonado. Ao entrar na morada, e antes de ser vista pelos anfitriões, notou uma silhueta bastante conhecida sua, embora postada de costas para ela.
Quase desmaiou ao apresentarem Caio como irmão de Abel. Caio não moveu um músculo sequer, mas Abel desconfiou da reação de Geninha. A desunião se instalou no seio da família dos dois filhos únicos, com os pais abnegando o dúbio relacionamento e cortando relações sociais com Geninha, considerada amoral, aventureira e doidivanas.
Por outro lado, o caos dominou a vida da moça. Ela procurando reatar com Caio, e ele a rejeitando. Abel insistindo em renovar o namoro, e ela o evitando. Cenas constrangedoras se repetiram envolvendo inclusive amigos comuns dos três amantes. Antevendo algum desfecho irreparável, a moça se viu forçada a outra decisão radical na sua vida. Rompeu os laços com a metrópole e voltou para o Nordeste.
Romildo, homem manso de coração, recebeu Geninha de braços abertos como se nada de errado houvesse ocorrido. Ela jamais explicou-lhe as razões do retorno, nem ele quis saber se ela lhe pôs chifres na testa.
Certa noite, lendo para a amada trechos de Gênesis 4, na Bíblia Sagrada, distraído, ele se referiu aos filhos de Adão e Eva como Abel e Caio. Assustou-se, mas continuou a leitura. Geninha deixou de falar em Cidade Maravilhosa, porém permaneceu curtindo a vida, a liberdade e os home… Ah, isso é problema dos dois.
José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro e Escritor