GUARDA-CHUVA –
Até que me vanglorio da minha memória. Mas, como todo bom cristão, às vezes me esqueço da coisas. Por exemplo, há duas coisas sempre presentes no meu carro – uma chupeta, uma grande invenção quando a sua bateria descarrega, especialmente se o seu carro é automático, e um guarda-chuva, que lhe protege da chuva e, quando o sol está escaldante, dele também. Pois não é que, quando troquei o carro da última vez esqueci ambos! O jeito foi comprar novos, pois os caras tinham vendido o meu velho e não tinham notado esses indispensáveis instrumentos.
A chupeta foi fácil. Tem em todo pé de pau. Mas o guarda-chuva foi mais difícil. Eu só gosto do modelo tradicional, que você abre e fecha com um botão e um empurrão. Esses automáticos são péssimos, pequenos, incomodam e…quebram com a maior facilidade. Na busca do meu guarda-chuva preferido, lembrei-me de alguns fatos que serviram de motivação adicional para uma boa escolha.
Lembrei-me de meu Professor de Inglês e Diretor do Atheneu, Celestino Pimentel, que só andava com um guarda-chuva, chovesse ou fizesse sol e que, diga-se, nunca o vi aberto. Sempre muito bem enrolado e arrumado, servia-lhe mais de bengala do que guarda-chuva. Algumas vezes, com chuvas finas, ele o mantinha fechado, para não desmanchar a arrumação.
A outra estória que me fez escolher o guarda-chuva comum aconteceu comigo em Londres. Andando com Alvamar Furtado na Oxford Street, final dos 90, começo dos 2000, pára na rua, vira-se para mim, e com a ênfase que lhe cabia perfeitamente comenta: Dalton, não estamos em Londres! Faz mais de uma hora que andamos e ainda não vi um só inglês de chapéu de côco e um guarda-chuva! Concordei com ele. Passavam por nós todas as raças, menos um inglês autêntico.
O que me leva a uma segunda estória. Não sei se vocês viram o filme “A Bridge too Far” (Uma ponte muito longe). A estória verdadeira da tentativa da tomada de uma ponte em Arnhem, na Holanda, muito importante para facilitar a ocupação do país e a chegada à fronteira da Alemanha. Talvez tenha sido essa uma das maiores derrotas dos ingleses, que tiveram a ideia e fizeram o ataque, com paraquedistas, que tomariam a ponte e aguardariam reforços, que já estavam à caminho e nunca chegaram em tempo. Os ingleses foram fragorosamente derrotados. Feridos levados a um hospital improvisado. Neles, o comandante do Batalhão e o seu vice. Como todo inglês que se preza, nunca entraram na intimidade um do outro. Mas, à morte, o comandante não resistiu, pediu desculpas pela pergunta, mais a fez: fulano, por que você usa um “umbrela” em pleno combate? Identificação; você já viu alguém que não fosse inglês com um guarda-chuva em plena batalha? Morreram felizes com a nova intimidade.
E, por último, outro filme de doze – Candelabro Italiano. O filme é ótimo, divertido e tem cenas inesquecíveis. Uma das melhores. Num trem, sentados um em frente ao outro, um italiano e um inglês, com o seu inefável guarda-chuva. O italiano, doido para conversar, inicia perguntando, turismo? Não, em lua de mel. E o italiano, curioso, pergunta: onde está sua mulher? Em Londres, nosso dinheiro só dava para uma pessoa. Britânico emérito.
Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN