HARMONIA E ANOMIA – Diógenes da Cunha Lima

HARMONIA E ANOMIA – Diógenes da Cunha Lima

O Brasil será, um dia, a Pátria das Harmonias. É harmoniosa a mistura das três raças básicas; a sonora língua portuguesa; a geografia, fauna e flora tropicais; as artes do povo, notadamente a música brasileira. Toda essa riqueza está ao lado de profundas desarmonias, desigualdade socioeconômica, da precariedade da educação, saúde e segurança pública. O contraste é, infelizmente, enraizado. O Brasil produz aviões a jato de primeira linha e não consegue combater um mosquito mortal.

A natureza é harmônica: tudo está feito com ordem e proporção dentro do macrossistema ecológico, com escondidas ou manifestas belezas. A humanidade ainda não tem a exata percepção holística das interações entre os seres vivos e o meio ambiente. Poder-se-ia dizer, como no início das missas, que as relações naturais são justas, razoáveis, salutares.

A poetisa Auta de Souza disse ter um sonho que morava no céu e era tão bonito como uma flor. Assim sonhava: “Eu canto e rio na luz dispersa / deste dilúvio de fantasias… / minha alma voa no azul imersa / buscando a pátria das harmonias”. A utopia poética inspirou-me melodia que ganhou beleza na voz de Liz Nôga.

Harmonia é o melhor que se pode dar à vida, à música, a toda arte. É estar cada coisa no seu lugar. A perfeição utópica vislumbra a harmonia social do nosso povo. Seria viver suavemente e estarem todos e cada um em paz. A harmonia não é sinônimo de simetria, porque as partes não são iguais, como no homem vitruviano de Leonardo da Vinci. A vida social é dinâmica e está sempre em mudança, deveria ter o bem comum como única meta.

Temos cidadãos e comunidades divergentes, mas que deverão ter iguais oportunidades, evitar a marginalização conquistando a inclusão social. Dar a todos uma melhor qualidade de vida deve ser o objetivo comum de todo brasileiro.

Atualmente, boa parte do povo brasileiro padece do que os filósofos juristas denominam de anomia social. Marginalizada, falta-lhe objetivo preciso e há ausência de normas legais e morais, que têm acarretado condutas desviadas e até mesmo perda de identidade. O controle social e jurídico é deficiente. Há invasão de competência. O Supremo Tribunal tem legislado, muitas vezes. O Ministério Público chega a interferir na gestão do executivo. São exemplos: a Constituição Federal de 1988 proclama saúde como direito fundamental. Imaginou-se ser universal e gratuita a prestação de serviços médicos. Trata-se de norma ideal, infelizmente impraticável. Muitas vezes, obriga à judicialização porque há direitos idealizados, mas de impossível efetivação. Pretende-se a inadiável reforma da Previdência, quando se deveria fazer também a Reforma dos Privilégios. Convoca-se as Forças Armadas para a incompatível função policial. Entende-se uma atuação judicial, como a Lava-Jato, não como um meio, mas como uma finalidade em si, interminável.

Cada cultura incorpora um sonho de felicidade, ensina Eduardo Gianetti. Teremos que incorporar à cultura brasileira o sonho de Auta de Souza. Não será fácil conseguir um pensamento comum, ou melhor dizendo, um sentimento comum para alcançar o bem-estar coletivo.

Não se pode esperar uma ausência de conflitos, de falhas no controle social, mas é possível e desejável a construção da harmonia, a convivência na divergência dos contrastes. É possível mobilizar as energias positivas para a cura da patologia social reinante, a diminuição das desigualdades, o restabelecimento da aplicação do direito com sábia justiça.

Um dia, os brasileiros viverão o sonho, em harmonia sustentável.

 

Diógenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

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