HÁBITOS VERGONHOSOS… OU NÃO! – 

Acredito – talvez seja uma esperança incansável de ser normal – que todos tenham, lá no fundo, hábitos vergonhosos escondidinhos, daqueles que não se conta para ninguém. Sabe aquela música estranha, que a gente gosta de cantar alto sob o chuveiro ou dentro do carro? Sabe aquele abadá do Carnatal de 1998 do bloco Asa de Águia que ainda se usa para dormir? Ou anotar num caderninho os números dos telefones dos parentes e amigos mesmo existindo agenda no celular? Este tipo de coisa… Hábitos…

Se fizermos um exame de consciência todos temos algo assim, que ninguém entende o motivo, mas, certamente, faz parte de nossa essência.

Tenho os meus hábitos. Não falo das listas de afazeres escritas com canetas de cores diferentes, assinaladas com marca-textos de espessuras diferentes e usando post-its de formatos diferentes, para assinalar cada membro da família e suas atividades. Não falo da caneca específica para beber meu café, da outra para beber o chá mate ou o chá de hibisco de todo dia. Nem falo sobre a forma de marcar a leitura nos livros que acompanham minha vida e minha história, com três diferentes tipos de marcadores todos usados concomitantemente. Nem sobre o método criado por mim para escolher qual o esmalte que pintarei minhas unhas! Estes são hábitos que podem ser comuns. Assim espero!

Falo agora da minha novela da tarde. Viciada nas novelas do Maneco (Manuel Carlos), nas suas diferentes Helenas, nas trilhas sonoras cheias de bossa nova e, pasmem!, Girl, a primeira trilha com música dos Beatles que tivemos no Brasil.

Ao chegar a hora, sento-me no sofá na companhia de Pretinha, com uma travessa de pipoca no colo. Lembro-me de praticamente toda a trama, mas isso não importa! Assisto de novo e me delicio com as ruas do Leblon que só o Maneco consegue expor com uma tranquilidade carioca peculiar. Tenho raiva da Camila e da Íris e reclamo em voz alta com a TV: sério que você vai ficar com o namorado da sua mãe?

Sei que já disse isso mil vezes para a TV! Posso repetir mais mil vezes, o que torna a cena, não da TV, mas do sofá, hilária. Eu, discutindo com os personagens… Que loucura…

Quem hoje assiste reprise de novelas? Temos Netflix, Amazon, PlayStation, YouTube. Nossos filhos nunca assistiram a uma novela! Enquanto nós, a nossa geração, foi acostumada a seguir os horários da Globo, com suas novelas das 6, 7 ou 8, como chamávamos carinhosamente.

Esta geração não sabe o que é aguardar a hora do seu programa favorito e, em se tratando de novelas, esperar o desenrolar do “causo” na segunda-feira após o surpreendente episódio do sábado. Nunca entenderão a discussão ao redor de quem matou Odete Roitman, ou sobre Roque Santeiro…

Hoje, no computador, cada um escolhe sua série e a hora de assisti-la, fazendo perfeitas maratonas sem intervalo algum e sem dividir o sofá com mãe, pai ,irmão e ficar super-constrangido naquelas cenas mais tórridas de beijos ou insinuação de sexo. Sim, insinuação! Hoje as cenas são abertas, sem vestígio de discrição…

Pois bem! Sou dessas. Amo esta novelinha da tarde, com minha pipoca e minhas reclamações. Amo fazer coreografias nos sinais vermelhos ao som alto da minha playlist insana enquanto dirijo. Amo puxar conversa no elevador, falando desde o tempo quente até perguntar “até quando usaremos máscaras?”, como uma forma de mostrar ao vizinho que não sei o nome que, mesmo assim, nos importamos uns com os outros.

Tenho mil e um hábitos. Alguns engraçados, outros necessários. Uns importantes, outros completamente inúteis. Uns vergonhosos, claro. Mas pensando bem, nada que nos faz bem e não maltrata alguém pode ser vergonhoso, né? Então, até chegar ao último capítulo desta novela continuarei acompanhando, depois, quem sabe, será só um hábito esquecido…

 

 

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, Professora universitária e Escritora

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