O Grupo Silvio Santos emparedou os Arcos do Beco, no fundo do Teatro Oficina, e retirou a escada azul que liga a arena ao terreno que pertence ao grupo e é alvo de uma disputa judicial para ser transformada no Parque Bixiga.
Pelas redes sociais, o teatro divulgou uma nota de repúdio com imagens da ação, que ocorreu na manhã desta segunda-feira (5).
“O Teatro Oficina foi surpreendido por uma ação truculenta de fechamento dos arcos do beco do teatro, empreendida pelo Grupo Silvio Santos. Está em curso uma ação de reintegração de posse da escada azul que liga os arcos ao terreno, o Grupo Silvio Santos se antecipou à ação judicial, cometendo a retirada precipitada da escada, antes que a juíza expedisse o parecer final da reintegração de posse”, divulgou o Oficina.
Ainda de acordo com a Companhia, o fechamento dos Arcos do Beco é ilegal e “trata-se de violência simbólica e concreta contra patrimônio material e imaterial tombado nas três instâncias de proteção (municipal, estadual e federal)”.
O Teatro Oficina foi inscrito no Livro do Tombo Histórico e no Livro do Tombo das Belas Artes, pelo Iphan em 24 de junho de 2010. O tombamento determina os padrões para a preservação das características do espaço e delimita como entorno a área de proteção visual em frente ao Viaduto Júlio de Mesquita Filho.
Em nota, o Grupo Silvio Santos disse que a ação “só buscou reparar o estado original de nosso imóvel após longa e exaustiva discussão Jurídica que reconheceu, nos autos do processo, que a referida escada nunca havia sido parte do tombamento do Teatro Oficina”.
No texto, o grupo ainda afirma que, “comprovado nosso direito, obtivemos decisão favorável nesse sentido, e cumprimos com a decisão Judicial. O correto teria sido a outra parte ter executado o reparo, mas, pela incapacidade financeira alegada, o Juízo entendeu que se o GSS poderia fazê-lo.”
Em nota, o Ministério Público informou que a retirada da escada foi autorizada pela Justiça. O emparedamento, no entanto, será apurado pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, que instaurou procedimento para analisar o ocorrido. Já a instalação do Parque do Bixiga, segundo o comunicado, depende da desapropriação da área pela prefeitura.
Também em nota, a equipe jurídica do teatro afirmou que, “após análise técnica do Ministério Público, e após largo tempo de discussão a respeito, o MP chegou à conclusão de que a escada poderia ser retirada, mas que o fechamento da referida abertura deveria ser precedido de autorização dos órgãos responsáveis pelo tombamento do teatro”.
“Se é verdade que existe autorização judicial para a retirada da escada, também é verdade que o momento escolhido para esse ato – exatamente quando se aguarda a decisão do juiz sobre o pedido de suspensão do processo – causa estranheza, e surpreende pela precipitação.
De outra parte, o fechamento da mencionada abertura foi feita ao arrepio da determinação judicial, pois o posicionamento do MP a esse respeito é o de que se aguarde a autorização prévia dos órgãos responsáveis pelo tombamento, o que efetivamente não ocorreu. Em outras palavras, existe a possibilidade de que tal fechamento viole as regras do referido tombamento.
Por essa razão, o Teatro Oficina pleiteará hoje ao Juiz que sejam apuradas as responsabilidades do grupo Silvio Santos pela possível violação às referidas regras”, finaliza o texto.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informou que “recebeu com surpresa a notícia do emparedamento da fachada posterior do edifício que, desde 1961, abriga o Teatro Oficina”. Em um comunicado, disse que o casarão está tombado em nível federal pelo Iphan desde 2010.
“Na oportunidade, foram definidas as medidas que garantem a preservação do imóvel, o que implica na necessária aprovação, pela Superintendência do Iphan em São Paulo, de qualquer obra de intervenção direta ou indireta no bem ou no seu entorno. Caberia, portanto, ao Iphan aprovar qualquer intervenção no bem tombado por parte do proprietário do imóvel vizinho ao Teatro Oficina, o que não ocorreu. Em decorrência, o Iphan irá realizar vistoria de fiscalização nesta terça-feira (6/2).”
Acordo para viabilizar parque
A ação ocorre quase dois meses após o Ministério Público e a Prefeitura de São Paulo anunciarem que vão destinar R$ 51 milhões para a implantação do Parque do Rio Bixiga.
A verba virá da Uninove, uma das maiores universidades privadas do país, após assinar termo com o MP para destinar cerca de R$ 1 bilhão para evitar um processo por suspeita de pagar propina para evitar imposto (leia mais abaixo).
O parque era um sonho do dramaturgo Zé Celso, morto em julho de 2023. Ele travou uma longa disputa na Justiça por conta do tereno ao lado do Teatro Oficina Uzyna Uzona.
No local, o Grupo Silvio Santos pretendia construir três prédios de até 100 metros de altura.
- O terreno pertence ao Grupo Silvio Santos desde a década de 80.
- A construção atual onde fica o Teatro Oficina foi projetada pela arquiteta Lina Bo Bardi em 1992 e inaugurada em 1993.
- Zé Celso argumentava que a construção dos prédios prejudicaria as atividades culturais do Teatro e desconfiguraria o projeto de Lina
Durante anos, Zé Celso e Silvio Santos se reuniram diversas vezes para tentar resolver o impasse do terreno, que nunca se concretizou.
Com a verba, a prefeitura tentaria um acordo amigável com o Grupo Silvio Santos para comprar o terreno. Caso contrário, poderá pedir a desapropriação. O projeto do Parque Bixiga também vai ser submetido à Câmara Municipal.
Uninove
Para entender o motivo de a Uninove precisa pagar R$ 1 bilhão, é preciso voltar a 2013, quando foi descoberta a máfia dos fiscais. Durante as investigações, surgiu a informação de que a Uninove teria pagado R$ 5 milhões para dois agentes da prefeitura para não fiscalizarem a instituição.
A Uninove foi chamada e colaborou com as investigações. O acordo feito agora livra a instituição de processos cíveis.
Para pagar mais de R$ 1 bilhão de indenização, a Uninove vai ceder durante 16 anos um prédio onde vai funcionar a Secretaria Municipal da Saúde e um hospital de média complexidade que irá realizar 600 cirurgias por mês.
Além disso, um imóvel no Bairro do Cambuci será transferido ao patrimônio público municipal e um edifício será construído na Vila Clementino pela Uninove, em terreno municipal, para abrigar um Cartório Eleitoral.
Um dos principais motivos para a assinatura do acordo, segundo o MP, foi o fato de a universidade ter prestado relevantes serviços de saúde à população, inclusive durante a Pandemia de Covid-19.
A Uninove gastou mais de R$ 60 milhões durante a pandemia sem ter a certeza de que esse valor entraria nesse termo.
À época, o promotor Silvio Marques disse que o acordo indenizatório é o maior da história do Ministério Público de São Paulo, dez anos depois do escândalo ter sido descoberto numa investigação iniciada pela Controladoria do Município, na gestão do então prefeito Fernando Haddad (PT) e de promotores do Gedec, entre eles Roberto Bodini.
Fonte: G1